Retorno à natureza: a tendência de decorar a casa com (muitas) plantas
A onda não só estimula esse tipo de comércio como faz bem ao organismo
Entre as alterações do cotidiano no último ano, em decorrência da pandemia, há uma que tem chamado pouco a atenção, mas preocupa: o distanciamento da natureza, dentro de casa. Com a impossibilidade dos passeios ao ar livre e os longos períodos dentro de casa, houve redução drástica do contato com o verde e da sensação do sol na pele. Numa tentativa de mitigar esse fenômeno, no entanto, uma nova tendência vem ganhando força na decoração: nunca se viu uma procura tão grande por elementos da natureza para ornamentar os lares.
Os números são contundentes. Ao longo dos últimos doze meses, a venda de plantas e itens de jardinagem, como vasos, ferramentas e terra, teve um crescimento de robustos 21%. Apenas no setor de flores, foram movimentados nada menos que 9,5 bilhões de reais, um aumento de 10,7% em relação ao ano anterior, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Floricultura. “Essa transformação deixa o ambiente doméstico extremamente agradável e humanizado, além de fazer bem para a saúde”, diz a arquiteta Solange Pinto, do Rio.
É verdade. O contato com a natureza, revelam estudos respeitados, traz uma série de benefícios para o corpo, diminuindo o risco de desenvolvimento de doenças psiquiátricas, aliviando o stress e prevenindo problemas cardíacos. Um trabalho publicado na revista científica Nature mostrou que cerca de 10% dos casos de depressão e de pressão alta poderiam ser prevenidos com ao menos duas horas por semana de lida com a natureza. E não é preciso ter uma casa no campo. Isso vale também para quem cuida de hortas urbanas ou zela pelo vaso de flor, regado com frequência.
Uma das hipóteses para explicar essa relação é o bem-estar deflagrado pelo visual e pelo cheiro das plantas. Há resultado também com uma simples troca da disposição dos móveis nas salas e quartos. Trata-se, em outras palavras, de facilitar a entrada abundante da claridade pelas janelas. A luz solar, além de estimular a produção de vitaminas, pode aumentar os níveis de endorfina pelo cérebro, substância antidepressiva natural, nitidamente associada ao prazer.
Evidentemente, a percepção sobre a importância de investir no verde dentro de casa não é de agora. Na verdade, ela foi apenas acelerada pela eclosão do vírus e pela mudança de comportamento por ele imposta. Já em 2016, o escritor americano Richard Louv, autor do best-seller A Última Criança na Natureza, traduzido para mais de quinze idiomas, cunhou o termo “transtorno do déficit de natureza”, chamando a atenção para o tema, até então desdenhado.
Destacando casos, em um minucioso levantamento, Louv mostrou que os seres humanos têm atração inata pela natureza e, por isso, é fundamental não serem privados dela, de modo a fortalecer a saúde mental e física. Nunca, em tempos de pandemia e consequente reclusão para tantas pessoas, tal tese fez tanto sentido.
Publicado em VEJA de 30 de junho de 2021, edição nº 2744