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Após renúncia de Johnson, os problemas de Sunak só aumentam

Escândalo expõe mais uma vez a crise do Partido Conservador, abalado por dissidências internas e pelo desgaste de quase quatorze anos no poder

Por Amanda Péchy Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 10h31 - Publicado em 17 jun 2023, 08h00

Alvo de um inquérito no Parlamento sobre falso testemunho em relação às festinhas ilegais em plena pandemia na sede do governo, quando era primeiro-ministro, Boris Johnson recebeu uma cópia antecipada do relatório final, viu que estava com a corda no pescoço e, bem ao seu feitio, optou pelo caminho mais barulhento: renunciou ao mandato. “O objetivo desde o início era me declarar culpado, independente dos fatos”, proclamou sobre o trabalho da chamada Comissão de Privilégios. Na mesma ocasião, outros parlamentares, aliados seus, também resolveram sair batendo a porta. Poderia ser uma boa notícia para o atual primeiro-ministro, Rishi Sunak — e ele anda precisando delas —, mas a debandada causa turbulência maior do que a satisfação de ver pelas costas três desafetos. Primeiro, porque ela expõe mais uma vez a crise do Partido Conservador, abalado por dissidências internas e pelo desgaste de quase quatorze anos no poder. Depois, porque os três assentos vagos serão preenchidos com eleições extraordinárias locais em que o partido pode muito bem ser derrotado.

NA MESMA - Protesto contra a nova lei: imigrantes ilegais continuam chegando
NA MESMA - Protesto contra a nova lei: imigrantes ilegais continuam chegando (Victoria Jones/PA Images/Getty Images)

Os conservadores estão 16 pontos atrás dos trabalhistas nas pesquisas e, nas votações regionais de maio, perderam mais de 1 000 postos, muitos em regiões que tinham conseguido virar há quatro anos. “Tudo indica que antecipar essa votação agora só trará benefícios para os trabalhistas”, diz Tim Bale, autor do livro O Partido Conservador após o Brexit: Turbulência e Transformação. Juntando-se a isso a teimosa elevação do custo de vida, que resulta na maior inflação entre as economias do G7, e os recordes de imigração, cujo combate foi a principal bandeira da saída da União Europeia, está formada a tempestade perfeita do primeiro-ministro que luta contra o tempo para reconquistar apoio antes das eleições gerais de janeiro de 2025 — se durar até lá.

Enquanto tenta aplacar picuinhas no Parlamento, Sunak luta para entregar suas “cinco promessas” para 2023 — baixar a inflação pela metade, fazer a economia crescer, reduzir a dívida pública, cortar a lista de espera nos hospitais e pôr fim à imigração ilegal via Canal da Mancha. Até agora, está devendo em todas as frentes. A inflação britânica saiu dos dois dígitos, mas permanecia em 8,7% em abril, acima da projeção de 8,3%. Embora o fantasma da recessão, muito real no começo do ano, pareça afastado, o PIB só deve crescer 0,3% em 2023, abalado pelo mau desempenho das exportações para a Europa após o fim da livre circulação de mercadorias — uma curva tão descendente que a associação de montadoras de automóveis britânicas pediu ao governo que renegocie todos os acordos do Brexit no setor. No caso das entradas ilegais no país, mais de 45 000 imigrantes em pequenos barcos cruzaram o Canal da Mancha no ano passado, um recorde histórico. Um novo e draconiano projeto de lei prevê a prisão e deportação de todos, mas não há centros de detenção suficientes, nem países dispostos a receber os expulsos.

BYE-BYE - Boris Johnson: decisão de sair antes de ser saído
BYE-BYE - Boris Johnson: decisão de sair antes de ser saído (Chris Ratcliffe/Bloomberg/Getty Images)
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Acuado, Sunak tenta se impor na política externa. Tomando emprestada a iniciativa do manual de Boris Johnson, que costumava viajar para a Ucrânia sempre que uma nova crise se apresentava em casa, o primeiro-ministro não só esteve em Kiev como recebeu em Londres o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky em maio, com fortes abraços e promessas de preciosa ajuda bélica contra a invasão russa. Também participou de uma cúpula da Comunidade Política Europeia (CPE) na Moldávia, onde Kiev esteve no centro das discussões. Mais recentemente, foi saudado com honras e sorrisos em Washington pelo presidente Joe Biden, mas saiu do encontro apenas com um acordo meia-­boca para “estreitar laços” entre as duas nações. Desde o Brexit, aliás, anunciado como a libertação do governo britânico para se engajar em lucrativas alianças bilaterais, quase todos os 71 pactos comerciais firmados reproduzem as cláusulas dos que foram quebrados com a saída da União Europeia. “Se a economia não melhorar, o ano que vem deve ser o último dos conservadores no governo por um bom tempo”, prevê Terrence Casey, professor de ciência política do Rose-­Hulman Instituto de Tecnologia. Difícil governar com a expectativa de ser o primeiro-ministro que tirou seu partido do poder.

Publicado em VEJA de 21 de Junho de 2023, edição nº 2846

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