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Felipe Moura Brasil

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Análises irreverentes dos fatos essenciais de política e cultura no Brasil e no resto do mundo, com base na regra de Lima Barreto: "Troça e simplesmente troça, para que tudo caia pelo ridículo".
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Moonlight, a guerra cultural e o ‘escândalo’ do tuíte

Felipe Moura Brasil rebate patrulha politicamente correta

Por Felipe Moura Brasil Atualizado em 4 jun 2024, 19h16 - Publicado em 2 mar 2017, 23h00

I.

A pressão da esquerda para mais indicações de negros ao Oscar é realmente prejudicial para os negros em Hollywood.

Foi o que disse o roteirista e cineasta americano Cyrus Nowrasteh, de 60 anos, diretor do documentário “The Path to 9/11” (“O caminho para o 11 de setembro”).

“É uma verdadeira vergonha também”, afirmou ao também documentarista John Ziegler sobre o destaque dado pelo então apresentador da cerimônia Chris Rock e outras celebridades à ausência de negros premiados em 2016, que rendeu campanhas por boicote e as hashtags #OscarSoWhite e #WhiteOscar no Twitter, repercutidas pela imprensa e criticadas, por exemplo, pelo professor brasileiro Paulo Cruz, que é negropela atriz britânica Charlotte Rampling, então indicada ao Oscarpelo ator Michael Caine, duas vezes vencedor do Oscar de coadjuvante; e pelo ator e diretor Clint Eastwood, quatro vezes vencedor do Oscar.

“Porque você diz a si mesmo: a atriz Viola Davis vai ganhar esta noite por causa de sua atuação em ‘Fences’ [‘Um limite entre nós’] ou ela vai ganhar esta noite porque um grupo de pessoas ficou chateado no ano passado?'”, ponderou Nowrasteh.

Posto de outra forma, você diz a si mesmo: terá sido coincidência que a cerimônia do Oscar do último domingo (26/02) foi uma noite de recordes para negros em Hollywood, como apontou o Los Angeles Times, um ano após a pressão para mais indicações de negros resultar na declaração da então “desapontada” presidente negra da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood de que “nós temos de acelerar” a promoção da “diversidade” na entidade responsável pelo Oscar?

“Ela é uma atriz tão incrível e seu desempenho é fantástico nesse filme”, continuou Nowrasteh. “A ideia de que você tem de pensar nisto é lamentável.”

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É mesmo.

Mas já vinha sendo tão inevitável ter de pensar nisto – mesmo em casos de merecimento menos questionáveis como o de Davis neste ano e de Denzel Washington por “Dia de treinamento” em 2002 – que em 2014 até o apresentador esquerdista Bill Maher se viu obrigado a concordar com o radialista conservador Rush Limbaugh sobre o Oscar de Melhor Filme.

Relembro as três principais falas de Maher no seu programa “Real Time” em conversas com convidados transcritas e comentadas neste blog na ocasião:

1) “No dia seguinte [ao Oscar], Rush Limbaugh disse: ‘Não havia a menor possibilidade de que o filme’, falando acerca de ’12 anos de escravidão’, que ganhou [o prêmio de] Melhor Filme, ‘não ganhasse. Não importava se era bom ou ruim. Ele tinha a palavra mágica no título: escravidão [no original, slave].’ E então eu vi todo mundo na MSNBC [emissora de TV dos EUA] enlouquecer porque ele disse isso, e eu estava no jantar da Vanity Fair na véspera e… eu estava dizendo basicamente a mesma coisa. (Risos).”

2) “Eu disse: ‘Você sabe, se você não tem escravidão ou Aids no título, você simplesmente não ia ganhar neste ano’, e eu acho que o que os esquerdistas não entendem é que este não é um comentário… e eu não gosto de Rush Limbaugh também… não é um comentário sobre a validade do filme. É um comentário sobre a previsibilidade dos esquerdistas de Hollywood que fundem uma causa com o desempenho.”

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3) “Eu só estou dizendo que, se Daniel Day-Lewis perder 80 quilos e interpretar um bebê com Aids, ele ganharia um Oscar.”

Detalhe: Maher fez este último comentário após ler a notícia – originalmente publicada no Los Angeles Times e reproduzida também nos jornais brasileiros – de que dois membros da Academia admitiram que não haviam assistido a “12 anos de escravidão” porque seria “aborrecedor”, mas que votaram no filme de Steve Mcqueen do mesmo jeito porque se sentiram obrigados a isso em função de “sua relevância social”.

