Os grupos bolsonaristas têm como uma das principais bandeiras a antiglobalização, mas na hora de protestar são os primeiros a trazer elementos do exterior para cá. Nessa linha, a expressão “vamos ucranizar o Brasil” virou nova moda entre a turma. O negócio não ficou só nas palavras de ordem. Uma versão antiga de um pendão de guerra do país do Leste Europeu, nas cores preta e vermelha e com um tridente no centro, passou a ser envergada nessas ocasiões e teria sido o estopim para a confusão ocorrida no último domingo, 31. Opositores ao governo começaram a discutir com Alex Silva, que carregava o símbolo. Brasileiro que mora em Kiev desde 2014, ele é instrutor de segurança de uma empresa que oferece treinamento militar a grupos privados e públicos em diversas partes do mundo, da África ao Oriente Médio. Nas redes sociais, repletas de fotos em cenas de guerra, Alex diz trabalhar com o pessoal de “Forças Especiais”. A amigos, Alex disse que levou a bandeira à Paulista em homenagem a sua mulher, que é ucraniana. Desde março ele está no Brasil e só não voltou ainda para o Leste Europeu por causa das restrições de voo impostas pela pandemia da Covid-19.
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Clique e AssineComo esse símbolo nacional de uma ex-república soviética virou objeto de adoração entre os bolsonaristas? A inspiração veio do partido Pravyi Sektor, um grupo de extrema direita da Ucrânia que o governo russo rotulou de neonazista. Isso porque o herói deles é o líder nacionalista Stepan Bandera. Nos anos 40, ele se uniu à Alemanha Nazista para tentar libertar a Ucrânia do domínio soviético. “A bandeira é um símbolo neutro e histórico que foi ressignificado e incorporado por um grupo radical de direita”, explica o historiador da USP Angelo Segrillo, autor dos livros Os Russos e O Declínio da União Soviética. Depois da confusão na Paulista, a embaixada ucraniana no Brasil se pronunciou lembrando que o pendão preto e vermelho é um símbolo histórico do século XVI que remete à luta contra os invasores estrangeiros — e não tem nada a ver com o nazifascismo. Faltou apenas avisar os manifestantes.
Publicado em VEJA de 10 de junho de 2020, edição nº 2690