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Copacabana Palace, 100 anos: palco da história — e de escândalos e fofocas

O icônico hotel no Rio coleciona uma galeria de hóspedes famosos e poderosos que escreveram ali capítulos de sua biografia

Por Sofia Cerqueira 13 ago 2023, 08h00

Admirador dos costumes europeus, Epitácio Pessoa (1865-1942) bateu à porta do palacete da família Guinle, uma das mais poderosas à época, com uma ideia que cultivava solitariamente: o então presidente sonhava fincar na orla de Copacabana, no Rio de Janeiro, um majestoso hotel, daqueles de dar inveja aos opulentos exemplares da Côte d’Azur francesa, como o Negresco, de Nice, e o Carlton, em Cannes. Soava loucura. No início do século XX, o acesso de carro à Avenida Atlântica, um vasto areal salpicado de casas de veraneio, era recente. Aceito o desafio, a nova construção teria uma nobre missão logo de saída — abrigar parte dos convidados que viriam ao Brasil para as celebrações do centenário da Independência, em 1922.

O prédio começou a tomar corpo, mas, com o atraso na importação de toneladas de mármore de Carrara e cristais da Boêmia, o Copacabana Palace só abriria as portas um ano mais tarde. Nada que tenha roubado o esplendor do hotel, que no domingo 13 completa um século, período em que se desenrolaram em seus luxuosos salões memoráveis episódios protagonizados por reis, rainhas, chefes de Estado e estrelas do mundo pop. “Nas últimas décadas, a história brasileira, seja na área econômica, social ou política, passou por aqui”, diz o geren­te-geral, o português Ulisses Marreiros.

PODER NOS SALÕES - Getúlio celebra sua posse com jantar de gala, em 1951: tempos áureos do Copa
PODER NOS SALÕES - Getúlio celebra sua posse com jantar de gala, em 1951: tempos áureos do Copa (//Divulgação)

Integrado ao portfólio do grupo francês LVMH, holding dona da Louis Vuitton, que, em 2018, arrematou a rede hoteleira Belmond numa transação de 3,2 bilhões de dólares, o Copa, como é carinhosamente conhecido, já foi palco de pedidos excêntricos, chiliques homéricos, fofocas de alcova e escândalos abissais, vários deles, aliás. Um ocorreu cinco anos depois da inauguração, quando o então presidente da República, Washington Luís (1869-1957), foi baleado em uma das ilustres suítes por sua amante, uma jovem marquesa italiana. Imediatamente, circulou a versão oficial de que o governante havia sofrido uma crise de apendicite, mentira que durou pouco. “Foi o caso mais famoso de traição por lá, mas sabe-se que o prédio anexo, com um acesso pela rua lateral, era fartamente usado por políticos para encontros secretos”, diz o historiador Milton Teixeira.

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FLAGRA NA MADRUGADA - Diana na emblemática piscina: ela bem que tentou despistar os paparazzi
FLAGRA NA MADRUGADA - Diana na emblemática piscina: ela bem que tentou despistar os paparazzi (Chico Calmon/Agência O Globo/.)

Diversas costuras na arena do poder foram tecidas naquelas faustosas dependências, nas quais o recém-eleito Getúlio Vargas recebeu a elite nacional para um jantar de gala, em 1951. Foi ali também que, quatro anos depois, um grupo ligado a Juscelino Kubitschek redigiu a proposta de impeachment que destituiu o então chefe do Executivo, Carlos Luz, acusado de encabeçar uma conspiração contra a posse do novo mandatário. Hóspedes estelares de todo canto também marcaram presença ali, cada qual deixando de herança ao menos uma foto, por trás da qual, em geral, reside um enredo instigante.

Em 1991, a princesa Diana desembarcou no elegante hall acompanhada do hoje rei Charles III. Para tentar escapar da sanha dos paparazzi, resolveu nadar na piscina de madrugada. Não funcionou. Suas fotos de maiô acabaram rodando o mundo. Quatro décadas antes, aquelas mesmas águas serviram de anteparo para um ataque de ira do diretor Orson Welles, que passou uma esticada temporada no Copa. Na ocasião, Welles lançou sua máquina de escrever na piscina depois de acalorada discussão com a namorada. Em passagem mais amena, Walt Disney veraneava por lá quando concebeu o personagem brasileiro que tanto buscava, o Zé Carioca.

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BARRACO NA SUÍTE - Orson Welles: máquina de escrever lançada pela janela após briga
BARRACO NA SUÍTE – Orson Welles: máquina de escrever lançada pela janela após briga (//Divulgação)

Com um terreno de 12 000 metros quadrados, dois prédios e 239 apartamentos — cujas diárias oscilam entre 2 200 e 25 000 reais, preço de uma das sete suítes do 6º andar, que já alojaram Madonna, Nelson Mandela e os Rolling Stones —, o hotel passou por mudanças em série. Se agora dispõe de spa, quadra de tênis e três restaurantes, dois agraciados com estrelas Michelin, nos anos 1940, 1950 havia ali atrações como um cassino, quando era permitido, e a casa de shows Golden Room, onde brilharam grandes nomes de Hollywood, como Ava Gardner e Rita Hayworth — convertido em salão de eventos. “O Copa ajudou a internacionalizar o Rio e se tornou cartão-postal da cidade”, diz Andrea Natal, ex-diretora do Copa, atualmente no Fasano de Nova York.

Em sua longeva trajetória, o hotel sofreu seus baques, como a transferência da capital do Rio para Brasília, em 1960, deixando um melancólico vazio. Em 1968, a morte de Octávio Guinle, o fundador que conhecia cada detalhe e cada cantinho do negócio, abriu espaço para uma fase de menos glamour. O período culminou na ideia da família de plantar na bela área à beira-mar duas torres de edifício, o que ameaçava até pôr abaixo a estrutura de arquitetura eclética tão apreciada por turistas e locais, dando fim ao Copa. Foi a deixa para o tombamento do hotel, em 1989, que passou às mãos do grupo Belmond (ex-Orient Express), depois às dos franceses da LVMH. Em 100 anos, o Copacabana Palace só ficou fora de atividade por 132 dias, na pandemia, quando um único hóspede, o cantor Jorge Ben Jor, permaneceu na suíte onde reside. Com a fachada toda retocada, o hotel segue colecionando casos que, em seu conjunto, falam muito de um país tropical.

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Publicado em VEJA de 11 de agosto de 2023, edição nº 2854

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