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“The Marvelous Mrs. Maisel”: ria, seu mundo caiu

Conhece a piada da dona de casa que foi fazer comédia stand-up? Pois a nova série da criadora de Gilmore Girls arrasa com ela

Por Isabela Boscov
19 jan 2018, 20h51

Até o dia do Globo de Ouro, no qual The Marvelous Mrs. Maisel saiu com o prêmio de série cômica e de melhor atriz para Rachel Brosnahan, eu nunca tinha ouvido falar desta novidade criada por Amy Sherman-Palladino, de Gilmore Girls, para a Amazon. Fui dar uma conferida, só por curiosidade, até porque Gilmore Girls nunca me pegou de fato – e caí de amores imediatamente pela protagonista Midge Maisel, uma perfeita dona de casa dos anos 50 que é vista, na cena de abertura, fazendo um número de stand-up na própria festa de casamento. Em 1958, ano em que a série começa, a borbulhante, efervescente e esfuziante Midge tem 26 anos, está casada há menos de cinco com Joel Maisel, tem uma menino de 3 e uma menina de menos de 1 ano, leva um dia a dia confortável no seu baita apartamento no Upper West Side, no mesmo edifício em que moram seus pais. Várias noites por semana, ela se diverte acompanhando o marido ao Gaslight, um clube de comédia no Village nova-iorquino onde ele se apresenta com a ambição – que ela desconhece – de largar tudo para virar comediante profissional. Midge é tão alfa e organizada que anota, num caderno, quantas risadas cada piada do marido provocou, para refinar o número dele.

The Marvelous Mrs. Maisel
(Amazon Video/Divulgação)

No momento, ela está felicíssima: depois de ter ofendido o rabino na recepção de casamento, finalmente, depois de todo esse tempo, conseguiu que ele vá passar o Yom Kippur, o Dia do Perdão judaico, na casa dela. Na noite anterior, porém, Joel (Michael Zegen) bomba no Gaslight e sai humilhado. E, chegando em casa, faz a mala e larga Midge. Os pais dela, interpretados pelo ótimo Tony Shalhoub e pela extraordinária Marin Hinkle (que era a ex-mulher neurótica de Alan Harper em Two and a Half Men), se descabelam; filha separada? Que horror! Mandam que ela ponha a melhor roupa e saia correndo para tentar reconquistar o marido (que já se ajeitou com a secretária dele, uma mocinha com QI de ostra). Midge sai, sim. Mas de camisola, bêbada, direto para o Gaslight, onde sobe ao palco sem nem saber o que está fazendo, e estraçalha, num número escandalosamente autobiográfico. Nasce uma estrela – mas não Midge, que ainda tem muito chão pela frente, e sim Rachel Brosnahan, cujo timing cômico quase sobrenatural é a usina por trás de The Marvelous Mrs. Maisel.

The Marvelous Mrs. Maisel
(Amazon Video/Divulgação)

Rachel Brosnahan tem 27 anos e provavelmente é sua velha conhecida, no papel da infeliz Rachel Posner de House of Cards, a garota de programa que é mantida prisioneira e depois assassinada por Doug Stamper. Rachel Brosnahan entrou em House of Cards para fazer um total de cinco linhas de diálogo em dois episódios. Virou personagem regular porque era um estouro, e porque o maravilhoso Michael Kelly, que faz Doug Stamper, fez questão de que os produtores notassem que ela era um estouro. Rachel fez muitos papéis como a namorada/mulher graciosa que a certa altura cai das nuvens da sua inocência, em outras séries (por exemplo, Manhattan) e filmes (Dia do Atentado). Mas nunca foi comediante. Nunca, aliás, tinha sido de contar piada, nem em rodinha de amigos. E, embora se revele um talento nato do humor judeu – aquele que ri da própria desgraça – em The Marvelous Mrs. Maisel, é meio descendente de ingleses, meio de irlandeses (que têm sua própria tradição, embora muito diferente da judaica, de rir da desgraça). Numa matéria que li no New York Times, Amy Sherman-Palladino e seu marido, co-produtor e co-diretor Daniel Palladino, dizem que ela entrou no teste feito um furacão, matou a pau e não deixou para ninguém. Que é exatamente o que ela faz na série, inúmeras vezes por episódio.

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The Marvelous Mrs. Maisel
(Amazon Video/Divulgação)

O piloto demora um bocadinho para engrenar, mas nem em pense em desistir. Midge termina aquele seu improviso alcoólico no Gaslight sendo presa (por falar montes de baixarias e fazer meio strip-tease). Faz amizade com Lenny Bruce (Luke Kirby) – o grande revolucionário do stand-up – e cai nas graças de Susie (a sensacional Alex Borstein), a gerente do Gaslight, que decide atrelar seu destino ao de Midge e fazer dela uma estrela, para saírem ambas do fim de linha em que a vida delas foi parar. O genial da série, no entanto, é que a comédia rápida, ferina, incisiva e coreografada nas falas breves e fechadas do stand-up não acontece só quando Midge está no palco; acontece o tempo todo, em todos os diálogos. A casa dos Maisel poderia ser ela própria um clube de comédia, tal a quantidade de one-liners que rola ali – e Rachel Brosnahan e Marin Hinkle, juntas, são especialmente irresistíveis.

(Amazon Video/Divulgação/Divulgação/Divulgação)

Amy Sherman-Palladino é filha de um comediante de stand-up da velha guarda; Lenny Bruce era amigo da família e frequentava sua casa. Amy conhece bem as exigência duríssimas do stand-up – que, feito da maneira como comediantes pioneiras como a indomitável Joan Rivers e Anne Meara (mãe de Ben Stiller) o faziam, usando as próprias humilhações e defeitos sem reservas, é o tipo de comédia que mais expõe e vulnerabiliza a/o comediante. Midge, assim como essas pioneiras, não é uma feminista da forma como se entende hoje o termo; durante toda a primeira temporada, ela esconde suas pretensões de todos – amigos, família, marido –, e esconde principalmente seu sucesso ocasional. Porque não cairia bem a uma mulher do seu círculo, porque o stand-up é (ainda hoje) um dos meios mais chauvinistas que existem, e porque ela própria ainda não entendeu que – perdão pelo trocadilho – pode, sim, ser levada a sério. Ela está com raiva, está perplexa, e achou um lugar para ventilar esses sentimentos e para, que surpresa agradável, ser apreciada pela inteligência e pela verve. Sua intenção não é, pelo menos até aqui, competir ou se impor. É ser, simplesmente. E como ela é.

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