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Dez ex-ministros repudiam pedido de impeachment de Moraes

Manifesto encaminhado ao Senado defende a democracia e rejeita ataques ao STF; Bolsonaro diz que agiu 'dentro das quatro linhas da Constituição'

Por Sofia Cerqueira Atualizado em 21 ago 2021, 15h50 - Publicado em 21 ago 2021, 15h07
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  • Um dia após o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ter ingressado no Senado com o pedido de impeachment do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), dez ex-ministros da Justiça e da Defesa se uniram em um manifesto em repúdio à iniciativa, onde citam uma “crise institucional”, e pedem a defesa da democracia. O documento, encaminhado ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e assinado por ex-integrantes dos governos de FHC, Lula, Dilma e Temer, faz uma contundente defesa da rejeição do pedido de impeachment de Moraes. Além da destituição do cargo, Bolsonaro solicitou, na tarde desta sexta feira (20), o afastamento do ministro de qualquer função pública por oito anos.

    Em uma clara oposição aos ataques de Bolsonaro direcionado aos ministros do STF, o manifesto é assinado por Miguel Reale Junior, José Gregori, Aloysio Nunes Ferreira e José Carlos Dias (governo FHC); Celso Amorim, Jaques Wagner, José Eduardo Cardozo, Tarso Genro e Eugênio Aragão (governos Lula e Dilma); e Raul Jungmann (governo Temer). No texto, os ex-integrantes do governo federal dizem que há uma “crise institucional derivada da representação promovida pelo presidente da República” e destacam a “evidente atipicidade da conduta e da tentativa de se instrumentalizar” o Senado “para tumultuar o regime democrático”.

    Em São Paulo, Bolsonaro afirmou neste sábado que, ao entrar com o pedido de impeachment do minstro Alexandre de Moraes, agiu “dentro das quatro linhas da Constituição”.  E declarou: “Engraçado, quando eu entro com uma ação no Senado, fundado no artigo 52 da Constituição, o mundo cai na minha cabeça. Quando uma pessoa em um inquérito no fim do mundo me bota lá ninguém fala nada. Não é revanche. Cada um tem que saber o seu lugar, só vamos poder viver em paz e harmonia se cada um respeitar o próximo e saber que tem um limite, o limite é a nossa Constituição”, disse o presidente durante visita à cidade de Eldorado, no Vale do Ribeira, no interior de São Paulo. “Todos os incisos do artigo quinto da Constituição eu cumpri todos. Não tem um só ato meu fora dessas quatro linhas”.

    Além dos dez ex-ministros, também divulgaram hoje notas de repúdio ao pedido do presidente contra o ministro Alexandre de Moraes a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). Ainda na tarde deste sábado, 21, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) também divulgou uma nota expressando sua “preocupação com o pedido de impeachment apresentado contra o ministro Alexandre de Moraes, no pleno exercício de suas atribuições constitucionais”. E ressalta que o “Poder Judiciário tem como função preponderante a jurisdicional, diretamente vinculada ao fortalecimento da democracia e do Estado de Direito”.

    Vôo sobre o STF

    Em entrevista a VEJA, o ex-ministro Raul Jungmann afirmou que Bolsonaro exerce uma constante atuação de constrangimento para forçar as Forças Armadas a endossar os atos e as falas dele. Ele afirma ainda que o presidente perguntou se os jatos Gripen estavam operacionais e, com a resposta positiva, determinou que sobrevoassem o STF acima da velocidade do som para estourar os vidros do prédio.

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    A íntegra do manifesto dos dez ex-ministros da Justiça e da Defesa:

    MANIFESTO EM DEFESA DA DEMOCRACIA DIRIGIDO AO PRESIDENTE DO SENADO FEDERAL

    Os ex-ministros da Justiça e da Defesa, em virtude da crise institucional derivada da representação promovida pelo presidente da República, solicitando ao Senado Federal o afastamento por crime de responsabilidade de ministro do Supremo Tribunal Federal, vêm dirigir-se ao Presidente do Senado Federal nos seguintes termos:

    Presidente e ex-presidentes do Tribunal Superior Eleitoral manifestaram-se em nota assegurando a transparência e segurança das urnas eletrônicas instituídas há 25 anos e continuamente aperfeiçoadas para garantia da higidez do sistema eleitoral. Tal não bastou ao Senhor Presidente da República, que em “live” reconheceu não ter provas, mas assim mesmo lançou no espírito dos brasileiros dúvidas acerca da correção do sistema eletrônico de votação, requerendo a instalação de voto impresso que ofenderia o sigilo do voto.

    Em face das inverdades difundidas, o Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, acolheu representação de seu Corregedor-Geral, a fim de ser averiguada a ocorrência de infração decorrente da difusão de notícia falsa, cumprindo o Tribunal o dever de agir, sob pena de estar a prevaricar.

