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Augusto Nunes

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J.R. Guzzo: É o que temos

Lula tem prometido virar o país de cabeça para baixo, mas não parece que há muita gente interessada nisso

Por Augusto Nunes Atualizado em 30 jul 2020, 20h37 - Publicado em 9 jan 2018, 10h08
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  • Publicado no Blog Fatos

    A que novos desastres determinas
    De levar estes reinos e esta gente? (…)
    Que famas lhe prometerás? Que histórias?
    Que triunfos? Que palmas? Que vitórias?
    (Luís de Camões, “Os Lusíadas”)

    O Velho do Restelo, esse homem difícil, pessimista e dado a falar o contrário do que se espera, disparou as perguntas acima a Vasco da Gama e outros peixes graúdos da corte de Portugal no momento em que largavam do cais de Belém, sob as palmas da multidão, para a viagem que os levaria a descobrir o novo Caminho das Índias. Denunciava, nas palavras que Camões tornou imortais em seu poema, a “glória de mandar” e a “vã cobiça” do Gama e de seus parceiros — juravam estar indo “além da força humana” pelo bem da pátria, mas só estavam interessados mesmo em sua fama, fortuna e ambições pessoais. Se ainda estivesse circulando hoje por aí, o áspero velho bem que poderia perguntar ao ex-presidente Lula: “Que promessas farás em tua campanha eleitoral de 2018?” Promessa nunca foi problema para Lula, é verdade. Mas se for candidato à presidente mais uma vez vai ter de arrumar alguma promessa, qualquer promessa — e no seu repertório de hoje não há nada que possa realmente entusiasmar as multidões.

    Lula tem prometido, por exemplo, virar o país de cabeça para baixo, mas não parece que há muita gente interessada nisso — o que se quer, pelo que dá para entender, é que o país fique com a cabeça onde está e vá em frente. Ele promete, também, mudar tudo na Petrobras. Mudar para quê? É a primeira vez em quase quinze anos que a Petrobras tem uma diretoria que não rouba a empresa. O que Lula está propondo? Criar de novo a situação de ladroeira alucinada que arruinou a companhia durante seus governos e os de Dilma Rousseff? Outra promessa é recuperar “direitos que foram cortados” do povo brasileiro. Quais? O imposto sindical, por exemplo, abolido na reforma trabalhista? Não dá, ao mesmo tempo, para prometer um novo “Trem Bala”, um segundo “Pré-Sal” ou a transposição das águas do São Francisco no sentido contrário.

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    Até algum tempo atrás Lula punha muita fé em prometer na campanha uma reforma monumental na economia. Hoje a coisa já parece mais complicada. Fazer o contrário do que está sendo feito pelo governo de Michel Temer significa, por exemplo, aumentar os juros, que chegaram a menor taxa da história. Não dá para prometer um negócio desses. O ex-presidente também não pode prometer que vai aumentar a inflação, que hoje é a mais baixa dos últimos 20 anos. Nem jogar o Brasil de volta na maior recessão jamais vista por aqui – obra prima de sua criatura, que conseguiu fazer a economia recuar mais de 7% em 2015 e 2016.

    Sempre existe à mão, naturalmente, a história da “ascensão social”, um dos maiores contos do vigário jamais aplicados neste país. Ao final de seu governo, Lula anunciou que a pobreza havia sido extinta por ele no Brasil. Acreditaram nisso, na época, de São José dos Ausentes até a Universidade de Harvard — e talvez dê para reembalar a mercadoria e passar adiante mais uma vez. Segundo o ex-presidente, só haviam sobrado aqui e ali uns poucos pobres para serem salvos; segundo ele, não tinha sido possível localizar fisicamente esses coitados, de tão poucos que eram em nosso vasto território. Dilma teria só de fazer o acabamento. Ela foi rápida. Em 2012 proclamou que a miséria tinha sido extinta de uma vez por todas; a partir de então, só havia no Brasil de classe média para cima. O truque aritmético que usaram para fabricar essa nova realidade é conhecido. Um desses órgãos públicos encarregados de fazer estatísticas, que o PT então utilizava como parte do seu departamento de propaganda, decretou que a classe média no Brasil começava em 1.280 reais por mês; com 1.281 o sujeito já não era mais pobre. Pronto: acabou a pobreza.

    O problema com tudo isso é que o IBGE, com dados apurados durante os próprios governos de Lula e Dilma, acaba de divulgar números oficiais onde a verdade aparece. Em 2016, ano em que Dilma foi despachada, a 31 de agosto, 52 milhões de brasileiros viviam abaixo da linha da pobreza — o que, pensando um pouco, é gente que não acaba mais. Se Lula e o PT eliminaram a miséria, de onde, então, saiu todo esse povo que sobrevive com 18 reais e alguns centavos por dia? O ex-presidente e sua corte têm uma explicação: foi Michel Temer, de agosto do ano passado para cá, quem criou sozinho os 52 milhões de pobres que andam por aí. Só mesmo Lula, agora, para salvar as suas vidas. É meio duro de engolir. Mas, em matéria de promessa, é o que temos no momento.

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