Uma mulher americana se recuperou de um câncer de mama terminal depois de receber terapia experimental composta por células imunológicas produzidas por seu próprio corpo. Judy Perkins, de 52 anos, já havia se submetido a sete quimioterapias e uma droga experimental quando se inscreveu no estudo clínico para testar o novo tratamento. Na época, ela recebeu um prognóstico de três meses de vida. Após a terapia, ela já viveu dois anos e não apresenta sinais do tumor no corpo.
Embora seja um caso único, a notícia foi recebida com entusiasmo pela sociedade científica, já que pela primeira vez a abordagem conseguiu curar um câncer de mama avançado. Os resultados foram publicados na revista científica Nature Medicine e apresentados durante o Encontro Anual da Sociedade de Clínica Oncológica Americana, realizado em Chicago, nos Estados Unidos.
Judy foi diagnosticada em 2013 com um tumor de mama maligno e agressivo – quando o câncer já se espalhou para outros órgãos. Dez anos antes, ela já havia apresentado um tumor maligno do qual conseguiu se recuperar.
Após ter sido submetida a sete tipos de quimioterapia e uma droga experimental, ela descobriu que o tumor havia se espalhado para outros órgãos e não restava esperança de cura. “Ela tinha lesões do tamanho de bolas de tênis em todo o fígado. Ela provavelmente teria morrido em dois ou três meses”, contou Steven Rosenberg, do Instituto Nacional de Saúde (NIH, na sigla em inglês), à New Scientist. Foi então que Julie decidiu se inscrever no estudo clínico do NIH.
Seis semanas depois, os tumores tinham diminuído de tamanho. Um ano depois, já haviam desaparecido. Dois anos e meio depois do tratamento, ela permanece saudável, sem vestígios da doença. Atualmente, ela leva uma vida normal, praticando atividades físicas, como caminhadas e expedições de caiaque.
Terapia experimental
O tratamento experimental, chamado de transferência de células adotivas (tradução livre), impulsiona o sistema imunológico da paciente a combater os tumores. Inicialmente, os pesquisadores analisam as mutações genéticas das células cancerosas. Para chegar a este resultado, os pesquisadores fazem o sequenciamento do DNA das células cancerígenas e o comparam com o DNA de células normais.
Essas mutações são diferentes em cada paciente e algumas causam alterações nas proteínas que ficam na superfície das células. Essas proteínas, por sua vez, podem ser reconhecidas pelo sistema imunológico, que é estimulado a atacar as células cancerígenas. No entanto, essa reação imunológica natural do corpo humano geralmente não é potente o bastante para combater o câncer, sendo necessário intervenções médicas, como a quimioterapia, por exemplo.
Logo que ocorre a identificação da irregularidade celular, os linfócitos do paciente são testados contra todas as proteínas que seriam afetadas pelas mutações, para descobrir quais delas são capazes de estimular uma resposta imune. Esta segmentação de múltiplas alterações do DNA é eficiente, pois pode impedir que o câncer evolua e escape da ação do sistema imunológico.
No caso de Judy, foram identificadas 62 anormalidades genéticas no tumor, mas apenas quatro eram potencialmente atacáveis pelo sistema imunológico. Em seguida, a equipe multiplicou em laboratório as células que eram capazes de reconhecer e combater as mutações e infundiu em Judy cerca de 80 bilhões dessas células. Os pesquisadores administraram também o pembrolizumabe, um medicamento que impede a ativação dos freios do sistema imunológico.
Abordagem promissora
A mesma abordagem já foi usada para tratar alguns casos de câncer de fígado, de cólon (ou colorretal) e cervical. Mas essa é a primeira vez que ela se mostra eficaz contra câncer de mama. Muitas imunoterapias, como são conhecidos estes tratamentos, já foram bem sucedidas em combater câncer com mutações intensas, como o de pele e o de pulmão (associado ao tabagismo). Entretanto, tais tratamentos não funcionaram em cânceres com menos mutações, como é o caso do câncer de mama.
Os resultados levantam a perspectiva de uma nova forma de enfrentar cânceres avançados que tenham poucas ou nenhuma opção de tratamento.
“É o tratamento mais altamente personalizado que se possa imaginar”, disse à BBC o médico Steven Rosenberg, chefe de cirurgias no Instituto Nacional do Câncer dos EUA.
Agora, os pesquisadores planejam iniciar estudos clínicos com um número maior de pacientes, para verificar se os resultados se confirmam. Vale ressaltar que, em geral, as imunoterapias são extremamente eficientes para alguns pacientes, mas ainda não conseguem beneficiar a maioria dos doentes.