Lançado em 2022 nos cinemas, o filme nacional Predestinado: Arigó e o Espírito de Dr. Fritz chegou à Netflix recentemente e entrou para o ranking de filmes em língua não inglesa mais vistos da plataforma nesta semana, com 900.000 horas reproduzidas. Inspirado em uma história real, o longa protagonizado por Danton Mello narra a jornada de Zé Arigó, médium que ganhou visibilidade na segunda metade do século XX por suas cirurgias — espirituais e físicas — supostamente feitas através da incorporação do espírito do médico alemão Dr. Fritz, morto durante a Primeira Guerra Mundial.
Nascido José Pedro de Freitas, na cidade mineira de Congonhas, Zé Arigó era um dos oito filhos de um casal de sitiantes e estudou apenas até a terceira série. Segundo a biografia Arigó e O Espírito do Dr. Fritz (1974), de John Fuller, base do filme, ele demonstrou os primeiros sinais de mediunidade ainda na infância, mas foi só aos 29 anos, em 1950, que começou a desenvolver a relação com a espiritualidade. Com dores de cabeça constantes e visões incompreensíveis, julgou estar ficando louco e procurou ajuda médica, mas nenhuma intercorrência foi diagnosticada. Um padre foi chamado para sessões de exorcismo, também sem efeito. Contam os biógrafos que, certo dia, em um sonho nítido, a figura que o atormentava se identificou como Adolph Fritz, médico alemão morto durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). O espírito, então, teria lhe incumbido a missão de realizar tratamentos na Terra através dele.
Incorporando o profissional, Arigó começou a realizar cirurgias e atendimentos médicos sem custo, e estima-se que 4 milhões de pessoas tenham sido atendidas durante as duas décadas em que esteve na ativa. Sem conhecimento técnico, ele realizava procedimentos com canivetes e facas de cozinha, sem anestesia ou assepsia, mas os pacientes alegavam não sentir dor. Por sua atuação, chegou a ser preso duas vezes por curandeirismo e exercício ilegal da medicina — na primeira, em 1957, foi denunciado por um padre, mas recebeu um indulto do então presidente Juscelino Kubitscheck (1902-1976), que teria levado sua filha para ser tratada pelo médium, e saiu livre; na segunda, em 1961, ficou sete meses na cadeia.
Reconhecido por arrastar multidões no Brasil, Arigó chamou atenção também no exterior: uma equipe de pesquisadores norte-americanos foi até Congonhas para conhecer e registrar os métodos do médium, entre eles, o médico Henry Puharich, que teria sido operado de um lipoma no braço por ele. “Ele executava procedimentos terrivelmente dolorosos sem qualquer desconforto para os pacientes”, descreve Fuller na biografia. “Ele realizava centenas de operações diariamente sem antissépticos — geralmente com uma faca de cozinha comum ou canivete — sem anestésicos, sem amarrar vasos sanguíneos, sem grandes sangramentos, sem nenhum dos benefícios da ciência moderna”, continua o livro sobre o médium, que morreu em 1971, aos 49 anos, em um trágico acidente de carro.