A Terra vive evidente desequilíbrio climático “e não temos nem plano B nem planeta B”, como pontuou o então secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, em 2015, em frase inteligente e ferina. Na semana passada, aliás, o português António Guterres, o atual líder da organização diplomática, emitiu um alerta de “catástrofe” devido à elevação acelerada das águas do Oceano Pacífico, com possíveis repercussões em todo o mundo, em futuro breve. O aquecimento global é outro capítulo de preocupação inescapável — e parece improvável que a civilização consiga respeitar o Acordo de Paris, estabelecido em 2015 por 196 países signatários, segundo o qual se deve manter o aumento médio das temperaturas no máximo em até 2 graus acima dos níveis pré-industriais e, de preferência, limitá-lo a 1,5 grau. A situação, de fato, preocupa e não há outra saída a não ser o zelo pelo meio ambiente.
Lamentavelmente, os sinais de danos despontam com incômoda frequência. Por aqui, o país está em chamas. Nos seis primeiros meses de 2024, os biomas brasileiros registraram um número inédito de queimadas. O Pantanal e o Cerrado totalizaram a maior quantidade de focos de incêndio para o período, desde o início das medições, em 1988. No Pantanal, de 1º de janeiro a 23 de junho, foram detectados 3 262 episódios, mais de 22 vezes em relação ao mesmo período de 2023. No primeiro semestre deste ano, quase todos os biomas brasileiros tiveram um aumento de queimadas em comparação a 2023, exceto o Pampa, afetado por chuvas responsáveis pelas enchentes no Rio Grande do Sul. Trata-se de um cenário assustador e, de recorde em recorde, como mostra reportagem da edição, podemos chegar ao ponto de não retorno. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, nome de relevo internacional no tema, não descarta nem mesmo ações criminosas nos recentes focos (e investigações policiais atuam para entender o que houve).
A bandidagem é inaceitável, e precisa ser condenada. Não se pode ser negligente, também, com todo tipo de planejamento e vigilância, que se pressupõe permanente. Durante o governo de Jair Bolsonaro e de um ministro que sugeriu “passar a boiada” para eliminar restrições ambientais, o país transformou-se de modelo a ser seguido em vilão. Com a presidência de Lula, e especialmente com o empenho de Marina, os humores e as prioridades mudaram. Contudo, vale ressaltar, em ritmo demasiadamente lento. Não por acaso, o ministro Flávio Dino, do STF, determinou que a União mobilize, em no máximo quinze dias, o maior número de agentes das Forças Armadas, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Força Nacional para combater os incêndios no Pantanal e na Amazônia. São lições que precisam ser imediatamente assimiladas. O Brasil necessita correr e estar atento para não passar vergonha na COP30, a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, prevista para ocorrer em novembro de 2025, em Belém, no Pará. Seria constrangedor assistir a uma tragédia ambiental durante um evento dessa magnitude. O desafio é imenso.
Publicado em VEJA de 30 de agosto de 2024, edição nº 2908