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Augusto Nunes

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A história do tenente colombiano condenado pelos narcoterroristas das FARC ao horror que não tem prazo para terminar

PUBLICADO EM 9 DE AGOSTO DE 2010, UM ANO E QUATRO MESES ANTES DA EXECUÇÃO DE ELKIN RIVAS PELAS FARC, ORGANIZAÇÃO NARCOTERRORISTA QUE SEMPRE CONTOU COM O APOIO DO PT E A PROTEÇÃO DO GOVERNO LULA Ele não dorme numa cama há quase 12 anos. Atravessa as noites acorrentado pelo pescoço, pelos braços ou pelas […]

Por Augusto Nunes Atualizado em 31 jul 2020, 08h24 - Publicado em 13 jul 2012, 15h42
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  • PUBLICADO EM 9 DE AGOSTO DE 2010, UM ANO E QUATRO MESES ANTES DA EXECUÇÃO DE ELKIN RIVAS PELAS FARC, ORGANIZAÇÃO NARCOTERRORISTA QUE SEMPRE CONTOU COM O APOIO DO PT E A PROTEÇÃO DO GOVERNO LULA

    elkin

    Elkin Rivas, aos 22 anos

    Ele não dorme numa cama há quase 12 anos. Atravessa as noites acorrentado pelo pescoço, pelos braços ou pelas pernas a um tronco de árvore, com o corpo estendido sobre uma camada de plástico fino como o dos sacos de lixo, exposto a picadas de insetos ou ataques de animais da selva. Há 143 meses não vê televisão, não usa computador, não lê revistas nem jornais, não conversa sem restrições sobre qualquer assunto. E está proibido de manter relações sexuais há mais de 4 mil dias.

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    Sequestrado pelas Farc em 13 de outubro de 1998, Elkin Rivas sobrevive há quase 100 mil horas ao mais brutal dos cativeiros. Ele tinha 22 anos e era tenente da polícia colombiana quando foi capturado sem ter cometido qualquer crime e sentenciado, sem julgamento formal, a um tipo de horror que não tem prazo para terminar. Aos 34, não sabe quando ─ ou se ─ retomará a vida interrompida. Enquadrado na categoria dos “reféns políticos”, Elkin é um dos 13 remanescentes do grupo cuja soltura as Farc condicionam desde 2006 ao indulto de 500 narcoterroristas capturados pelo governo e condenados pela Justiça.

    O governo de Álvaro Uribe recusou a troca quando os cativos eram 60 e incluía senadores, entre os quais a ex-candidata à presidência Ingrid Betancourt, vários deputados, um general e até três agentes americanos. É improvável que o presidente Juan Manuel Santos aceite um acordo agora que só restaram oficiais de baixa patente. Se tiver muita sorte, uma operação  militar poderá devolver a Elkin o direito de ir e vir. Mas nada lhe devolverá o que perdeu além da liberdade.

    Perdeu para sempre os melhores anos da mocidade. Ao contrário de todos os amigos que continuaram longe da selva, não pôde namorar, casar-se, ter filhos, conversar nas mesas dos bares, conviver com a família, ir ao cinema, dançar, jogar futebol, comer o prato preferido, comemorar o aniversário ─ foram-lhe confiscados todos os pequenos prazeres inseparáveis do ato de viver. Se o tempo na selva escorre com apavorante lentidão para todos os sequestrados ─ mais de 600, calcula-se ─ o mundo segue seu curso com velocidade crescente. E mudou de século e de cara entre o outono de 1998 e o inverno de 2010.

    Enquanto perdia a saúde para as doenças da selva, enquanto perdia as forças  em caminhadas na mata que frequentemente duram sete dias, Elkin perdeu a chance de contemplar as mudanças na paisagem planetária. A Colômbia realizou três eleições presidenciais, alguns países nasceram e outros morreram, as Torres Gêmeas sumiram, os Estados Unidos se envolveram em três guerras e elegeram um presidente negro, um cardeal alemão tornou-se papa. Elkin não viu nada disso.

