O fim do pornô no Tumblr mostra quem controla a internet
A web, no passado anárquica, hoje é dominada por pouquíssimas empresas e pessoas, que definem o que vemos. Choram os conservadores, fãs de pornografia
“The internet is realy, realy great… FOR PORN” (A internet é realmente, realmente grandiosa… para pornô).
A frase faz parte de uma das cenas mais hilárias e engraçadas do aclamado musical da Broadway “Avenida Q”. E ela constata uma verdade absoluta. O que é mais popular na rede, desde seu início? O pornô.
E não adianta vir com moralismo e caretice. Dados do site Pornhub, o maior do gênero e uma das páginas mais acessadas da web (atrás apenas de colossos como o Google e o Facebook), indicam – não para minha surpresa – que os que mais acessam pornô online são… conservadores, os “de direita” (ao menos pela maneira tosca como se passou a dividir “direita” e “esquerda” no Brasil).
Por exemplo, a população de estados estadunidenses conservadores, como os nos quais Donald Trump ganhou de lavada, são também campeões em tempo e dinheiro gasto com pornografia na internet. Um estudo publicado em 2014 no periódico científico “Archives of Sexual Behavior” ainda apontou que religiosos e conservadores são os maiores consumidores desse tipo de entretenimento.
É, no mínimo, engraçado notar como são esses mesmos grupos conservadores que, por meio de suas organizações de tom “família, tradição e propriedade”, agora reclamam dos conteúdos que eles (que são o principal público dos mesmos, repito) têm como impróprio. O atual caso do Tumblr, aquele site de blogs, serve de exemplo.
Sim, o Tumblr passou por maus bocados envolvendo criminosos, pedófilos, que usaram de recursos do site. Algo que já ocorreu com Google, Facebook, Twitter etc. Porém, assim como as outras empresas citadas, a reação havia sido, inicialmente, a apropriada. Deleta-se o conteúdo criminoso e os dados coletados são utilizados para chegar aos bandidos e prendê-los.
Contudo, a história escalou de forma descontrolada. Logo o Tumblr passou a ser condenado também por permitir que strippers, garotas de programa, michês, atrizes e atores pornô usassem o site. Assim como começou a ser julgado por servir de espaço para discussões acerca da sexualidade humana. De quem mais vinham as reclamações? Justamente daqueles que apresentam o perfil da maioria dos consumidores dessa diversão, digamos, pelada: os religiosos, conservadores, de estados que elegeram o Trump.
O Tumblr tentou resistir. Porém, logo marcas gigantes, em especial a Apple, passaram a pressioná-lo. Por cometer um pecado sagrado no ambiente online – exibir mamilos de mulheres ou exemplares de pênis –, a marca da maçã – fundada por um hippie da geração libertária do LSD, fã de Grateful Dead, e que deve estar se revirando no túmulo – tirou o aplicativo do Tumblr da loja de iPhones e iPads.
Como hoje a maioria das pessoas basicamente navega pelo mundo virtual por meio de Facebook, Google e apps, a manobra veio como um golpe quase fatal. Por isso, o Tumblr se viu obrigado a deletar qualquer tipo de site de teor minimamente sexual. Com isso, os blogs que hospeda começam a ficar cada vez mais parecidos com agregadores de textões de redes sociais.
O que se comprova com tudo isso é que, no fim, a internet está cada vez mais limitada. Limitadíssima. E não pelo combate a crimes, o que na prática não ocorre (os pedófilos que deveriam ter sido flagrados, presos e punidos nem apareceram e ninguém mais se queixou disso). Mas, sim, pela imposição da caretice do público que, às escuras, é consumidor das coisas menos caretas (por vezes, criminosas) da web.
Como essa audiência também é cliente de Apple, Google, Facebook, Amazon e afins, a hipocrisia passa adianta. O que ocorre? No fim, são essas poucas companhias – para muitos, o resumo do que é a internet hoje (pois só isso esses acessam) – que acabam por determinar o que vemos ou não online. No fim, acabamos só por nos deparar com a mesma coisa, em sites diferentes, que fazem referências uns aos outros (como ao propor “acesse aqui com sua conta no Facebook”), e assim controlam, na surdina, a informação que circula em forma de bytes.
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