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Queiroz, Flávio Bolsonaro e o inquérito da ‘rachadinha’: o cerco se fecha

Ressurge o caso que assombra a família presidencial na forma de busca e apreensão ordenadas pelo MP do Rio

Por Leandro Resende
Atualizado em 20 dez 2019, 09h59 - Publicado em 20 dez 2019, 06h00

O fantasma do PM aposentado Fabrício Queiroz paira sobre os Bolsonaro desde dezembro de 2018. Na época, veio a público um relatório do Coaf que apontava movimentações atípicas em sua conta bancária quando ele era assessor do então deputado estadual e hoje senador Flávio Bolsonaro. Queiroz sumiu de cena e o caso ficou congelado quase cinco meses, em razão de uma liminar do presidente do STF, Dias Tof­foli, que suspendeu todo o trabalho feito com base no compartilhamento, sem autorização judicial, de dados de órgãos de fiscalização. A decisão foi revertida pelo Supremo no fim de novembro, e, menos de um mês depois, a investigação ressurgiu, com grande estardalhaço.

No dia 18, uma operação do Ministério Público do Rio bateu à porta de 24 endereços ligados a Queiroz, Flávio e Ana Cristina Valle, ex-mulher de Jair Bolsonaro. O mandado de busca e apreensão incluiu a autorização para a extração de conversas por telefone, SMS e Whats­App. O inquérito apura um suposto esquema de “rachadinha” no antigo gabinete de Flávio — prática ilegal pela qual os funcionários devolvem parte dos salários recebidos. Na decisão de trinta páginas que autorizou a ação na última quarta-feira, o juiz Flávio Itabaiana de Oliveira Nicolau, da 27ª Vara Criminal do Rio, aponta indícios de uma “organização criminosa com alto grau de permanência e estabilidade”. O MP sustenta duas teses principais: a de que Flávio usou imóveis, um PM e a loja de chocolates da qual é sócio para lavar dinheiro do esquema e a de que Queiroz era o “arrecadador” dos recursos.

Entre 2007 e 2018, treze ex-assessores de Flávio enviaram pouco mais de 2 milhões de reais para a conta bancária de Queiroz. Foram 483 depósitos, 69% deles em dinheiro. Segundo o MP, também cabia a Queiroz arregimentar pessoas de sua confiança para participar do esquema, cuja operação é dividida em seis grupos. Um deles envolve a família de Ana Cristina, mãe de um dos filhos do presidente, Jair Renan. Dez pessoas ligadas a ela que viviam em Resende, a 168 quilômetros da Assembleia Legislativa do Rio, onde deveriam dar expediente, pegaram seus salários para “repassar os valores em espécie a outros integrantes da organização criminosa”, de acordo com o MP. No total, elas sacaram 4 milhões de reais — o equivalente a 93% do que receberam.

OFENSIVA – Agentes em ação no dia 18: autorização para revistar 24 endereços (Fabiano Rocha/Agência O Globo)

Outra suspeita diz respeito a uma negociação de imóveis feita por Flávio. Os investigadores afirmam que o lucro alcançado com a compra e venda de dois apartamentos em Copacabana foi “lavagem de parte dos recursos obtidos através do esquema das rachadinhas”. É nesse contexto que surge mais um policial militar capaz de trazer dor de cabeça ao Zero Um. O sargento Diego Sodré de Castro Ambrósio quitou um boleto de 16 500 reais para Fernanda Bolsonaro, esposa do hoje senador, referente à prestação da compra de um apartamento para o casal no bairro de Laranjeiras, em outubro de 2016. No mesmo ano, pagou valores a dois assessores de Flávio e passou a fazer depósitos regulares na conta-corrente da loja de chocolates da qual o parlamentar é sócio, na Barra. A Justiça deferiu a quebra do sigilo bancário do PM porque suspeita que ele e sua empresa participaram da lavagem de dinheiro. A VEJA, Ambrósio justificou o pagamento do boleto de 16 500 reais com uma história estapafúrdia. “Nesses dez anos em que sou amigo do Flávio, só paguei uma única conta do cara. Num momento excepcional. Nós estávamos numa festa e, para a gente não sair para ir ao banco, eu paguei na hora. Coisa trivial, comum, do dia a dia.” Essa versão é tão difícil de engolir quanto a justificativa de Queiroz de que sua movimentação bancária teria vindo da compra e venda de carros.

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Ambrósio vive em um condomínio de luxo no Recreio dos Bandeirantes e tem evitado circular por lá desde que a casa foi alvo do MP. Sua empresa, a Santa Clara Serviços, fica em uma pequena sala com uma mesa em Copacabana. Apenas uma pessoa apareceu no local após a operação. Outro ex-­PM, Adriano Magalhães da Nóbrega, apontado como chefe da milícia de Rio das Pedras, usou de sua amizade com Queiroz para empregar a mãe, Raimunda Veras Magalhães, e a ex-­esposa, Danielle Mendonça — a investigação mostra que, juntas, elas repassaram 203 000 reais dos salários a Queiroz. Em mensagem apreendida, Danielle diz a uma amiga estar há muito tempo “incomodada com a origem do dinheiro”. Queiroz, segundo o MP, atuou com o miliciano para embaraçar a investigação ao recomendar que Danielle faltasse a um depoimento.

As defesas de Flávio e de Queiroz afirmaram que a operação do MP foi “desnecessária” e que estudam medidas contra a ação. Em entrevista a VEJA, o presidente disse que o movimento tem como objetivo manchar a reputação de sua família e que por trás disso está a pretensão do governador fluminense Wilson Witzel de chegar ao Palácio do Planalto em 2022. “Flávio é inocente, e perseguem todos que estão ao meu lado”, afirmou (confira a reportagem). Queiroz, que está calado desde que o escândalo veio à tona, faz tratamento de saúde no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, como mostrou VEJA em setembro. Nos últimos dias, o site da revista revelou que o câncer que havia sido retirado de seu intestino voltou a se manifestar, desta vez em nódulos. Queiroz ficou arrasado com o diagnóstico. O ressurgimento das investigações sobre o caso da rachadinha representou para ele outra péssima notícia.

Com reportagem de Bruna Motta

Publicado em VEJA de 25 de dezembro de 2019, edição nº 2666

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