O truque é simples: estampe o rosto com um sorriso largo e imóvel, curve a cabeça como um personagem de Stanley Kubrick, cerre os olhos, mire um alvo e pronto, alguém se arrepiará com a pose macabra. A tática responsável por milhões de sustos pelo mundo também é chave da franquia Sorria, que nasceu em 2022 a partir de um longa independente feito com 17 milhões de dólares, sucesso orgânico que rendeu 217 milhões pelo globo. Dois anos depois, o cacife do universo cresceu tanto quanto as ambições do cineasta Parker Finn, que transpõe sua proposta modesta ao universo glamouroso da música pop em Sorria 2, estreia desta quinta-feira, 17.
Nele, a maldição permanece a mesma. Em esquema transmissível à la O Chamado, uma entidade passa a assombrar quem quer que testemunhe a morte do portador anterior, que sempre é forçado ao suicídio. Depois disso, o contaminado enxerga os tais sorrisos imóveis em alucinações por toda parte, sem contar nos delírios abastecidos pela morte violenta que observou. Após alguns dias, vem a possessão e, por fim, o próprio destino fatídico.
Acontece que, por azar, a nova contaminada é a estrela mais observada do mundo: a cantora pop Skye Riley (Naomi Scott). Afastada dos holofotes por um ano após um acidente de carro que matou seu namorado e a fez abandonar o vício em drogas, a artista busca agora limpar a imagem e embarcar em uma turnê mundial, mas cai no esquema de pirâmide demoníaco quando vê seu traficante esmagar a própria face com um peso de academia. Lenta e gosmenta, a cena pauta o efeito de preferência da trama: a violência gráfica.
É esta a força mais patente do longa, que também tateia os rumos do horror psicológico e das metáforas sociais, estabelecendo entre protagonista e maldição um paralelo para lá de didático sobre os horrores enfrentados por adictos. Sem superar clichês, a narrativa recorre a conflitos esperados e pincela sua personagem com enfoque abrangente, que a torna avatar para as mazelas de Demi Lovato, Britney Spears e outras vítimas da indústria fonográfica, mas pouco faz para torná-la interessante ou para engrossar o espetáculo macabro proposto.
A falta de dimensão poderia ser mero detalhe, não fosse o longa tão vagaroso no caminho rumo ao fim previsível, ainda que forte. A sacada, afinal, é boa, perversa, sádica e conversa bem com o público de histórias monstruosas — que almeja ir ao cinema para ver atrocidades reinventadas. O clímax até evoca ao terror B cheio de sangue e carne feito por artesãos dos anos 1980 como Frank Henenlotter, assim como bem faz A Substância, mas carece de apuro artístico e de coesão com os acontecimentos austeros que o precedem. Resta, então, se contentar com a divertida repugnância às cenas mais sangrentas e com o riso frouxo que é provocado por piadas esporádicas, como esperar por músicas boas enquanto escuta a uma estação de rádio enfadonha. Apropriadamente, a marca que fica não é muito diferente daquela deixada pelo pop chiclete ouvido ao acaso: simpática, mas difusa e um pouco irritante.
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