O arquipélago de Fernando de Noronha, na costa Nordeste do Brasil, é formado por 21 ilhas, ilhotas e rochedos espalhados por 26 quilômetros quadrados. Para chegar até esse pequeno paraíso terreno que faz parte de Pernambuco, o visitante precisa usar barco ou avião. Estima-se que 55% das emissões de gases de efeito estufa na região sejam produzidos por aeronaves que realizam o trajeto de ida e volta. Embora tenha uma frota de quase 1 500 veículos, entre caminhões, carros, ônibus e outros meios, os transportes terrestres representam apenas 10% da poluição total. Com índices como esses, tornar-se efetivamente um destino que emite baixíssima quantidade de carbono não é apenas uma ambição visionária, mas um plano em curso.
Várias iniciativas adotadas recentemente e novos programas já engatados devem tornar Noronha um exemplo nacional no combate à poluição. O Projeto Carbono Zero é um deles. Segundo as autoridades locais, sua missão é proibir a entrada e circulação de novos veículos a combustão nas ilhas a partir de 2023. Com isso, até 2030 todos os carros locais serão elétricos — algo inédito no país. Por meio de um decreto distrital, foi vetada também a entrada de plásticos de uso único, como sacolas e canudos. Assim, pretende-se proteger não só o ecossistema terrestre como o marinho, que tornou o arquipélago bastante conhecido no Brasil e no mundo.
Mudar a infraestrutura local é outra iniciativa em andamento. O Projeto Trilha Verde Noronha, lançado pela Neoenergia Pernambuco, vai construir duas usinas solares no arquipélago — a primeira delas deverá entrar em funcionamento já neste mês. O Trilha Verde também colocou dezoito veículos elétricos nas ruas, que se somaram aos setenta que estavam circulando. Está prevista ainda a construção de doze eletropostos na ilha principal. A ideia é que os módulos de bateria entrem em operação definitiva até o fim de 2022. “Precisamos inserir mobilidade elétrica na ilha de forma decisiva, e isso se faz a partir da energia fotovoltaica”, diz Saulo Cabral, presidente da Neoenergia Pernambuco.
O programa terá o mérito de servir de inspiração para os demais estados brasileiros. “A existência de planos e projetos estruturados e coesos pode definir uma base a partir da qual outras cidades passarão a buscar um futuro melhor”, diz Vinícius Picanço Rodrigues, professor de sustentabilidade do Insper. “Atualmente, as ações nesse sentido costumam ser pontuais, o que não representa um avanço muito significativo.”
Classificado pela Unesco como Patrimônio Natural da Humanidade, Fernando de Noronha abriga uma vasta biodiversidade que o instala em lugar de destaque na prática do ecoturismo. O Parque Nacional Marinho, que abrange 70% do arquipélago, abriga 230 espécies de peixes ornamentais, quinze espécies de corais e cinquenta espécies de aves terrestres e marinhas, residentes e migratórias. Por isso, preservar esse manancial, suas dezesseis praias e várias paisagens é também um imperativo econômico.
A descarbonização e a busca pela sustentabilidade são tendências mundiais. Na União Europeia, cerca de 100 cidades já se comprometeram a atingir a neutralidade de carbono até 2030. Em Estocolmo, capital da Suécia, os habitantes emitem quantidades apenas residuais de CO2, o que diminuiu significativamente o prejuízo à natureza. Nos Estados Unidos, a cidade de Ithaca ganhou prêmios internacionais por cortar o uso de combustíveis fósseis. É preciso que outras regiões sigam o exemplo e caminhem em direção a um mundo mais verde e saudável. O planeta agradece.
Publicado em VEJA de 6 de julho de 2022, edição nº 2796