Conhecida por sua economia historicamente instável, a Argentina enfrenta este ano mais um desafio.
Nesta terça-feira (12) o Fundo Monetário Internacional reduziu as estimativas de crescimento do país de 2% para apenas 0,2% em 2023.
Já os analistas privados foram ainda mais longe e afirmam que os argentinos rumam para uma profunda recessão, devendo enfrentar queda de 4% neste ano.
O agravamento da situação, avisa o FMI, tem tudo a ver com as mudanças climáticas. Isso porque a Argentina enfrenta o terceiro ano de seca extrema e nada menos que 55% do seu território sofre com o problema.
O fenômeno climático vem devastando todo o setor agropecuário, justamente a fonte principal de divisas em exportações da Argentina.
Milhões de hectares de soja, trigo e milho, os três principais cultivos por lá, foram totalmente dizimados.
O devastador impacto da estiagem também pode ser medido na Bolsa de Grãos de Buenos Aires.
Segundo a entidade, o país deve colher neste ano 25 milhões de toneladas de soja, o pior índice da história e 48% abaixo do potencial argentino.
A queda nas exportações, estimam analistas do setor, deve superar os 19 bilhões de dólares até dezembro.
A evaporação dos dólares afeta em cheio as finanças de Buenos Aires e pode solapar de vez o já caótico governo do presidente Alberto Fernández.
Em março, as reservas do Banco Central caíram a 2,7 bilhões de dólares, menos da metade do que o país tinha em caixa em janeiro.
Economistas já preveem que será difícil honrar o pagamento do empréstimo de 44 bilhões de dólares que o governo argentino contraiu com o FMI.
Sem dólares em circulação, o peso, a frágil moeda nacional, também tem desvalorizado a novas mínimas. Desde 2020, a moeda perdeu dois terços de seu valor.
Esse enfraquecimento da moeda, por sua vez, faz com que seja mais caro importar mercadorias, alimentando a inflação.
Só o custo dos alimentos disparou 30% no último mês.
Em março, a escalada dos preços superou os 100% ao ano, a pior em 31 anos, e acendeu o alerta para o risco iminente de uma hiperinflação.
Os eventos extremos no país vizinho servem de alerta ao Brasil. De acordo com o Banco Interamericano de Desenvolvimento, toda a América do Sul vai sofrer com as mudanças climáticas.
A entidade projeta que até 2050 deve ocorrer uma redução de cinco pontos percentuais na produtividade do campo na região, na comparação com um cenário em que não há subida nos termômetros.
A saída para minimizar catástrofes do tipo por aqui, afirmam especialistas, está na proteção à Floresta Amazônica.
“O futuro do clima no Brasil depende da preservação da Amazônia”, diz Deborah Lawrence, cientista da Universidade da Virgínia, nos Estados Unidos.
“A floresta funciona como um mecanismo de resfriamento não só da região, como de todo o globo. O suficiente para abaixar a temperatura média global em 1°C”, completa a pesquisadora.
Esse sofisticado meio de regulação climática tem como base a chamada evapotranspiração. Cada grande árvore da Amazônia suga do subsolo e despeja no ar mais de 400 litros de água no ar todos os dias.
Ao alcançar as camadas mais altas da atmosfera, esse vapor acaba formando nuvens carregadas, os chamados rios aéreos. Eles se transformam em chuva não só sobre a própria Amazônia, como também viajam milhares de quilômetros, chegando ao Sudeste brasileiro, Argentina, Paraguai e Uruguai.
Cientistas afirmam que um quinto da floresta tropical brasileira já foi devastado no último meio século, o que vem alterando o funcionamento dos rios aéreos. Eles passaram a ser mais instáveis.
Ou seja, se alternam entre períodos excessivamente secos e outros em que há excesso de chuvas, favorecendo inundações.
De acordo com Carlos Nobre, da Academia Brasileira de Ciências, se o ritmo do desmatamento prosseguir, a floresta também vai perder sua capacidade de armazenar água.
A redução da capacidade levaria ao declínio de espécies e da própria floresta em si, que acabaria substituída por vegetação rasteira semelhante às savanas.
Pesquisas feitas por Nobre também demonstram que a Amazônia armazena mais de 150 bilhões de toneladas de carbono, o equivalente a mais de dez anos de emissões globais de combustíveis fósseis.
Se a mata tropical se degradar a ponto de virar uma savana, a precipitação de chuvas cairia 30%, com consequências gravíssimas não só ao Brasil, como também Colômbia e Argentina. Os ciclos de chuva são alimentados pela umidade da Amazônia.