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Grupo religioso é suspeito de usar fiéis em trabalho análogo ao escravo

Operação conjunta em chácara no DF resgata 95 pessoas, incluindo crianças, sem registro profissional, em abrigos precários e usando agrotóxico sem proteção

Por Thais Lazzeri
Atualizado em 7 mar 2019, 19h14 - Publicado em 7 mar 2019, 19h13

A história lembra a série documental Wild Wild Country produzida pela Netflix. Na tela, a trajetória do guru indiano Bhagwan Shree Rajneesh, conhecido como Osho, que reuniu centenas de milhares de pessoas em uma pequena cidade dos Estados Unidos para criar uma comunidade alternativa polêmica. No Brasil, a Igreja Adventista Remanescente de Laodiceia, liderada pela pastora Ana Vindoura Dias Luz, de 64 anos, reuniu centenas de brasileiros na chácara Folhas de Palmeiras, no núcleo rural Gama, em Ponte Alta, cidade satélite do Distrito Federal. Como na série televisiva, os discípulos trabalhavam em prol da comunidade religiosa. “Incansáveis obreiros, de dia e de noite, e até embaixo de chuva, levam a obra avante”, diz um dos vídeos do canal da seita no Youtube sobre a construção da igreja. Nos EUA, a história terminou em uma série de acusações, fraudes, prisão. Aqui, em resgate por suspeita de trabalho em condição análoga a de escravo.

A ação conjunta reuniu auditores fiscais do trabalho de Minas Gerais e do Distrito Federal do Ministério da Economia, policiais civis, integrantes do Ministério Público Federal e Ministério Público do Trabalho, além do conselho tutelar do Gama e a subsecretaria de políticas para crianças e adolescentes da Secretaria de Justiça e Cidadania do DF. No local, encontraram 95 pessoas, incluindo crianças. A maioria trabalhava em uma das três empresas da comunidade, todas com maquinário profissional: a de panificação, uma de produção de hortifruti e uma confecção. Nenhum dos trabalhadores era registrado.

Operação da Polícia Civil em Gama
Crianças em chácara que foi alvo de operação conjunta nesta quinta-feira em Gama, área rural do Distrito Federal (Cristiano Mariz/VEJA)

Homens e mulheres solteiros dividiam o mesmo alojamento com famílias e crianças. O abrigo precário de algumas era dentro de um ônibus ou na carroceria de caminhão, com bancos. Outro, separado por uma “parede de papelão” do local onde eram armazenados os agrotóxicos – o que contradiz os vídeos da seita no Youtube, onde os alimentos são descritos como naturais e livres de agrotóxicos.

Operação da Polícia Civil
Agente fiscaliza ônibus utilizado como alojamento em comunidade (//Divulgação)
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Nas plantações, encontraram trabalhadores aplicando agrotóxicos sem proteção – nem treinamento tinham recebido. Na confecção, fiações expostas e cadeiras quebradas, algo bem distante da produção “feita sob rígido conceito de excelência”, segundo versão divulgada em vídeo. Na panificadora, mais um ambiente de trabalho inseguro, com risco de incêndio. “Interditamos tudo”, afirma Rodrigo Ramos do Carmo, auditor fiscal do trabalho.

Em nota, o Ministério Público Federal afirmou que “as apurações revelaram que a líder da seita e alguns de seus obreiros, sob a justificativa de garantir a entrada dos fiéis no reino dos céus e a salvação de suas almas, vêm obrigando as vítimas a trabalharem sem receber qualquer pagamento. Os relatos dão conta de que os fiéis trabalham vendendo pães e livros na cidade.” O documento ressalta, ainda, que não se trata de uma ação de cunho religioso, mas trabalhista.

Os discípulos da comunidade brasileira viviam em uma realidade paralela, com regras rígidas. É proibido ver TV, ouvir rádio, comer produtos industrializados ou usar produtos com químicas, como xampu de cabelo.

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Operação da Polícia Civil
Carreta utilizada como alojamento de discípulos da comunidade religiosa (//Divulgação)

Não é a primeira vez que a polícia visita o que denominam de seita. No ano passado e em janeiro deste ano, duas mulheres, de 18 e 19 anos, respectivamente, foram resgatadas sob suspeita de cárcere privado. No primeiro resgate, a pastora Ana, acusada de cercear a liberdade da vítima, foi presa.

Defesa

A reportagem tentou contato com os responsáveis pela comunidade religiosa por meio de um número de telefone fixo e dois celulares divulgados em um vídeo institucional da comunidade – em um deles, uma pessoa, que não se identificou, afirmou que os representantes só falarão em juízo.

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