PUBLICADO NO GLOBO DESTA TERÇA-FEIRA
Gil Castello Branco
A Torre de Babel, segundo a Bíblia, foi construída na Mesopotâmia, pelos descendentes de Noé. A decisão era fazê-la tão alta que alcançasse o céu. Esta soberba provocou a ira de Deus que, para castigá-los, confundiu-lhes as línguas e os espalhou por toda a Terra.
O mito vem à tona no acompanhamento dos gastos da Copa 2014. Para começar, existem pelo menos 5 portais na internet com dados globais sobre o evento, criados pela
Controladoria Geral da União (CGU),
Senado Federal,
Tribunal de Contas da União (TCU),
Ministério do Esporte e
Instituto Ethos. Apesar da louvável intenção de dar transparência ao megaevento, faz-se necessário o trânsito permanente de informações entre os governos municipais, estaduais e federal para que os sites estejam sempre atualizados, o que infelizmente não está acontecendo.
Assim, ganha um doce quem conseguir dizer quanto custará a Copa do Mundo 2014.
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A Controladoria Geral da União, por exemplo, informa que os investimentos em aeroportos, portos, estádios, mobilidade urbana e os financiamentos para novos hotéis custarão R$ 27 bilhões. Aliás, faltando 28 meses para o início do mundial, o próprio site do governo federal evidencia o atraso da programação, ao mostrar que somente R$ 9,9 bilhões (37%) foram contratados e apenas R$ 1,4 bilhão (5,2%) foi pago. Lentidão à parte, convém ressaltar que os R$ 27 bilhões correspondem somente ao chamado Primeiro Ciclo, não incluindo itens como segurança, telecomunicações, infraestruturas energética e turística, saúde e qualificação profissional.
Mesmo o valor previsto para a etapa inicial (R$ 27 bilhões) está longe da realidade. Os financiamentos públicos para hotelaria, por exemplo, deverão ser muito maiores do que os que estão lançados no portal. Os R$ 350,1 milhões contratados até agora destinam-se à implantação de dois novos empreendimentos, em Botafogo e Copacabana, à revitalização do Glória e à instalação de hotel em Aparecida do Norte (SP). Muito provavelmente, outros hotéis serão construídos. O valor total disponibilizado pelas linhas de financiamento do BNDES e dos Fundos Constitucionais (Norte, Nordeste e Centro-Oeste) para essa finalidade é de R$ 1,9 bilhão, podendo ser ampliado conforme a demanda.
Outro exemplo de discrepância gritante entre o valor orçado e o real é o Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha. O custo frequentemente divulgado é de R$ 688,3 milhões. Nesse montante, porém, não está incluída a cobertura da arena que acaba de ser licitada, elevando o dispêndio para cerca de R$ 850 milhões. Também não constavam da previsão original as despesas com o gramado, a iluminação, as cadeiras, os elevadores, dentre outros “detalhes”. Ou seja, a estimativa do Governo do Distrito Federal refere-se, basicamente, à estrutura de concreto. Algo como se fosse possível calcular o custo de uma casa sem telhado, piso, luz etc…
De fato, encontrar o custo real do elefante branco em construção na Capital não é tarefa fácil. O valor de R$ 688,3 milhões (sem cobertura, gramado etc..) ainda é informado nos sites da CGU e do Ministério do Esporte. No site do Instituto Ethos encontra-se R$ 745,3 milhões. No site do Senado consta R$ 671,1 milhões. Até mesmo a foto do estádio que ilustra os portais do Tribunal de Contas da União e do Ethos é a da ver são inicial do projeto, já completamente alterada.
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Quanto à execução financeira, embora estejamos em fevereiro de 2012, os dados mais recentes computados no portal do Senado (30/6/2011) mostram que foram pagos R$ 223,8 milhões dos R$ 671,1 previstos (33%). No site da CGU os valores executados até 9 de novembro de 2011 somam R$ 73,99 milhões dos R$ 688,3 milhões previstos (11%). Para o governador Agnelo Queiroz, as obras já estão na metade.
Assim como ocorre com o estádio em Brasília, os portais divulgam informações desatualizadas, incompletas e até contraditórias sobre outros empreendimentos, nas diversas cidades- sede. A promessa de que qualquer cidadão poderia acompanhar os custos da Copa ainda não foi cumprida. É urgente, portanto, que seja criada uma sistemática regular de alimentação e atualização desses portais, para que atendam à finalidade para a qual foram criados.
Até porque ─ ao contrário do que foi dito inicialmente ─ os recursos públicos é que irão custear a festa. Assim, é natural que os brasileiros queiram saber o total dessa conta. Com a verdadeira “babel” de informações, não se chegará ao céu. Na prática, até agora, ninguém sabe quanto custará a Copa, nem mesmo a Dilma que chegou do Haiti.