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Como a Fazenda tenta evitar que regulamentação de bets vire guerra fiscal

A pasta prepara a edição de ao menos doze portarias para reforçar que, por enquanto, as bets não podem ser alvo de sanções por gestores estaduais

Por Adriana Ferraz Atualizado em 4 jun 2024, 09h30 - Publicado em 12 fev 2024, 08h00
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  • Foi no apagar das luzes, como costumavam dizer os antigos locutores esportivos de rádio. No final de 2023, a Câmara finalmente aprovou a regulamentação do mercado de apostas esportivas on-line, as chamadas bets, cuja lei foi sancionada na sequência pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva. O Ministério da Fazenda, de Fernando Haddad, teve papel essencial no jogo, criando regras para melhorar a segurança do negócio, tanto para empresas quanto para apostadores, e abrindo espaço à tributação do setor, que pode render até 15 bilhões de reais em impostos e outorgas em 2024, segundo as estimativas. Parecia tudo certo até que alguns estados entraram em campo de forma apressada, dispostos a disputar com a União uma fatia dessa bolada. Técnicos da pasta de Haddad já apitaram a ilegalidade e se preparam para brecar esse tipo de jogada.

    COBRANÇA - Cláudio Castro: exigência de outorga de 5 milhões de reais
    COBRANÇA - Cláudio Castro: exigência de outorga de 5 milhões de reais (Carlos Magno/Governo do RJ/.)

    Enquanto todos aguardavam novos lances do Ministério da Fazenda, que estipulou um período de transição de seis meses para poder definir detalhes do regramento, o governo federal e as empresas foram pegas de surpresa por iniciativas dos governadores Ratinho Júnior (PSD), do Paraná, e Cláudio Castro (PL), do Rio. Eles começaram a enviar notificações às empresas exigindo o pagamento de uma outorga de 5 milhões de reais para que possam vender suas apostas nesses estados. Os avisos vieram acompanhados de ameaças de veto a operações e até mesmo a ações de marketing. A investida provocou uma correia de tensão que chegou até os clubes de futebol, hoje muito dependentes do patrocínio das companhias de apostas. O receio dentro do mercado é que as ações estaduais provoquem uma indesejada instabilidade jurídica, justamente no momento em que, após cinco anos de espera (a lei que liberou a loteria das bets é de 2018), a União assumiu sua responsabilidade de juiz e passou a apitar as regras da partida.

    REAÇÃO - Fernando Haddad: publicação de novas portarias para clarear regras
    REAÇÃO - Fernando Haddad: publicação de novas portarias para clarear regras (Cristiano Mariz/Agência O Globo/.)

    Os governos do Paraná e do Rio se escoram numa brecha para tentar lucrar com o negócio das bets — no caso, uma decisão de 2020 do Supremo Tribunal Federal que acabou com o monopólio da União sobre a exploração das loterias. “Só fomos mais céleres que a União”, afirma Daniel Romanowski, diretor-presidente da lotérica paranaense, a Lottopar. Além de Rio e Paraná, o governo da Paraíba já abriu credenciamento e o de Minas criou sua própria bet. Entre os atrativos oferecidos pelos estados está o valor da licença, já que a taxa nacional pode custar seis vezes mais, chegando a 30 milhões de reais. O avanço no negócio tem potencial não apenas para provocar uma confusão jurídica, mas uma guerra fiscal. Para o presidente da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL), Wesley Cardia, compete à Fazenda regrar rapidamente o mercado e assim impedir situações, segundo ele, ilegais. “Como um estado pode legislar sobre publicidade, por exemplo? E como operadores licenciados no Rio podem vender para o país inteiro? Se essa regra valer, não haverá motivos para se cadastrar nacionalmente”, critica. Advogados de bets alertam ainda para o risco de outros estados entrarem na disputa com valores ainda menores de outorga e de alíquotas de imposto de renda sobre o Gross Gaming Revenue (GGR), que é a diferença entre o valor arrecadado com as apostas e o pago em prêmios. A União prevê taxas de 12% — o Rio cobra 5%, e o Paraná, 6%.

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    A discussão está quente no Ministério da Fazenda, que promete agir. Segundo apurou a reportagem de VEJA, a pasta prepara a edição de ao menos doze portarias para reforçar que a regulamentação está em curso e que, por hora, as bets não podem ser alvo de sanções por gestores estaduais. Até o fim desse período, a equipe de Haddad promete entregar a regulamentação completa, incluindo as normas para emissão de outorgas estaduais de forma que não canibalizem as federais. Além disso, há a preocupação de criar um sistema de fiscalização capaz de barrar tentativas de fraudes fiscais, como a de uma bet com licença local permitir apostas de jogos no restante do país. No Rio, por exemplo, o sistema da Loterj exige apenas uma declaração do apostador sobre o seu endereço.

    selo Bets

    Depois de anos operando em uma zona cinzenta, as bets e a sociedade brasileira esperam de forma urgente, mas sem atropelos, uma definição clara e definitiva sobre o que irá valer. O número de empresas que responderam ao chamado de interesse da Fazenda (134) mostra que o mercado não quer mais ficar fora do campo legal. De acordo com a Fazenda, as loterias estaduais podem atuar no mesmo campeonato, mas os limites ainda serão definidos. Por isso, os que avançaram no jogo antes de a bola rolar com as novas regras estipuladas correm o risco de ficar impedidos.

    Publicado em VEJA de 9 de fevereiro de 2024, edição nº 2879

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