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    A China se transformou na segunda potência, um homem correu 100 metros em 9 segundos e 58 milésimos, Plutão deixou de ser planeta, descobriu-se que existe água em Marte e na Lua. Houve três Olimpíadas, três Copas do Mundo, o enforcamento de Saddam Hussein, o tsunami no Pacífico, o terremoto no Haiti, a troca de Fidel Castro pelo irmão Raúl. A União Européia adotou o euro como moeda padrão, a Voyager ultrapassou as fronteiras do sistema solar, o dialeto do universo digital incorporou à linguagem corrente expressões, palavras e siglas como pen-drive, Orkut,  iPod, Wikipédia, Youtube, iPhone, Twitter, Facebook ou Google. Elkin perdeu tudo isso.

    Só não perdeu de vez a esperança por não ter perdido a mãe, Magdalena Rivas, que há quase 12 anos impede o filho de sucumbir ao medo do esquecimento. Entre as fobias que escoltam permanentemente um refém, nenhuma é tão angustiante. “O governo precisa lembrar-se dos que continuam prisioneiros das Farc”, repetiu Magdalena em 6 de junho, depois de receber a prova mais recente de que o filho continua vivo: num vídeo, Elkin diz que está bem e pede desculpas aos pais “pelo sofrimento que causou”.

    Em julho, Magdalena animou-se com a bem sucedida operação que resgatou o general Luis Mendieta, o coronel Enrique Murillo, o capitão Willian Donato e o sargento Arbey Delgado. Mas logo foi assaltada pela hipótese aflitiva: “Essa gente pode agir em represália contra os sequestrados”, assustou-se. “Eles continuam lá, acorrentados, numa situação que uma mãe não consegue entender”.

    O presidente Hugo Chávez não só compreende como aprova, apoia e financia os quase 8 mil carcereiros das Farc. Denunciado por Álvaro Uribe por hospedar 1.500 narcoterroristas, Chávez primeiro tentou desmentir o crime copiosamente documentado, depois rompeu relações com a Colômbia e, ao enfim admitir a existência das bases paramilitares em território venezuelano, reiterou as juras de inocência. Neste domingo, voltou a simular interesse pela sorte dos reféns supliciados pela organização criminosa que patrocina.

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    “O Brasil tem uma posição neutra sobre as Farc”, disse ao jornal francês Le Figaro o conselheiro presidencial Marco Aurélio Garcia. Como se não fosse obscena a neutralidade que iguala um governo constitucional a um bando narcoterrorista. O presidente Lula faz de conta que nunca houve o desafio reiterado pelas Farc desde 1964.  “Nós não temos guerras neste continente”, recitou o chefe de governo ao candidatar-se a mediador da crise que envolve a Colômbia e a Venezuela. “Só existem conflitos verbais”. São declarações deploráveis, retrucou Uribe.

    O adjetivo é brando. Como advertiu o presidente colombiano, quem não enxerga nas Farc uma ameaça intolerável à democracia é, na hipótese mais misericordiosa, um comparsa de liberticidas e um cúmplice de carrascos. Se não há guerra, como fantasia Lula, então não há prisioneiros de guerra. Os elkins acorrentados na selva, portanto, não existem.

    Enquanto um jovem colombiano tentava dormir acorrentado, o palanqueiro profissional desfrutou os oito melhores anos de sua vida. É demais cobrar compaixão de quem não sabe o que é isso. Mas os homens decentes devem exigir que Lula pelo menos interrompa o espetáculo do cinismo.

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    Elkin Rivas, aos 34 anos

    EM 26 DE NOVEMBRO DE 2011, O TENENTE ELKIN RIVAS FOI EXECUTADO PELOS SEQUESTRADORES, DURANTE UMA TENTATIVA DE RESGATE FEITA PELO EXÉRCITO COLOMBIANO. MORREU IMOBILIZADO POR CORRENTES NOS BRAÇOS E NAS PERNAS. O GOVERNO BRASILEIRO NÃO SE MANIFESTOU SOBRE O ASSASSINATO.

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