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“A Mula”: aos 88, Clint Eastwood continua a amadurecer

Relação entre um pai e sua filha está, de novo, no centro da história, sobre um nonagenário que transporta drogas para um cartel

Por Isabela Boscov Atualizado em 15 fev 2019, 20h44 - Publicado em 15 fev 2019, 20h38
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  • TAL E QUAL - Lily como Pamela, e Sebastian como Tommy Lee: semelhança física e de personalidade -
     (Warner/Divulgação)

    De Os Imperdoáveis para cá – justamente a fase extraordinária da sua carreira –, Clint Eastwood lida com duas constantes nos filmes em que é diretor e também ator. A primeira é a necessidade de crescer moralmente – vale dizer, aprender ou rever alguma coisa crucial a respeito do mundo e de si mesmo. A segunda constante é a relação entre pais e filhas. As duas coisas estão ligadas: nada tem mais força para mover um homem plantado nas suas convicções do que esse amor particular. Para homens (e mulheres) da geração de Clint, e é provável que de outras gerações ainda, filhos homens é que têm a ver com continuidade, orgulho, expectativa – e talvez por isso, pelo fato de os pais serem pegos meio desprevenidos pela sua admiração pelas filhas, o deslumbramento com elas seja redobrado e seu impacto, tão grande. Clint não está nem aí para a biologia: nas duas obras-primas que fez nas últimas décadas, as figuras filiais por quem ele desenvolve sentimentos intensos são, em Menina de Ouro (2004), a boxeadora vira-lata que aparece em seu ginásio, e de quem ele tenta de todas as formas se livrar; e, em Gran Torino (2008), a garota da família de vizinhos imigrantes que ele despreza (mas despreza mesmo). Ambas chacoalham o mundo dele, reorganizam o seu sistema de valores, ensinam o que ele nem imaginava que deveria saber. Aliás, em Os Imperdoáveis, de 1992, uma das prostitutas que ele é contratado para vingar é decisiva na guinada moral dele também: em todas essas jovens, o personagem de Clint encontra uma ética e uma fibra que obrigam-no a reexaminar quem ele é, e que espécie de mundo está ajudando a criar. Outras vezes, as filhas já estavam na vida dele, porque ele as teve – mas ele foi distante, ou ausente, ou falhou com elas, e então a certa altura caiu em si. É o caso de Poder Absoluto (1997), em que Laura Linney o chama à consciência, ou de Curvas da Vida (2012), que ele não dirige mas que foi escrito para ele, e em que Amy Adams é tudo que ele mesmo queria ser, e mais um pouco. E é o caso também – embora por caminhos mais oblíquos – de A Mula, que acaba de entrar nos cinemas brasileiros.

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    A Mula
    (Warner/Divulgação)

    Em A Mula, Clint é Earl Stone, um sujeito de 90 anos do Illinois, no Meio-Oeste americano, que gosta de viver a vida – sempre no presente, sem pensar muito no amanhã nem no ontem. Faz tempo que sua família ficou pela beira do caminho: o casamento durou dez anos apenas, e ainda rende brigas que se prolongam há décadas com a ex-mulher (Dianne Wiest) e a filha (Alison Eastwood, a segunda dos sete filhos de Clint), em cujo casamento ele não apareceu porque estava no bar com os amigos. Por isso, a filha não fala com ele há anos (compreensível), e sua única ligação agora é com a neta (Taissa Farmiga), que vai se casar e em quem ele também dá o calote: sua plantação de flores acaba de ir à falência, porque ele não se adaptou às entregas pela internet, e Earl não tem mais um tostão para contribuir com a festa. Isso até ele arrumar um bico que finge para si mesmo ser inocente: ficar viajando entre o Illinois e El Paso, no Texas – um estirão de mais de 2 mil quilômetros – para fazer entregas para alguns mexicanos fortemente armados e muito tatuados. Ninguém pensa nos idosos como criminosos, e Earl, ademais, nunca tomou uma multa sequer em 76 anos de habilitação: é a “mula” ideal, acima de qualquer suspeita.

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    A Mula
    (Warner/Divulgação)

    Clint se diverte com as manias de Earl, e os narcotraficantes do cartel também: ele não faz ideia de como usar um celular, fala incorreções políticas de arrepiar e vive com cara de sonso, como se não estivesse entendendo o que se passa à sua volta. A velhice, enfim, é uma cobertura convincente, e Clint comenta com humor esse vício social de desconsiderar ou descartar os idosos – ao mesmo tempo em que o contradiz, com contundência, já no fato de estar dirigindo e atuando aos 88 anos. Clint mostra, também, que a coisa mais difícil do mundo (felizmente) é uma pessoa se convencer da idade que tem: aos 90, Earl adora paquerar, beber, dançar, puxar conversa e curtir a liberdade daquela estrada toda à sua frente da mesma forma que sempre adorou. Acredita-se invencível, também, com a mesma fé que um adolescente crê na sua invencibilidade. Mas aí as coisas saem dos trilhos, e o apoio vem de onde ele menos espera, e de onde menos merece.

    A Mula
    (Warner/Divulgação)

    A cada filme que faz, Clint tem se dedicado a rever os valores da sua geração com mais profundidade e franqueza do que qualquer outro diretor americano: examina-os e passa-os na peneira – o que é pedregulho, e o que tem valor? O que deve ser jogado fora, o que vale a pena guardar? Sempre, o que sobra além de qualquer dúvida são essas filhas, postiças ou biológicas, que dão a ele coragem para enfrentar as dores do crescimento. Ainda que Clint não fosse o cineasta que é, ou não tivesse a independência de espírito que tem, só aí já há, para mim, motivo de sobra para a admiração incontida que tenho por ele.

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    Trailer

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    A MULA
    (The Mule)
    Estados Unidos, 2018
    Direção: Clint Eastwood
    Com Clint Eastwood, Dianne Wiest, Bradley Cooper, Michael Peña, Andy Garcia, Ignacio Serricchio, Tassa Farmiga, Noel Gugliemi, Robert LaSardo, Clifton Collins Jr., Laurence Fishburne
    Distribuição: Warner

     

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