Uma reportagem da nova edição de VEJA mostra como o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Lula, considerados desde já protagonistas para a próxima corrida ao Palácio do Planalto, desempenham até aqui papeis de coadjuvantes nas eleições municipais. Os candidatos de ambos nas grandes capitais enfrentam dificuldades para deslanchar. Em São Paulo e no Rio de Janeiro, por exemplo, os nomes apoiados por Bolsonaro estão em segundo lugar, mas — estagnados ou em trajetória descendente — correm sério de risco de ficar de fora do segundo turno. São eles: o deputado Celso Russomanno e o prefeito Marcelo Crivella. A situação dos correligionários de Lula é ainda pior. Nas mesmas cidades, os postulantes do PT (Jilmar Tatto e Benedita da Silva) aparecem na quinta e na quarta colocações, respectivamente.
Tanto bolsonaristas quanto petistas dizem que a situação eleitoral dos afilhados políticos não pode ser debitada na conta do ex-capitão e do ex-presidente — nem ser vista como debilidade de ambos. Motivo: as eleições municipais teriam uma pauta e um pano de fundo muito diferentes das disputas nacionais. Daqui a duas semanas, quando escolherem prefeitos e vereadores, os eleitores levarão em consideração principalmente questões locais, do dia a dia, como a situação do transporte público e do pronto socorro do bairro. Especialistas e políticos ouvidos por VEJA concordam com essa análise. Professor da Fundação Getúlio Vargas, o cientista político George Avelino diz que nem mesmo a pandemia de Covid-19, com seus impactos econômicos e mais de 160 000 mortes, foi capaz de nacionalizar o debate.
Avelino aposta que, apesar de terem na manga um argumento comum, Bolsonaro e Lula sofrerão impactos diferentes caso seus pupilos sejam derrotados nas urnas. O presidente, diz o professor da FGV, tentará se apresentar como o responsável pelas vitórias e se afastar o máximo possível das derrotas de seus aliados, num oportunismo já bastante conhecido. Essa análise é ancorada em fatos. Na sexta-feira 30, Bolsonaro recebeu o prefeito do Rio, Marcelo Crivella, no Palácio da Alvorada e gravou um vídeo em apoio a ele, que é candidato à reeleição. O encontro ocorreu poucas horas depois de o mandatário, na sua tradicional live das quintas-feiras, fazer uma defesa tímida do voto em Crivella, dizendo que quem não quisesse votar nele que ficasse tranquilo. Não haveria briga por isso.
“Bolsonaro dificilmente vai se engajar numa candidatura para ser derrotado. Ele só apareceria para colher os louros de uma vitória. O presidente vai se manter próximo ou distante por conveniência”, afirma Avelino. Já Lula teria enorme dificuldade para se distanciar dos resultados dos candidatos petistas. “Independentemente de Lula participar diretamente ou não na campanha de um candidato, é uma derrota petista e uma derrota de Lula, porque o partido e o ex-presidente são indissociáveis e possuem projetos políticos que se tornaram mais ou menos claros para o eleitor médio”, acrescenta Avelino. O ex-presidente sempre se gabou de ser um senhor cabo eleitoral. Prova disso seriam as eleições de neófitos para a Presidência da República em 2010 (Dilma Rousseff) e para a prefeitura de São Paulo em 2012 (Fernando Haddad).
Os petistas não dão o braço a torcer diante do quadro desfavorável na corrida pelas prefeituras das capitais. Alegam que faltam duas semanas para a votação e, por isso, seus concorrentes podem ganhar terreno. Acrescentam que, mesmo que isso não ocorra, a eleição municipal terá pouco impacto sobre a próxima sucessão presidencial. Eles lembram que quando Lula conquistou a Presidência, em 2002, a sigla não comandava capitais. Afirmam ainda que, depois da sova tomada na eleição municipal de 2016, fizeram a maior bancada de deputados em 2018. “O PSDB foi o partido mais votado nas eleições municipais em 2016, enquanto o PT perdeu mais de 60% dos seus eleitores na comparação com o pleito municipal anterior. Dois anos depois, o PT elegeu a maior bancada na Câmara junto com o PSL. Eleição para presidente faz o eleitor pensar na sociedade que ele projeta, enquanto que na eleição para prefeito o sujeito quer que o ônibus circule, o posto de saúde funcione e que o buraco na rua seja tapado”, diz o cientista político Alberto Carlos de Almeida, autor do livro O Voto do Brasileiro.