Morre Kenneth Anger, pioneiro do cinema de vanguarda, aos 96 anos
Desde anos 1940, diretor causou polêmica com filmes homoeróticos e experimentais - e tinha fãs de peso como Scorsese e David Lynch

Experimentalista e ocultista devotado a filmes ritualísticos, eróticos e abstratos, Kenneth Anger morreu hoje, 24, aos 96 anos. Um dos pais do cinema underground americano, o cineasta e autor foi responsável pela direção de mais de 30 curtas-metragens, de sua pré-adolescência até a década de 2000. Em 1947, seu filme Fireworks foi a primeira narrativa explicitamente homoafetiva a ser distribuída nos Estados Unidos. Exibida em alguns cinemas, ela impressionou críticos que reconheceram a particularidade das imagens e temas, e também foi palco de um processo judicial por “obscenidade pública” — que, após apelo, acabou em decisão favorável ao filme e no reconhecimento legal da homossexualidade como tópico válido de expressão artística.
Suas demais obras, como Eaux d’Artifice, Scorpio Rising e Lucifer Rising, expandiram suas ideias sobre o homoerotismo, espiritualidade, violência, cinema e morte. Em 2011, Anger visitou São Paulo para prestigiar a mostra Kenneth Anger: O Fetichista Pop, do Centro Cultural Banco do Brasil. No folheto da exibição, sua obra era descrita como “o elo que permite entender o cinema contemporâneo ao ligar a magia do cinema mudo à modernidade cinematográfica.”
Como qualquer rebelde, porém, não conseguiu resistir ao desejo de fugir de casa, e assim se afastou de qualquer ambição dentro de Hollywood, sua cidade natal. Negou-se a rodar longas, formato preferido da indústria americana, e, no começo dos anos 1950, partiu para a França a fim de trabalhar na Cinemateca Francesa, onde se aprofundou na vanguarda. Mesmo assim, escreveu um livro sobre os escândalos, orgias, mortes e crimes de celebridades americanas, Hollywood Babylon.
Ao longo de sua trajetória, acumulou grandes admiradores — dentre eles, David Lynch, John Waters, Andy Warhol e Martin Scorsese, que cita Scorpio Rising como uma grande influência. Uma das principais minisséries da HBO em 2022, Irma Vep, de Olivier Assayas, o homenageia em uma série de episódios. Seu trabalho continua preservado pela galeria Sprüth Magers, com unidades na Europa, Estados Unidos e Ásia.