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Dora Kramer

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Histeria regressiva

É mais fácil o STF prender deputado que soldado fechar o tribunal

Por Dora Kramer Atualizado em 4 jun 2024, 16h38 - Publicado em 26 out 2018, 07h00
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  • Partindo do princípio de que a preservação da liberdade requer eterna vigilância contra possíveis atentados, é de todo conveniente que nos mantenhamos alertas e diligentes. Disso deu notícia a rigorosa reação (inclusive e principalmente) de ministros do Supremo enquadrando os arreganhos de Bolsonaro pai e Bolsonaro filho aos costumes constitucionais vigentes.

    Extremamente contraproducente, porém, é a excessiva emotividade dos que cultivam histeria regressiva ao modo de terror e pânico pelo antecipado fim da democracia brasileira.

    Se o objetivo é alterar o rumo da correnteza, perdem tempo, pois a empedernidos convertidos ninguém convence. Se a ideia é firmar desde já os termos em que se vai dar a oposição, há maneiras mais civilizadas, consistentes e condizentes com a realidade atual.

    Convenhamos que no Brasil de hoje, transcorridos 33 anos da última eleição indireta, dois impeachments, a condenação judicial da cúpula de um partido no governo e uma razia ao ritmo de lava-jato depois, é mais fácil o Supremo mandar prender deputados por ilegalidade penal que soldados e cabos fecharem o tribunal por vontade presidencial.

    Nesse período de transição e consolidação democrática, já vimos o filme cujo roteiro incluía bazófias de enfrentamento da Justiça, desqualificação de críticos e dizimação de opositores. Em todas as tentativas, deram-se mal seus autores. Dando nomes aos devidos bois, falamos aqui de um passado recente com o PT e de um futuro próximo provavelmente com Jair Bolsonaro no poder.

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    Se o critério para a presunção do perigo são as intenções embaladas em retórica beligerante, risco presumido por risco real, ele já foi maior. Em 2002, Luiz Inácio da Silva não foi eleito apenas por maioria expressiva de votos. Foi ungido à condição de entidade quase unânime. O que dizia era lei, independentemente da forma, e o que fazia era para ser aceito a despeito do conteúdo. Houve um momento no país em que praticamente não existia oposição. A que havia, além de residual, era vista como reduto de equivocados e/ou insensíveis sociais. Na melhor hipótese. Na pior, valhacouto de traidores, inconfidentes do mau combate.

    Pois, a se confirmar a eleição de Bolsonaro, a situação será muito diferente daquela de dezesseis anos atrás. Terá desde o início de se defrontar com uma oposição de muitíssimo boa monta. A menos significativa será a partidária e a mais robusta, por parte do grande contingente de brasileiros que não compartilham de suas ideias nem compactuam com os métodos anunciados.

    Só aí já haverá uma barreira considerável à execução de intentos desviantes. A isso se acrescenta o poder das forças institucionalmente organizadas. Se o país pôde resistir às tentações autoritárias de um governante de aceitação quase uniforme, por mais razão saberá bloquear tentativas arbitrárias de um dirigente fruto de ambiente marcadamente divergente.

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    Isso, no entanto, sem prejuízo da eterna e estreita vigilância.

    Publicado em VEJA de 31 de outubro de 2018, edição nº 2606

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