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Fraude à Lei Rouanet: danem-se as criancinhas

Quadrilha que fraudava a Lei Rouanet pagou o casamento de um membro com dinheiro destinado a apresentar “a magia do teatro” a crianças carentes

Por Juliana Linhares e Eduardo Gonçalves
3 jul 2016, 08h33

O argumento da “democratização do acesso à cultura” sempre foi um abre-te, sésamo para produtoras abocanharem verbas da Lei Rouanet. Mas a Logística Planejamento Cultural foi além. A justificativa que apresentou ao Ministério da Cultura para pedir a aprovação do projeto que levaria 11 000 estudantes de escolas públicas ao teatro é quase um poema: “A arte atravessa. Ela tem o poder de atravessar. Atravessar universos, histórias, limites, personagens, sentimentos, pessoas. Esse projeto quer mostrar a potência do teatro como elemento de propagação de cultura, despertando a percepção de crianças sobre esse elemento artístico. Queremos que elas atravessem todas as barreiras e entrem no mundo mágico do teatro”. Pois o dinheiro captado para apresentar “o mundo mágico do teatro” a crianças carentes acabou usado para pagar despesas de uma festa de casamento para 120 pessoas em Jurerê Internacional, a praia mais badalada de Florianópolis, conhecida como “a Ibiza brasileira”. Se algo atravessou limites nesse caso, foi o cinismo.

A Lei Rouanet, criada em 1991, autoriza grupos ou artistas que tenham projetos culturais aprovados pelo Ministério da Cultura a captar dinheiro com empresas, que, em troca, ganham o direito de deduzir do imposto de renda parte do valor do patrocínio. Segundo a Polícia Federal, a Logística era uma das onze empresas usadas pelo Grupo Bellini Cultural para desviar dinheiro destinado ao fomento da cultura para o bolso dos seus sócios, entre eles Felipe Vaz Amorim, o noivo de Jurerê, seu irmão, Bruno Vaz Amorim, e seu pai, Antonio Carlos Bellini Amorim, todos presos na semana passada. No casamento de Felipe, o cachê de 13  216 reais pago ao cantor sertanejo Leo Rodriguez, por exemplo, saiu do dinheiro captado pela Logística. Como confirma Lincoln Porto, advogado da empresa que assessora o cantor: “Eles pediram que constasse no corpo da nota fiscal que a despesa se referia ao projeto tal”. O projeto “tal” era o das criancinhas carentes que precisavam conhecer a magia do teatro e chamava-se Minha Cidade. Junto com ele, a Logística apresentou um segundo projeto ao MinC, batizado de Caminhos Sinfônicos (objetivo: organizar apresentações gratuitas de música clássica para mostrar que o gênero “não é um privilégio da elite”). Com a aprovação dos dois projetos, a Logística foi autorizada a captar 1,8 milhão de reais no mercado. A PF não sabe se esse valor foi integralmente usado para bancar as despesas do casamento.

Segundo os investigadores, em vinte anos a Bellini Cultural recebeu autorização para captar 180 milhões de reais por meio de justificativas fajutas encaminhadas ao Ministério da Cultura. A polícia já sabe que boa parte do dinheiro foi usada para contratar artistas conhecidos que se apresentavam a seletos grupos ou em festas de empresas. Por intermédio da Bellini, e cortesia da Lei Rouanet, um grupo atacadista de alimentos, por exemplo, bancou a apresentação da banda Jota Quest a 4 000 convidados, e um dos escritórios de advocacia mais renomados de São Paulo contou com show do comediante Fábio Porchat em sua festa de aniversário. Segundo o Ministério Público, há cinco anos o MinC foi informado das fraudes cometidas pela Bellini. Mesmo assim, seguiu aprovando os projetos do grupo. Quem fez vista grossa à farra e por que motivo são as perguntas a que o MP e a polícia pretendem responder em breve.

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