Para quem acompanha o debate público americano, portanto, o esquerdismo de alguma forma presente na Academia nos últimos anos, seja pela existência de membros de esquerda em sua composição, seja pela eventual sujeição dos membros à pressão ideológica, é algo mais do que sabido, assim como a predominância de esquerdistas na indústria do cinema e da TV em Hollywood – não por acaso um distrito da cidade de Los Angeles, na Califórnia, estado cuja população é majoritariamente eleitora do Partido Democrata.

Em agosto de 2012, até o insuspeito colunista esquerdista Jonathan Chait admitiu na New York Magazine que, como denunciam há décadas os conservadores, Hollywood é dominada pela esquerda:

“Você não tem de ser um consumidor especialmente devotado de filmes ou televisão (eu não sou) para detectar um esquerdismo generalizado, senão total. Em suma, o mundo da cultura popular cada vez mais reflete uma realidade própria em que o Partido Republicano está ausente ou é demonizado. Essa realidade são os pressupostos culturais, em especial, dos eleitores mais jovens cujo apoio se tornou a base do Partido Democrata.”

Chait descreveu também o método básico utilizado para conquistá-los:

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“Na maior parte dos casos, a sua televisão não está diretamente tentando alterar suas crenças políticas. Ela está sobretudo transmitindo um conjunto de valores [no original, ‘ethos’] em que a ganância não é apenas ruim, mas a principal fonte do mal; figuras de autoridade de todos os tipos não são confiáveis; a liberdade sexual é um valor absoluto; e a igualdade social de todos os tipos é fundamental. Dentro do universo moral dessa cultura, os méritos desses valores são autoevidentes. Mas para o grande público dos EUA que não compartilha esse conjunto de valores, isto parece um presunçoso e autoperpetuador conluio contra eles. Nós esquerdistas devemos muito de nosso sucesso à campanha publicitária de uma minúscula elite cultural desproporcionalmente influente.”

O colunista até citou o Brasil como um país onde a televisão mudou os costumes sociais drasticamente graças à inculcação de um sistema de valores mais esquerdista, o que nosso best seller “O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota” e este blog já esmiuçaram, incluindo confissões dos próprios autores de novela e os relatos do empresário José Bonifácio Sobrinho, o Boni, que esteve na direção-geral da TV Globo por três décadas.

Após o artigo de Chait, o conservador Ben Shapiro, discípulo de Andrew Breitbart, comentou o mesmo que denunciamos sobre a situação brasileira:

“O povo norte-americano foi enganado. Fomos informados de que o nosso entretenimento era apenas isso: entretenimento, em oposição à propaganda. Isso era falso. E os americanos, por ignorar o problema, permitiram que a coisa apodrecesse. Enquanto os conservadores não acordarem e perceberem que eles não vão reconquistar seu país sem reconquistar sua cultura, eles vão continuar a perder seu país para aqueles que sabem como manipular as emoções com roteiros, iluminação e trabalhos de câmera.”

Um ano antes, em 2011, Shapiro publicou o livro best seller Primetime Propaganda: The True Hollywood Story of How the Left Took Over Your TV [“Propaganda em horário nobre – A verdadeira história de como a esquerda assumiu o controle da sua TV”], que inclui a confissão de 39 produtores de Hollywood de que os seriados promovem a agenda esquerdista e que a indústria televisiva é esmagadoramente desse viés, coisa que o produtor de “MacGyver” – sucesso dos anos 1980 no Brasil – acha ótimo.

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“Eu acho que esta afirmação é provavelmente precisa, e eu estou feliz com isso”, disse Vin Di Bona após admitir também que as mensagens desarmamentistas eram intencionalmente recorrentes no programa, famoso pela capacidade do protagonista em sair das maiores enrascadas sem usar armas de fogo.

Então desconhecido, Shapiro ganhou a confiança dos entrevistados usando seu boné universitário (e, claro, gravou as conversas): “Sendo judeu e tendo estudado em Harvard, há 98,7% de possibilidades de ser de esquerda”, explicou, mostrando como os produtores se sentiram à vontade, com quem supunham ser da mesma tribo ideológica, para relatar como usavam suas obras a favor da “justiça social”.

Com efeito, o mercado de Hollywood é tão controlado pela esquerda que o ator conservador James Woods, em razão de suas próprias posições políticas e críticas ao então presidente Barack Obama, declarou em 2013:

“Eu não espero trabalhar de novo”.

