Aquecimento global espalha mosquitos da malária para novas regiões
Estudo feito no continente africano estima um deslocamento acentuado em direção ao Pólo Sul; Brasil tem área endêmica
O aquecimento global é fonte de muitas preocupações na comunidade científica. Uma delas é o avanço de espécies transmissoras de doenças para novas áreas. Uma pesquisa recente mostra que essa ameaça não é mais só teórica. Mosquitos da malária estão explorando novos espaços e buscando por regiões quentes há mais de um século na África.
O estudo encabeçado pelo biólogo Colin Carlson usa um conjunto de dados compilados por médicos para delimitar os limites da distribuição de 22 espécies de mosquito Anopheles entre 1898 e 2016. Ao longo desses últimos 120 anos, o planeta aqueceu uma média de 1,2°C, abrindo novas áreas adequadas para a procriação da espécie. Diante dessas condições, os mosquitos se espalharam por aproximadamente 4,7 quilômetros para o sul todos os anos e também subiram 6,5 metros de altitude.
Os resultados não são uma boa notícia e demonstram que os mosquitos estão indo para mais longe muito mais rápido do que estudos anteriores estimavam. As somas finais demonstram que a espécie Anopheles está em um movimento de expansão tão acentuado que agora se encontram em média 500 quilômetros mais perto do Pólo Sul e 700 metros acima da curva de altitude do que estava no começo do século XX, o que indica que o aumento das temperaturas está claramente levando esses insetos a ocuparem novos habitats.
Embora o estudo tenha se concentrado em rastrear apenas mosquitos do gênero Anopheles, os autores levantam a hipótese de que outras espécies de mosquitos também possam ter passado por fenômenos semelhantes. Eles destacam que refazer a propagação desses insetos ao longo da história pode ajudar a explicar a mudança nos padrões de transmissão da malária em algumas regiões do continente africano.
Os dados levantados contribuem para a melhor alocação dos recursos de saúde, que os pesquisadores acreditam devem ser direcionados para as margens das zonas de transmissão, em áreas que não estão acostumadas a lidar com a doença. Estudos anteriores de Carlson mostram que a malária não é a única fonte de preocupação. O biólogo demonstrou que o mosquito Aedes aegypti – vetor dos vírus da dengue, zika e chikungunya – também está expandindo sua área de contágio.
Embora tenha analisado o avanço de transmissores de doenças no continente africano, as espécies estudadas também são um problema no Brasil, que tem um amplo histórico de contágio pelas doenças levantadas pelos pesquisadores. De acordo com dados do Ministério da Saúde, a região Amazônica brasileira é considerada a área endêmica do país para a malária, com 99% dos casos autóctones – de infecção local -. Nas áreas fora da região amazônica, mais de 80% dos casos registrados são importados dos estados pertencentes à área endêmica, de outros países amazônicos ou do continente africano.
Em 2022 o país teve 123.151 casos de malária registrados, dos quais 11.530 ocorreram entre indígenas yanomami, o que significa quase 10% dos casos de todo o país. O povo yanomami representa apenas 0,013% da população brasileira. O surto de malária nesta população reflete a crise humanitária amplamente divulgada no começo deste ano.