Extremos climáticos soaram o alarme em 2023 no Brasil e no mundo
Não vivemos ainda o fim dos tempos, mas os estragos dos últimos meses servem de alerta, iluminam a urgência
A cena foi triste e desoladora. No fim de setembro, mais de 100 botos-cor-de-rosa e tucuxis foram encontrados mortos no lago de Tefé, município do Amazonas, a 500 quilômetros de Manaus. Os mamíferos aquáticos encalharam nos bancos de areia formados em decorrência da seca, na maior estiagem em mais de treze anos. Os rios baixaram tanto que as comunidades ribeirinhas ficaram sem água para beber e sem ter o que comer. Na capital, os manauaras viveram dias com o céu encoberto pela fumaça das queimadas das florestas. A tragédia ambiental amazonense, dada a relevância quase mítica desse pedaço do Brasil, ímã de interesse global, foi símbolo de um 2023 marcado por extremos climáticos em todo o mundo.
Na Europa e nos Estados Unidos, o verão chegou a temperaturas que ultrapassaram os 40 graus. No Brasil, o outono foi o mais quente da história. Houve enchentes e incêndios florestais, em eventos devastadores. O mês de julho, no Hemisfério Norte, foi o mais mercurial da história. O inverno se anuncia excepcionalmente rigoroso. Houve, sem dúvida, influência do El Niño, fenômeno natural que desponta de cinco em cinco anos, com aquecimento do Oceano Pacífico e reflexo em todo o planeta. Convém não desdenhar, contudo, dos evidentes efeitos nocivos do aquecimento global provocado pela ação do ser humano. Não vivemos ainda o fim dos tempos, mas os estragos dos últimos meses servem de alerta, iluminam a urgência. A humanidade precisa zelar pelo presente, de olho no futuro. Não há outra saída.
Em 2015, no Acordo de Paris, as nações se comprometeram a reduzir a emissão de carbono para impedir que os termômetros subam mais do que 1,5 grau. Contudo, a falta de comprometimento dos países ficou escancarada com a revelação de um dado assustador, em 17 de novembro, data melancolicamente histórica. Pela primeira vez a variação da temperatura global excedeu 2 graus acima dos níveis anteriores à Revolução Industrial. A preocupação é que aquele registro seja o prenúncio de outros recordes assustadores. Há tempo de evitar o pior. Deu a louca no clima, sim, mas não por acaso. A civilização tem culpa no cartório.
Publicado em VEJA de 22 de dezembro de 2023, edição nº 2873