É, entre outros motivos, pelo temor de não mais serem convidados a atuar que, em geral, os atores que se revelam conservadores ou críticos da esquerda são veteranos já consagrados como Woods; Chuck Norris; Clint Eastwood; além do pai de Angelina Jolie e não à toa doador da PragerU, Jon Voight, com quem tive a honra de conversar em jantar de outubro de 2016 em Los Angeles.

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Já quem aplaude ou reproduz discursos anti-Donald Trump como os da atriz Meryl Streep na premiação do Globo de Ouro, do grupo de atores famosos que gravou vídeos durante a campanha presidencial (e que foi deliciosamente ironizado em outro) e de várias celebridades e profissionais do meio que subiram ao palco do Oscar, incluindo as piadinhas do apresentador Jimmy Kimmel em deboche ao atual presidente republicano dos EUA, obviamente não precisa se preocupar com seu futuro profissional para além das questões artísticas.

II.

Considerando a realidade americana acima resumida, bem conhecida dos leitores deste blog, mas ignorada no Brasil por todos aqueles – militantes de esquerda ou não – que se informam, quando muito, tão somente pela mesma imprensa que dava como certa a vitória de Hillary Clinton, escrevi uma série de comentários no Twitter sobre a cerimônia do Oscar deste ano – como faço anualmente – e, depois, sobre o filme “Moonlight”, que vi no dia seguinte.

Durante a cerimônia, antes portanto de ter assistido ao vencedor, elogiei apenas as atuações anteriores de seu maior expoente:

“Mahershala Ali, Oscar de coadjuvante por Moonlight, foi ótimo como Remy em House of Cards e Boca de Algodão na divertida bobagem Luke Cage” – série também disponível no Netflix e cujo personagem-título é à prova de balas.

Quando vi “Moonlight”, julguei o papel de Ali como Juan – não seu talento artístico, nem sua competência no filme, muito menos sua cor negra – insuficiente para render-lhe um Oscar, mesmo que de coadjuvante, assim como a qualidade do filme para render o prêmio principal.

Então, no mesmo tom com que tantos americanos à direita e à esquerda, como Rush Limbaugh e Bill Maher, criticaram o Oscar nos últimos anos, escrevi os seguintes comentários em sequência (sendo os demais em resposta ao primeiro que segue abaixo, como se usa no Twitter para tratar do mesmo tema e permitir a visualização conjunta):

  1. “Vi ‘Moonlight’. Filme sobre negro gay maconheiro que sofria bullying não tinha como não levar Oscar, prêmio de melhor filme para a esquerda.”
  2. “Mahershala Ali é ator muito competente mas é constrangedor que tenha ganho Oscar por atuação de 30 minutos em papel que tão pouco lhe exige.”
  3. “Difícil crer que não pesou para o Oscar de Mahershala Ali o fato de ser negro muçulmano em tempo de histeria anti-Trump em Hollywood.”
  4. “Moonlight não é ruim, embora comece arrastado. Só nada tem de extraordinário que valha Oscar, a não ser elementos que agradam à militância.”

O escândalo que se seguiu nas redes sociais após meus tuítes repetiu o expediente que aponto há tempos, como fiz por exemplo em maio de 2016.

O expediente consiste basicamente em eximir-se de demonstrar compreensão do que foi lido e estimular uma reação exclusivamente emocional, irracional e negativa da plateia ao comentário do autor, acrescentando uma chamada que o faça parecer o demônio.

A começar por um professor esquerdista da UFF (que me acusou de “direita suruba do Jucá”, como se eu não debochasse dessas “surubas”), milhares de militantes e aqueles que caem em seu jogo (sem contar blog sujo petista, claro) atenderam ao comando e isolaram meu primeiro e meu terceiro tuítes (sobre o filme e sobre Ali), compartilhando-os com chamadas que repetiram a afetação de indignação e o autoexibicionismo moral de sempre, acrescidos de rótulos aos poucos amplificados em demonizações, xingamentos e acusações infamantes.

“Tirando o trololó, o que eles não gostaram foi de você escrever ‘negro gay maconheiro'”, tuitou um leitor.

Não é de surpreender que descrições objetivas sem qualquer juízo de valor sejam frequentemente tratadas por militantes como agressão verbal. Histeria, por definição, é reação hiperbólica a algum estímulo imaginário e postiço; e Eric von Kunhelt-Leddin dizia que a histeria é a base da personalidade esquerdista. Cláudio Moura Castro também ensinava que no Brasil as pessoas não leem o que você escreve, mas o que imaginam que você “quis dizer”.

