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Augusto Nunes

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Esquerda infame

Socialismo de araque protagonizou mais episódios de infâmia do que de grandeza, que só existe na propaganda

Por José Nêumanne
Atualizado em 4 jun 2024, 16h52 - Publicado em 27 fev 2018, 19h34
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  • José Nêumanne, publicado no Blog do Nêumanne

    Dois comunistas de origem me serviram de exemplo no início de meus 51 anos de jornalismo: J.B Lemos e Marco Antônio Tavares Coelho. Os dois se conheceram na flor da juventude em Belo Horizonte, onde o segundo era da alta hierarquia do Partido Comunista Brasileiro (PCB), conhecido carinhosamente como “partidão” ou pejorativamente como “pecebão”, e dirigia o jornal comunista. Só viria a conhecer Marco em pleno arbítrio dos militares de direita, quando ele foi preso, torturado e usado como exemplo de como os torturadores do regime “tratavam bem” suas vítimas. Lemos foi meu primeiro chefe e o grande líder e orientador de toda a minha carreira. Convivemos praticamente como pai e filho. Os dois fizeram escolhas diferentes: Marco foi comunista a vida inteira, aceitando como inevitável o Tratado Ribbentrop-Molotov, pelo qual Stalin concedeu o prazo de que Hitler precisava para combater nos dois fronts. Os profetas do passado dirão que foi a estratégia certa para deter o avanço da tirania nazista pelo mundo. Certo é que nem a denúncia dos crimes de Stalin por Kruschev, logo depois da morte do tirano, esmoreceu o ânimo de Marco.

    Lemos, ao contrário, abjurou a fé marxista-leninista na maturidade e sua justificativa adorável e autoindulgente era a de que o jovem que não tinha sido esquerdista não tinha coração, mas, se mantivesse a mesma fé na maturidade, seria um rematado idiota. Mas isso não valia para Marco, pois os dois foram amigos até a morte, primeiro do capixaba Lemos e depois do mineiro Marco, já que sempre foram cordatos, tolerantes e inteligentes. Recorro à assertiva de meu ex-chefe de reportagem na Folha e diretor de redação do Jornal do Brasil para tentar nestas linhas tecer considerações sobre como os grupos ditos progressistas, que ocupavam o lado esquerdo da Assembleia Nacional à época da Revolução Francesa, enquanto os conservadores se sentavam à direita do presidente da sessão, participaram, apesar de suas juras eternas à sublime solidariedade, da História Universal da Infâmia, genial clássico literário do portenho Jorge Luís Borges.

    Infelizmente, desde o Manifesto do Partido Comunista, de Karl Marx e Friedrich Engels, de 1848, até hoje, a nobre generosidade socialista nunca saiu do discurso e dos sonhos juvenis, passando a ser impossível servir de guia a gente adulta e lúcida. Não faltam exemplos na História e os primeiros esquerdistas são pioneiros nos piores exemplos de infâmia: o Terror de Robespierre, implacável com o espírito libertário de Danton. O exemplo do século 18 chegou intacto ao século 20, quando o socialismo se definiu como científico após o sucesso dos bolcheviques no golpe militar que Lenine, Trotsky e Stalin aplicaram nos sociais-democratas de Kerensky na Rússia que virou União Soviética. Eram líderes desumanos e implacáveis no combate à liberdade de opinião, tendo merecido por isso reprimendas de aliados notórios, caso da alemã Rosa Luxemburgo. O terceiro do triunvirato superou os outros com seu ímpeto assassino. Robert Conquest escreveu um clássico da historiografia sobre o império soviético e nele relatou o massacre de 6 milhões de camponeses pela fome na coletivização forçada, por ele imposta. Mas o georgiano não se limitava a ímpetos tirânicos: era um assassino frio e refinado. Cuidou pessoalmente da execução transatlântica de seu camarada, que virou desafeto, Trotsky ─ da preparação do assassino catalão Ramón Mercader ao desenlace, no México.

