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Rio: a dupla tragédia na vida de um lutador

Uidson Ferreira, que dá aulas de luta em projetos sociais, perdeu um aluno baleado na Formiga e a irmã caçula atingida por tiros na Pavuna

Por Leslie Leitão Atualizado em 31 mar 2017, 15h52 - Publicado em 31 mar 2017, 15h31
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  • O professor de lutas Uidson Alves Ferreira, de 32 anos, estava abalado com a morte de um aluno que parou a Tijuca na quarta-feira. O estoquista e mototaxista Luís Fernando Malaquias, de 25 anos, foi atingido por vários tiros quando policiais da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) subiam o Morro da Formiga. Vinte e quatro horas mais tarde, o pesadelo de Uidson aumentou. Seu telefone tocou com a notícia de que sua irmã caçula havia sido baleada. “Cheguei na escola e vi aquela cena, ela já morta. Arrancaram um pedaço da minha família”, desabafa o professor.

    Maria Eduarda Alves da Conceição, de 13 anos, foi atingida por pelo menos dois tiros  dentro da Escola Municipal Daniel Piza, na Pavuna. O confronto entre traficantes e policiais resultou na prisão de um cabo e um sargento que foram filmados atirando contra dois suspeitos deitados. “Em um estado falido como nosso, o despreparo da polícia é o reflexo de tudo o que estamos vendo. Como falar em bala perdida se minha irmã está cheia de perfurações? Como falar em bala perdida se meu aluno levou tiro na perna, no peito?”, questiona Uidson.

    Nascido e criado em Barros Filho, na Zona Norte do Rio de Janeiro, o professor de artes marciais teve uma infância problemática. Não concluiu o ensino médio e, aos 12 anos, viu o padrasto mergulhar no tráfico. Com aquele péssimo exemplo dentro de casa, Uidson foi pelo mesmo caminho. Chegou ao posto de segurança do tráfico, mas acabou preso por assaltos que ele jura não ter cometido. Foram seis anos na cadeia. Quando saiu, mudou de vida. Passou a ser uma referência para os primos mais novos, que viram seu fracasso e, agora, o enxergavam como trabalhador.

    Maria Eduarda na quadra onde foi atingida minutos antes de ser morta
    Maria Eduarda na quadra onde foi atingida minutos antes de ser morta (Reprodução/VEJA)

    O professor montou um projeto social para dar aulas de boxe no Morro do Borel, na Tijuca, e de Muai Thai na sede da ONG Novo Horizonte, na Formiga. Ali, dois anos atrás, conheceu Luís Fernando. “Era um garoto batalhador, que gostava de treinar, tranquilo e prestativo. Às vezes eu estava atrasado para ir de uma aula para outra e ele me levava de moto”, lembra ele, que também trabalha como barbeiro e, em fevereiro do ano passado, ganhou 30 000 reais no desafio ‘Agora ou Nunca’, do programa Caldeirão do Huck, da Rede Globo.

    O esporte como válvula de escape para fugir do mundo do crime era também a referência da irmã caçula. Maria Eduarda sonhava ser jogadora de basquete. Ganhou bolsa pra estudar num colégio particular e integrar a equipe sub-13. Mas a condução diária para a Barra da Tijuca inviabilizou a proposta: “Nossa família não tinha dinheiro para bancar isso. Somos pobres”, diz o professor, exibindo orgulhoso a coleção de medalhas da irmãzinha caçula.

    Mãe de adolescente desabafa

    Mãe de Uidson e Maria Eduarda, Rosilene Alves Ferreira, de 52 anos, não conseguia conter as lágrimas no IML, enquanto esperava a liberação do corpo da filha. Desempregada, fazia o que chama de biscate para colocar comida dentro de casa quando recebeu a pior ligação de sua vida. “Fui para o Hospital Albert Schweitzer acompanhar uma criança de 2 anos que está internada lá. A mãe precisava ir em casa resolver problemas dos outros filhos, e fui para ganhar um dinheirinho. Até que a colega dela me ligou com o celular que ela tinha acabado de ganhar me falou: ‘Dona Rose, vem aqui na escola  que a Maria Eduarda morreu”. Era o início de uma dor que não vai passar para mais uma mãe no faroeste carioca.

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