Militantes brasileiros imaginam (quando não distorcem intencionalmente) o que autores críticos da esquerda quiseram dizer e reagem de acordo com o que imaginaram (ou distorceram), recorrendo também ao expediente apontado ainda em 1937 por Karen Hornay, em seu livro clássico “A personalidade neurótica do nosso tempo”:

“Outrossim, pessoas histéricas, repetidamente, recorrem a acusações como um meio de intimidação, ou então procuram intimidar o outro de modo a fazê-lo sentir-se culpado e deixar-se maltratar.”

Este blog, no entanto, não tem a menor culpa pela histeria alheia.

O protagonista Chiron, vivido por três atores em diferentes fases:

1) é negro, porque a cor de sua pele é… negra;

2) é gay (especialmente no conceito elástico usado pela esquerda), porque não só manifesta desejo, mas tem relação física (beijo de língua e masturbação até o orgasmo) exclusivamente com o amigo Kevin, do mesmo sexo;

3) é maconheiro, porque… fuma maconha.

O termo maconheiro ainda parece desagradar aos politicamente corretos, sobretudo se associado a um negro gay, mas tanto o uso comum – especialmente aqui no Rio de Janeiro – quanto os dicionários reais e virtuais brasileiros consideram maconheiro simplesmente quem vende ou… faz uso de maconha.

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Definição de maconheiro no dicionário do Google, ao qual até militantes de esquerda têm acesso (Google/Reprodução)

Um correspondente do UOL e da GloboNews em Los Angeles, cuja existência eu desconhecia, chamou de “MENTIRA” – assim em maiúsculas – a menção de que Chiron é maconheiro alegando que ele “aparece fumando UMA vez” e “depois ele vira traficante de crack”. “Sua descrição é qquer [qualquer] coisa menos objetiva”, escreveu para mim.

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(Twitter/Reprodução)

Dã. Chiron até surpreende Kevin pela intimidade com o fumo e, quando questionado a respeito, responde que a mãe, viciada em drogas, deixava baseados pela casa, o que obviamente indica que não era a sua primeira vez.

Cinema não precisa mostrar várias vezes aquilo que constitui um hábito de um personagem qualquer: basta que a cena o registre por meio de indicações em gestos e falas, como é o caso. Mas voltarei ao correspondente adiante.

Por fim:

4) sofria bullying, porque… ora, sofria bullying, ou seja: era provocado, intimidado e agredido por colegas de escola.

Como a esquerda posa de defensora de negros, gays, usuários e legalização de drogas, além de vítimas de bullying, ‘Moonlight’ reúne portanto um verdadeiro combo de elementos – a despeito da legitimidade de seu uso em qualquer obra cinematográfica – que são do agrado da corrente ideológica predominante em Hollywood (e olha que eu nem citei o fato de Chiron virar traficante por influência de um colega de prisão); daí, claro, meu comentário de que “não tinha como não levar Oscar”, similar aos de Limbaugh e Maher sobre “12 anos de escravidão”.

A diferença é que, em outros tuítes, ousei dizer também – imagine – que “Moonlight” não é espetacular (embora reconheça que a concorrência não era das melhores na safra deste ano, o que, a meu ver, apenas tornou o prêmio de Melhor Filme um tanto menos descabido que o de Ator Coadjuvante).

(Para mudar de fase da vida de Chiron e de ator a interpretá-lo, por exemplo, o roteiro salta sem a menor cerimônia por momentos decisivos como a morte de Juan e a escolha do protagonista pelo caminho do tráfico que parecia repudiar, e com isso dribla situações que poderiam dar ao filme uma dimensão maior que a de mero retrato melancólico de um jovem retraído e marginalizado, com dificuldade de expressar seus desejos e encontrar seu lugar no mundo.)

Para descrever a distorção geral, acrescentei ainda que o “cúmulo do cinismo (ou do analfabetismo) é transformar comentário sobre qualidade de um filme em preconceito contra perfil do protagonista”.

Foi o bastante para que o correspondente voltasse com tudo, como alguém que realmente vestiu a carapuça:

“Cúmulo do cinismo é negar seu racismo qdo [quando] vc [você] mesmo disse que o Ali ganhou o Oscar por ser negro e muçulmano.”