    Não são escassos os exemplos de stalinistas que se tornaram déspotas liberticidas e assassinos seriais de quem discordasse de sua linha política. O chinês Mao Tsé-tung foi o primeiro de uma lista que abrigou seres abjetos como Pol Pot, no Camboja, Enver Hoxha, na Albânia, e os irmãos Fidel e Raúl Castro, em Cuba. Estes últimos, matadores de liberais, companheiros de jornada, homossexuais e eventuais desafetos, tornaram-se uma espécie de ai-jesus de intelectuais de renome internacional, como o colombiano Gabriel García Márquez, Prêmio Nobel de Literatura e vassalo ideológico de grande valia. A infâmia particular a cargo da esquerda latino-americana deve mais a esses tiranetes boçais do que aos senhores de Moscou. Fidel tratou minuciosamente da execução e, depois, da canonização do argentino Ernesto Che Guevara, que virou símbolo mercadológico da bondade humana, mesmo tendo conduzido os fuzilamentos no paredón da fortaleza de La Cabaña; Esse banho de sangue foi inspirado nas leis bíblicas da vingança de talião do “olho por olho, dente por dente”, que cuspiam na Justiça burguesa e na bondade cristã, o que não afasta muitos clérigos católicos e evangélicos adeptos da chamada Teologia da Libertação.

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    Os frutos podres do castrismo floresceram na América Latina produzindo morte, inanição e atraso. O PT de Lula e Dilma impôs sua gestão corrupta num Estado de Direito que engatinhava no Brasil, admirando à distância a progressiva marcha da democracia para a tirania na Venezuela sob o bolivarianismo de Hugo Chávez. Este conquistou mentes e corações por culpa da democracia de uma elite apodrecida, cujos líderes espirravam sempre que o presidente americano apanhava um resfriado. A caminhada rumo à ditadura brutal e voraz, hoje sob o comando do primário Nicolás Maduro, tem sido acarinhada e louvada pelos petistas e comunistas de partidecos do Brasil e de outros países sul-americanos, a ponto de nenhum dos líderes produzidos por eles, principalmente Lula, Cristina Kirshner, Evo Morales e Rafael Correa, dirigir uma palavra de simpatia e conforto aos refugiados da fome, da miséria e da doença que passam pelas fronteiras dos vizinhos, em particular Brasil e Colômbia, da mesma forma desvalida como o fazem na Europa os expulsos da guerra civil na Síria. Ao contrário, a esquerda caudatária beija os pés do completo idiota Maduro como o fazia com as fímbrias do dólmã de Fidel.

    Li sexta-feira 12 de fevereiro no Estado artigo de Fernando Gabeira ─  que foi guerrilheiro e exilado na juventude e amadureceu como político e jornalista desde seu livro O que é isso companheiro?, que inspirou filme ─  Ao fazê-lo, ocorreu-me refletir sobre o absurdo do abandono desumano a que estão relegados os fugitivos do empobrecido segundo maior produtor de petróleo do mundo. E, ao pensar no tema, vi-me obrigado a refazer a história da solidariedade do tal socialismo, marchando para a evidência límpida de que a esquerda não é infame apenas por volúpia de poder, desprezo à democracia burguesa ou falta de princípios éticos. No Brasil, seus sequazes são fiéis à história e leais a sua tradição de infâmia.

    Infelizmente, não me ocorreu um só exemplo histórico de um regime comunista sob cuja égide um país tenha prosperado. Combalida por anos de ditadura bolchevique, a Rússia deixou de ser União Soviética ─ na qual nunca se realizou o lema “todo poder aos sovietes” ─ para se tornar valhacouto do crime internacional, cujos chefões são protegidos pelo ex-agente secreto do regime stalinista Vladimir Putin. É um país próspero e seguro e isso dá longa vida ao governante, como explica o poeta paraibano Astier Basílio, que neste momento mora lá. Enquanto isso, a China não deixou de ser comunista para ir avançando e, assim, ameaçar o lugar de líder econômico, militar e político do planeta, os Estados Unidos dos pais fundadores, pelo “igualitarismo socialista”. Mas usa práticas do tempo dos mandarins, como a semiescravidão e o controle policial restritivo dos movimentos migratórios internos, para os quais são exigidos passaportes.

    Meu amigo Lobão Woerdenbag Filho avançou no lema de Lemos para contestar Marco quando garantiu que há dois tipos de petistas, definição que serve para esquerdistas brasileiros em geral: cúmplices dos criminosos que saquearam a República e produziram a maior crise econômica da história ou débeis mentais. Já lhe avisei que faltou uma categoria: a dos jumentos. Neste momento em que a UnB se prepara para ministrar curso sobre o “golpe de 2016”, será incompleto omitir a burrice como força política neste país pobre, que empobrece em todos os sentidos, inclusive no intelectual. Afinal, não se pode desdenhar do ínfimo QI de Dilma como uma das principais causas dos 12,2 milhões de desempregados produzidos em seu desgoverno. E ainda há outra categoria que supera as duas definidas por Lobão e a que faltou: a vocação histórica pela infâmia.

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