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Lula faz recuo estratégico com mudanças no seu esquema de segurança

Ao tirar da PF a coordenação da estrutura de proteção do presidente e devolvê-la aos militares, petista indica aceno de trégua em um ambiente de crise

Por Marcela Mattos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 10h21 - Publicado em 1 jul 2023, 08h00

Adepto das mais variadas teorias da conspiração, o ex-presidente Jair Bolsonaro se via permanentemente na mira de potenciais assassinos, cercado por traidores e alvo de tramas para tirá-lo do poder. Por outro lado, se havia algum nível de confiança em alguém, ele era depositado nos militares, que foram destacados para ocupar cargos em todos os escalões do governo. Agora, com Lula à frente do Planalto, o sentimento é o mesmo, só que na direção contrária. Desde a eleição, o petista se vê rodeado pelas mesmas ameaças que assombravam Bolsonaro, com a diferença de ele não buscar abrigo nas Forças Armadas. Ao contrário: é lá que estariam os inimigos, convicção que se consolidou depois dos ataques do 8 de Janeiro. Até dias atrás, a ordem era manter a tropa o mais afastado possível do presidente da República e das áreas sensíveis de poder. Mas algo mudou.

Na quarta-feira 28, o governo anunciou uma, pode-se dizer, surpreendente mudança no esquema de proteção do presidente. Ao tomar posse, um dos primeiros atos assinados por Lula foi retirar da órbita do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) a sua segurança pessoal, quebrando uma tradição de mais de oito décadas. Nos seis primeiros meses de governo, o petista vinha mantendo uma distância regulamentar dos militares. Ele se recusou a designar um ajudante de ordens, função exercida por oficiais, e indicou um civil para chefiar o Ministério da Defesa. O nível de desconfiança chegou ao ponto de a primeira-dama Janja sugerir a substituição da tripulação e dos pilotos do avião presidencial, todos oficiais da Aeronáutica. Como não há pilotos civis no quadro de servidores da Força Aérea, a iniciativa foi abandonada. A rejeição, não. Numa mudança encabeçada pelo à época chefe de segurança de Lula e atual diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, foi criada em janeiro uma secretaria extraordinária para alijar os militares da função e cuidar da segurança direta de Lula. A mudança, por tudo isso, surpreendeu.

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RIVALIDADE - Andrei, da PF, e Amaro, do GSI: general levou a melhor na disputa (Tom CostaA/MJSP; Cristiano Mariz/Ag. O Globo/.)

A PF, que defendia a manutenção do sistema em vigor, ameaçou uma insubordinação caso ficasse vinculada aos militares e chegou a desqualificar o serviço prestado por eles. “No nosso dia a dia a gente não fica pintando meio fio e jogando futebol. A gente fica fazendo a segurança de dignitário”, ironizou um interlocutor que acompanhou as tratativas. Em resposta, o GSI disse, por meio de nota enviada a VEJA, que todos os militares na segurança têm, no mínimo, quinze anos de experiência profissional. A disputa pelo controle da segurança presidencial tornou evidente uma rusga entre dois poderosos ministros de Lula. Em meio às negociações, o chefe da Casa Civil, Rui Costa, antecipou que a segurança do presidente voltaria para a responsabilidade do GSI, chefiado pelo general Marcos Amaro. Dias depois, no entanto, Flávio Dino veio a público para negar que qualquer decisão tivesse sido tomada, enquanto, a portas fechadas, tentava convencer Lula a deixar a função com a PF. Nos bastidores, Dino e Costa, ambos virtuais sucessores do presidente, vêm travando uma batalha por protagonismo.

Dentro do governo, não são poucos os que ainda se referem aos militares com palavras pouco republicanas, embalados pelos ataques às sedes dos Três Poderes e pela manutenção, por mais de dois meses, dos famosos acampamentos em frente a quartéis-generais. Além disso, a revelação das mensagens encontradas no celular de Mauro Cid, que traziam o planejamento de uma intervenção militar, voltou a acirrar os ânimos e reforçar algumas certezas. “A maioria do alto-comando torcia pelos golpistas”, disse a VEJA um dos ministros mais influentes. Pelo outro lado, o comandante do Exército, Tomás Paiva, garantia que as manifestações contrárias às eleições por parte de alguns fardados não passavam de declarações isoladas e que jamais houve qualquer mobilização real, com uso de armas ou tropas, com o objetivo de questionar ou reverter o resultado das urnas.

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Auxiliares do presidente reconhecem que o clima entre ele e os militares não é bom, mas já foi muito pior. “Se compararmos com dezembro, que ninguém conversava conosco, era zero de interlocução, melhorou bastante. O clima era de total hostilidade”, lembra um ministro próximo ao presidente. Ao devolver a coordenação de sua segurança aos militares, Lula faz um aceno de trégua, num momento em que a Polícia Federal, que não ficou nada satisfeita com a mudança, mira oficiais do Exército supostamente envolvidos no planejamento de atos golpistas. O jogo está apenas começando.

Publicado em VEJA de 5 de Julho de 2023, edição nº 2848

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