    Igualmente, inquérito foi instaurado para verificar se ocorrera indevida veiculação de documentação coberta por sigilo relativa à investigação referente à invasão do TSE por hacker em 2.018. Dados desse inquérito sigiloso foram divulgados pelo senhor presidente em entrevista conjunta com o deputado Felipe Barros, no intuito de tentar demonstrar a existência de fraudes nas eleições e ratificar suas declarações anteriores. Não poderia haver outra conduta diante do fato ocorrido, ou seja, de provável violação de sigilo, senão a obrigatória instalação de procedimento investigatório.

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    De outra parte, em defesa das instituições democráticas, em especial diante de ameaças ao funcionamento dos órgãos superiores da justiça, medidas foram determinadas por ministro do Supremo Tribunal Federal.

    Estabelecendo constante confronto como forma de ação política, agora o presidente da República elegeu por inimigo o Judiciário e individualizou o ataque na pessoa dos Ministros Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, entrando contra o primeiro de forma inusitada com pedido de impeachment junto ao Senado Federal, na forma do art. 52 da Constituição Federal e dos arts. 39 e seguintes da Lei n. 1.079/50.

    O presidente da República segue, dessa maneira, o roteiro de outros líderes autocratas ao redor do mundo que, alçados ao poder pelo voto, buscam incessantemente fragilizar as instituições do Estado Democrático de Direito, entre as quais o Poder Judiciário.

    Essa aventura política, que visa a perenizar uma crise institucional artificialmente criada, deve ser coartada em seu nascedouro, pois manifesta a absoluta inadequação típica da conduta dos ministros ao descrito nos incisos do art. 39 da Lei n. 1079/50 . Frise-se, ainda, que admissão desse procedimento contra ministro do Supremo Tribunal Federal, inseriria em nossa ordem jurídica verdadeiro crime de hermenêutica, coactando a ação de nosso sistema de Justiça .

    Eventual seguimento do processo surtirá efeitos nocivos à estabilidade democrática, de vez que indicará a prevalência de retaliação a membro de nossa Corte Suprema gerando imensa insegurança no espírito de nossa sociedade e negativa repercussão internacional da imagem do Brasil.

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    A inépcia da inicial justifica que seja rejeitada in limine, por decisão do presidente da Casa, pois destituído o pedido de justa causa em face da evidente inexistência do fato ilícito noticiado, mero capricho do mandatário do país a transformar o Senado Federal em instrumento de perseguição pessoal e de meio para tumultuar a nação.

    Do Supremo Tribunal Federal vem a lição de que:

    “A ausência de justa causa impede a válida e legítima instauração de procedimentos penais condenatórios, pois nada pode justificar o abuso de poder, a acusação arbitrária ou a injusta restrição da liberdade individual ..

    Em outra decisão, expõe-se:

    “Assim como se admite o trancamento de inquérito policial, por falta de justa causa, diante da ausência de elementos indiciários mínimos demonstrativos da autoria e materialidade, há que se admitir – desde o seu nascedouro – seja coarctada a instauração de procedimento investigativo, uma vez inexistentes base empírica idônea para tanto e indicação plausível do fato delituoso a ser apurado ”.

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    Da mesma forma como cabe o trancamento de inquérito policial, quando restar demonstrado, de plano, a ausência de justa causa para o seu prosseguimento devido à atipicidade da conduta atribuída ao investigado” , cabe suprimir-se, de imediato, o procedimento deste pedido de impeachment, sem a necessidade de qualquer exame valorativo do conjunto fático-probatório , por comissão especial constituída no Senado Federal.

    Assim, em face da evidente atipicidade da conduta e da tentativa de se instrumentalizar esta Casa do Legislativo, para tumultuar o regime democrático, é imperioso dar de plano fim a esta aventura jurídico-política, pois o contrário seria sujeitar o nosso Judiciário a responder a um processo preliminar no Senado Federal para atender simples capricho do presidente que vem costumeiramente afrontando as linhas demarcatórias da constituição.

    Destarte, em vista dos vários precedentes havidos no Senado Federal , especialmente na anterior legislatura, conclama-se ao indeferimento liminar, em vista de os fatos narrados não se subsumirem às hipóteses previstas no art. 39 da Lei n. 1079/50, e logo também, por falta de justa causa, “sem lastro probatório mínimo indicativo de materialidade da infração imputada ”.

    Dessa maneira, busca-se caminho que evite constrangimento indevido e conduza ao apaziguamento dos ânimos e à reafirmação do respeito e da confiança no Poder Judiciário e no Estado de Direito.

    Com a convicção de que V. Exa. honrará a tradição democrática desta Casa e prestigiará a preservação da democracia arduamente conquistada após duas décadas de ditadura, encaminhamos este manifesto para que sirva como demonstração de nossa preocupação com o instante que vivemos no Brasil.

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    Miguel Reale Jr.

    José Eduardo Martins Cardoso

    Jose Gregori

    José Carlos Dias

    Aloysio Nunes Ferreira

    Tarso Genro

    Celso Amorim

    Eugenio Aragão

    Jacques Wagner

    Raul Jungmann

     

     

     

     

     

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