Pra que mentir?
A possibilidade de o porteiro do condomínio de Jair Bolsonaro ter mentido mostra um problema em nosso Código de Processo Penal
A possibilidade de o porteiro do condomínio de Jair Bolsonaro ter mentido levanta a bola para algo esdrúxulo em nosso Código de Processo Penal: no Brasil, se o réu mentir, não há consequência alguma. Em vários países do mundo nos quais há amplo direito de defesa o réu pode, evidentemente, mentir. Porém, se for pego na mentira ele será processado pelo crime de perjúrio.
Aqui no Brasil isso só se aplica às testemunhas, como é o caso do porteiro. Os acusados do crime de assassinato de Marielle, ao contrário do porteiro, poderão mentir livremente sem consequência alguma. O impacto disso em nosso sistema judiciário é devastador. A primeira coisa que ocorre é que juízes e desembargadores sempre ouvem os réus e seus advogados já supondo que estão mentindo. A segunda, tão ou mais grave, diz respeito à ética pública de nossos advogados: eles também podem mentir sem consequência alguma.
Aqueles que defendem que o Brasil mantenha esta possibilidade no Código de Processo Penal argumentam que isso assegura o amplo direito de defesa. Todavia, essas pessoas deixam de fora de sua argumentação o fato de que o amplo direito de defesa existe em todos os países do Ocidente, incluindo aqueles que criminalizam o réu mentir. Se isso não mudar em nosso Código de Processo Penal continuaremos tendo uma Justiça ultrapassada, pré-moderna.