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Corresponde do UOL e da Globonews ataca o colunista de VEJA Felipe Moura Brasil (Twitter/Reprodução)

Ali ganhou o Oscar por ser negro e muçulmano” é obviamente uma redução caricatural do meu comentário de que é “difícil crer que não pesou para o Oscar” de Ali o fato de ser negro e muçulmano em tempos de histeria anti-Trump em Hollywood, o que só afirmei após elogiar o ator em outros papéis e justificar que este era limitado e pouco significativo.

Em janeiro, o próprio Ali havia declarado publicamente o seguinte: “Mas espero que eu não tenha sido nomeado porque eu era negro. Isto não tem relevância. Espero ter sido nomeado pelo meu trabalho.”

Quem “espera”, obviamente, tem alguma margem de dúvida ou de torcida para que algo seja de determinado jeito. Nem o ator, portanto, tem 100% de certeza de que sua nomeação se deu exclusivamente por mérito artístico.

(Um tuiteiro ainda chegou ao cúmulo de comparar a interpretação de Ali em tempo tão curto com a de Anthony Hopkins como o canibal Hannibal Lecter de “O silêncio de inocentes”, que lhe rendeu o Oscar de Melhor Ator em 1992 mesmo tendo aparecido pouco na tela. Detalhe: Hannibal lidera listas de melhor vilão da história do cinema. Não é só o tempo curto. Papel de Ali como um traficante compadecido de Chiron nem de longe exigiu tamanha singularidade de interpretação. Até o xerife interpretado no divertido “A qualquer custo” por Jeff Bridges, também indicado ao Oscar de coadjuvante, exigiu mais do ator, mas um filme sobre dois ladrões não tem o mesmo apelo dramático que “Moonlight”.

Eu consideraria perfeitamente meritório, aliás, que “Moonlight” tivesse vencido o prêmio do Sindicato dos Atores dos EUA – o Screen Actors Guild Awards –  na categoria de “melhor elenco” – que não existe no Oscar –, porque o filme combina várias atuações competentes sem maior destaque individual. Mas o prêmio do SAG foi para “Estrelas além do tempo”, filme sobre um grupo de – oh, coincidência – mulheres negras da Nasa. O duelo – não que falte méritos no elenco deste último – era mesmo duro.)

Apesar de tudo – e nem vou comentar sobre os numerosos negros já exaltados neste blog, seja na literatura, no cinema, na música, na política ou no esporte (e não é Usain Bolt chegando em 1º lugar na minha foto de capa no Facebook?) – o correspondente me acusou de racismo, o que só faria algum sentido se eu tivesse escrito a estupidez de que negros e muçulmanos como Ali não merecem jamais conquistar um Oscar, independentemente da eventual qualidade de suas atuações e filmes.

Dar este sentido estapafúrdio à simples opinião de que a pressão política deve ter pesado na decisão dos membros da Academia em premiar um ator ademais ótimo por um papel relativamente raso – o que não constitui crime algum nem dos que pressionam nem dos que decidem – é uma reação hiperbólica de demonização.

Apesar também da naturalidade com que se usa o rótulo infamante de racista na internet contra supostos adversários, uma acusação individualizada, desproporcional e descabida de racismo obviamente ultrapassa a esfera da crítica cultural e política, mesmo que ácida, de modo que encaminho para o setor jurídico da editora Abril, que publica a revista VEJA, o print da referida mensagem, junto com todas as outras dos demais militantes que embutem expedientes iguais e similares, para que os advogados especializados avaliem a viabilidade ou não dos respectivos processos judiciais.

III.

A política de identidades foi o que resultou na desconfiança presente e legítima em todo o espectro do debate público sobre se os prêmios são concedidos exclusivamente por mérito ou, também, por adulação às “minorias”.

É absolutamente natural, portanto, que a esquerda e aqueles que inconscientemente engrossam a patrulha politicamente correta primeiro pressionem pelas cotas no Oscar e depois precisem demonizar e intimidar quem questiona o mérito específico de eventuais premiados, mesmo que não de todos, bem como a sujeição dos membros da Academia à pressão.

O cinismo sobre o efeito prático das próprias bandeiras defendidas está na essência do esquerdismo cultural e político. Como escrevi em 2014, e o exemplo dos governos petistas fartamente comprovaram:

Felipe Moura Brasil ⎯ https://veja.abril.com.br/blog/felipe-moura-brasil

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