A busca filosófica e cultural por vida inteligente fora da Terra remonta a milênios, mas a investigação científica nesse campo começou de fato apenas no início do século XX. Os primeiros esforços organizados tiveram início na década de 1960, com o Projeto Ozma, que usava radiotelescópios para procurar potenciais sinais vindos do espaço. Pouco tempo depois, o astrofísico americano Frank Drake formulou uma equação que leva seu nome destinada a estimar o número de potenciais civilizações detectáveis no Universo. Com o tempo e os avanços tecnológicos da corrida espacial, os projetos de uma organização chamada SETI, na sigla em inglês, acrônimo para “busca por inteligência extraterrestre”, entrou em cena com telescópios e algoritmos rebuscados.
Há novidades nesse campo de fascínio permanente, alimentado pelo desconhecido e pela improbabilidade. Em artigo publicado no respeitado Astronomical Journal, pesquisadores do Centro de Pesquisa SETI de Berkeley e da Universidade de Washington esmiuçaram um método afeito a vasculhar rastros de alienígenas em regiões específicas do firmamento infinito. Batizado de Elipsoide SETI, é uma abordagem estratégica para selecionar potenciais candidatos a “assinaturas tecnológicas”, sinais de algum tipo de vida extraterrestre. O pressuposto é que civilizações avançadas, ao testemunharem um evento galáctico significativo, como uma explosão estelar (a supernova), poderiam usar o evento como atalho para enviar mensagens em forma de ruídos.
Parece um tanto complicado, mas não é (veja no quadro). O que vale mesmo é a intenção, muito mais do que a engrenagem técnica. A estratégia bebe de rastreamentos anteriores, amplos e contínuos do céu, atrelada à imensa capacidade atual de ouvir o que vem do Cosmo. “As pesquisas inovadoras oferecem oportunidades que antes não existiam”, diz a coautora do estudo Bárbara Cabrales. A ideia é rastrear regiões que estejam devidamente documentadas, a partir de missões espaciais já realizadas, e a partir das observações determinar o que parece ser um comportamento normal e o que, eureca!, possa vir a ser o sussurro de alguém ou algo lá de fora, de muito longe.
O mais recente ponto de atenção dos caçadores de ETs, chamemos assim, é a supernova SN 1987A, um caso emblemático. Há cerca de 200 000 anos, um exemplar supergigante, azul, azul, explodiu na região da Grande Nuvem de Magalhães, pequena galáxia vizinha da Via Láctea. A luz que emanou daquele evento percorreu o espaço a 300 milhões de metros por segundo e chegou à Terra em 24 de fevereiro de 1987 — daí o batismo numérico da ocorrência. O brilho seguiu seu curso, ultrapassando o universo em expansão. Supõe-se, caso os sonhadores estejam certos, terem atingido potenciais vidas inteligentes. A tal Elipsoide SETI trabalha com essa hipótese. Com a Terra em uma ponta e a SN 1987A na outra, a área no formato de um ovo indicaria o perímetro no qual seria possível captar algum registro de outras espécies.
Há alguma euforia entre os crentes — cientistas de excelência, ressalve-se — dada a descomunal riqueza dos bancos de dados recolhidos de observatórios e das missões promovidas pela Nasa. Há uma certeza: nunca a civilização que chegou à Lua e pensa pousar em Marte, a civilização que criou a bomba atômica e as sinfonias de Beethoven, teve tantas ferramentas para procurar por irmãos. O problema é que eles precisam existir, por óbvio. Não seria exagero dizer, contudo, que a agulha agora pode ser buscada em palheiro mais circunscrito. “Qualquer técnica que possa nos ajudar a priorizar onde procurá-los representa uma esperança”, diz Sofia Sheikh, do SETI. “A possibilidade que acabamos de anunciar é um precedente emocionante para os próximos grandes passos.” É emoção que, desde sempre, na poesia e na literatura, nas canções e no cinema, alimentou a criatividade humana e nos fez rir e chorar.
Foi assim com o bichinho feioso de olhar inspirado em Einstein que comoveu a criançada (e os adultos) em ET — O Extraterrestre, dirigido por Steven Spielberg em 1982. O próprio Spielberg, aliás, já tinha dado a deixa com outro trabalho, menos conhecido, o melancólico Contatos Imediatos do Terceiro Grau, de 1977, no qual os ETs davam pistas de sua existência por meio de uma sequência de notas musicais. E como esquecer de duas das mais bem-sucedidas franquias das telas, Star Trek e Star Wars? Até podermos trocar olhar com semelhantes de outro mundo, se é que um dia chegaremos lá, a arte alimentará a expectativa.
Por enquanto, apesar de tanta investigação, em sondas a navegar por outros sistemas e galáxias, só existimos nós e mais ninguém. Ponto. Encontrar outras vidas seria como nos ver no espelho, entender de onde viemos e como evitar a transformação de nosso planeta em um deserto infértil e sem possibilidade de prosperar.
Publicado em VEJA de 1º de março de 2024, edição nº 2882