A Amazônia é a maior floresta tropical do mundo. Com mais de 30 mil espécies já descobertas e uma imensidade de seres ainda indecifrados, ela abriga, não só uma grande riqueza natural, mas um catálogo de plantas, animais e substâncias com grande potencial biotecnológico, mas que diariamente são perdidos para o desmatamento. Para contornar essa ameaça, um grupo de cientistas pensou na criação de um banco genético que promete proteger esse tesouro e revolucionar o mercado.
“A informação que está no genes de todas as plantas é um super ativo”, afirma o diretor do Instituto Amazônia 4.0, Ismael Nobre, idealizador do projeto. De fato, são informações preciosas. Além do valor inquestionável de preservar a biodiversidade, esses genes guardam a receita de moléculas que podem ser úteis na medicina ou em processos industriais – uma investigação chamada de bioprospecção.
O Biobanco da Amazônia é um projeto que visa explorar esse recurso ao mesmo tempo que traz retorno às populações locais. Hoje, o estudo genético dessa biodiversidade é feito por instituições públicas que disponibilizam essas sequências gratuitamente na internet ou por instituições privadas que se apropriam dessa informação biológica, provendo pouco ou nenhum ganho para as populações locais. “O que nós estamos fazendo é buscar um meio termo”, diz Ismael Nobre.
A ideia é inovadora e depende quase em sua totalidade dos moradores locais, o que inclui desde indígenas até extrativistas. Em resumo, eles seriam treinados para utilizar equipamentos de alta tecnologia para fazer o sequenciamento genético. Essas informações, então, seriam processadas por especialistas e, por último, seriam incluídas na plataforma. Nessa última etapa, a população local volta a ser importante para agregar o conhecimento tradicional à amostra que foi analisada molecularmente.
Parece simples, mas a ideia exige uma grande engenharia para funcionar. Além dos equipamentos caros, eles dependem de um grande poder computacional para serem processados e armazenados. A solução foi pensar em um sistema descentralizado, o que possibilita que mais pessoas contribuam com o projeto.
O Instituto Amazônia 4.0 conta com alguns colaboradores, entre eles a Faculdade Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), responsável por construir a plataforma do zero. “Nós utilizamos blockchain para fazer essa transferência, uma tecnologia que permite que todas as transações sejam feitas de maneira transparente e auditavel, garantindo que tudo seja feito nos maneira correta”, afirma o mestrando do Laboratório de Arquitetura e Redes de Computadores (Larc) da USP, Leonardo Kimura.
Nesse biobanco, as informações ficariam parcialmente públicas, mas para ter acesso aos dados genômicos, os pesquisadores ou as empresas precisam comprá-lo. Toda vez que isso ocorre, todos os que estiveram envolvidos recebem uma parte. Além disso, o contrato também pode prever que os lucros obtidos, para a síntese de um novo fármaco, por exemplo, sejam divididos com os trabalhadores.
Segundo a supervisora do projeto na USP, Tereza Carvalho, o sistema está quase pronto e agora precisará ser validado pelo instituto. O projeto ainda precisará de muito trabalho para ser efetivado, visto que essa é a primeira iniciativa desse tipo existente hoje. Além da construção dos Laboratórios Criativos da Amazônia, que centralizarão o processamento dos dados genômicos, os envolvidos ainda precisarão trabalhar para adequar as legislações e estudar os valores que permitirão que todos sejam remunerados adequadamente.
O banco é apenas um dos projetos do Instituto voltados para a bioeconomia, um conjunto de iniciativas que visam agregar valor aos produtos gerados pelas populações que vivem na amazônia através da tecnologia. O exemplo que está mais próximo de ser viabilizado tem a ver com o cacau. Hoje, as populações vendem esse produto por preços muito baixos, mas se o projeto funcionar, pequenas fábricas serão instaladas para permitir a produção de chocolate, um produto com alto valor agregado que aumentará exponencialmente o lucro desses produtores.