O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, rompeu o silêncio nesta terça-feira para sair em defesa do acordo de delação premiada firmado com executivos da JBS. Em artigo publicado no portal Uol, Janot afirmou que, ao saber da gravidade dos crimes que estavam sendo cometidos, não teve outra opção a não ser conceder os benefícios penais aos irmãos Joesley e Wesley Batista. Segundo ele, o país sairia muito mais prejudicado se não tomasse conhecimento do que estava acontecendo nas mais altas instâncias do poder.
“Embora os benefícios possam agora parecer excessivos, a alternativa teria sido muito mais lesiva aos interesses do país, pois jamais saberíamos dos crimes que continuariam a prejudicar os honrados cidadãos brasileiros”, escreveu Janot. “Finalmente, tivesse o acordo sido recusado, os colaboradores, no mundo real, continuariam circulando pelas ruas de Nova York, até que os crimes prescrevessem, sem pagar um tostão a ninguém e sem nada revelar, o que, aliás, era o usual no Brasil até pouco tempo”, acrescentou. A declaração foi uma resposta ao presidente Michel Temer, que no último sábado disse em pronunciamento que “o autor dos grampos estava livre, passeando pelas ruas de Nova York”. “Não passou nem um dia na cadeia, não foi preso, não foi julgado e não foi punido. E, pelo jeito, não será”, disse ele, na ocasião.
A colaboração dos irmãos Batista foi bastante criticada por ter garantido imunidade penal aos irmãos Batista. Em troca de revelar os esquemas, entregar provas e participar das chamadas “ações controladas”, os donos da JBS não serão processados pela série de crimes que confessaram, estão dispensados de usar tornozeleira eletrônica e liberados para morar no exterior. O acordo também aplicou uma multa de 250 milhões de reais aos dois irmãos — o faturamento da JBS em 2016 foi de 170 bilhões de reais.
No texto, Janot cita, sem dar nomes, as acusações contra Temer, os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff e o senador Aécio Neves (PSDB-MG) para justificar a relevância do acordo. “Até onde o país estaria disposto a ceder para investigar a razão pela qual o presidente da República recebe, às onze da noite, fora da agenda oficial, em sua residência, pessoa investigada por vários crimes, para com ela travar diálogo nada republicano”, questionou o procurador.
Em relação ao presidente, o PGR rebateu a estratégia da defesa do peemedebista de desqualificar a gravação da conversa considerada por ele “nada republicana” — uma perícia encomendada por Temer classificou, ontem, o áudio como “imprestável” e inválido para ser usado como prova. Para Janot, o conjunto das revelações “é muito maior que os áudios questionados” e o “foco do debate foi surpreendentemente deturpado” para as concessões da delação.
Sobre o senador Aécio Neves, o procurador foi mais incisivo, dizendo que o então candidato à Presidência em 2014 estava recebendo propina do esquema “que aparentava combater, enquanto criticava a corrupção dos adversários”. Ele também destacou a revelação de que Dilma e Lula tinham uma conta no exterior que era abastecida pela JBS.
Temer, Aécio, Dilma e Lula negaram todas as acusações, argumentando que elas foram inventadas por um investigado para conseguir fechar acordo de delação premiada com a PGR.
Por fim, Janot lembra que o acordo de leniência — que está sendo negociado pelo Ministério Público Federal na primeira instância — pode levar a JBS a pagar uma multa de 11 bilhões de reais e que a empresa ainda pode ser responsabilizada penalmente por operações suspeitas no câmbio — a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) apura se a companhia comprou mais de um 1 bilhão de dólares antes do vazamento sobre a delação.
“Sem jactância e apesar de opiniões contrárias, estou serenamente convicto de que tomei, nesse delicado caso, a decisão correta, motivado apenas pelo desejo de bem cumprir o dever e de servir fielmente ao país”, concluiu Janot.