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A violência silencia outra voz

Desta vez, a vítima foi um PM — profissional exemplar

Por Maria Laura Canineu
Atualizado em 11 jan 2019, 07h00 - Publicado em 11 jan 2019, 07h00

O policial militar João Maria Figueiredo, do Rio Grande do Norte, tinha apenas 34 anos quando o conheci, no fim de 2016, em um encontro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Na época, eu e um colega coletávamos depoimentos de policiais que, como João, tinham sofrido punição desproporcional por expressar opiniões divergentes das de seus superiores. Com seu sotaque melódico nordestino e voz imponente, João fazia uma defesa apaixonada e convincente dos direitos dos policiais. Entendia a importância de uma polícia eficiente para proteger a sociedade da criminalidade e criticava práticas abusivas de alguns policiais que prejudicavam a eficácia da instituição como um todo. João contribuiu imensamente para a nossa pesquisa.

Infelizmente, às vésperas do Natal, o jovem e ativo policial foi assassinado. Dois homens não identificados atiraram em João enquanto ele passava de moto nos arredores de Natal. Ferido no ombro, João tentou fugir, mas os assassinos continuaram a atirar até ele sucumbir.

A notícia me deixou profundamente triste, mas não me espantou. João era um policial franco e direto. Amigos disseram que ele estava recebendo ameaças. Não poderia haver pior momento para perder uma voz tão poderosa como a dele. A opção generalizada por uma política de segurança baseada no confronto tem intensificado a matança de civis e de policiais. E, em vez de denunciar o excesso de força por parte de policiais, o novo governo defende uma estratégia de segurança mais militarizada e brutal.

João era um dos líderes no Rio Grande do Norte do movimento Policiais Antifascismo, que prega uma polícia mais próxima da população. Melhorar a segurança é essencial em um país que teve 64 000 homicídios e onde policiais mataram 5 144 pessoas em um ano, 20% mais que no ano anterior.

Os assassinos de João podem ter cumprido as ameaças que fizeram contra ele. Investigadores disseram à imprensa que os criminosos não levaram dinheiro nem a moto de João. Acreditam que ele foi executado. João virou parte de uma triste estatística: um policial é morto a cada dia no Brasil. É o outro lado da horrível tendência de uma alta taxa de mortes causadas pela polícia.

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Ao defender uma força policial próxima e cooperativa à comunidade, João provavelmente sabia da relação entre o elevado número de mortes de civis e de policiais. Quando a polícia age como um exército em guerra, combatendo o inimigo nas comunidades que deveria proteger, a possibilidade de que os moradores cooperem com a polícia é menor. Criminosos, quando encurralados, são menos propensos a se render pacificamente se creem que serão executados pela polícia.

O novo governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, defende a ideia de que a polícia “abata” qualquer pessoa que carregue um fuzil, sem aviso, mesmo que ela não esteja ameaçando ninguém. Os padrões internacionais de direitos humanos só permitem que os policiais matem alguém deliberadamente quando necessário para proteger a própria vida ou a de terceiros. João costumava repetir: é preciso fazer muito mais para proteger os direitos e a vida dos policiais, e garantir que eles protejam adequadamente as comunidades a que servem.

Publicado em VEJA de 16 de janeiro de 2019, edição nº 2617

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