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Por que os casos de dengue estão explodindo no Brasil?

Brasil contabiliza quase meio milhão de casos em apenas três meses; laboratórios acusam aumento de 221% de exames positivos para a doença

Por Diego Alejandro
Atualizado em 14 abr 2023, 12h00 - Publicado em 13 abr 2023, 18h29

Em três meses, do começo do ano até 31 de março, foram 496.130 casos de dengue no Brasil – um aumento de 47,7% em relação ao registrado no mesmo período em 2022, ano em que o país bateu o recorde histórico de óbitos pela doença com mais de mil vítimas fatais. Em 2023, no entanto, o país já contabiliza mais de 183 mortes, média de dois óbitos por dia, segundo dados do Ministério da Saúde, para os mesmos três meses. Um número preocupante e que pode ser maior, já que ainda existem 231 óbitos em investigação.

Mas o que está por trás dessa explosão de casos de dengue que estamos vivendo?

Neste mês, a Organização Mundial da Saúde (OMS) alertou que o aumento da dengue é mundial, com foco principal no continente americano. O órgão cita, por exemplo, que a incidência da doença nas Américas passou de 500 mil casos, em 2000, para 5,2 milhões, em 2019.

“Além da densidade populacional, a falta de saneamento básico e a falta de esforços governamentais, hoje, o principal culpado é o aquecimento global”, explica Kleber Luz, professor do Departamento de Infectologia do curso de medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, coordenador do comitê de arboviroses da Sociedade Brasileira de Infectologia e consultor na Organização Pan-americana da Saúde. “É ele que permite a sobrevida do mosquito, e, portanto, a ampliação de sua população”.

O Ministério da Saúde diz que o cenário epidemiológico da dengue no Brasil tem apresentado um padrão cíclico, com alternância dos quatro subtipos do vírus causador da doença. Por isso, os períodos epidêmicos, com alto número de casos, são intercalados com períodos com menores números. O problema é que novos surtos estão ocorrendo em lugares que tinham baixa incidência. O Sul, por exemplo, é a segunda região mais atingida do país.

De acordo com a  Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed), que representa os laboratórios privados, os exames positivos para doença tiveram um crescimento de 221% na primeira semana epidemiológica de 2023. 

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Como enfrentar?

A principal estratégia de combate à dengue no país ainda são as campanhas de prevenção contra o mosquito Aedes Aegypti, transmissor da dengue. Durante a vigência do surto, no entanto, as ações de combate ao inseto, que inclui evitar a água parada, tampar caixas d’água e colocar areia nos pratos de vasos de planta, precisam ser intensificadas.

“Os agentes de endemias devem priorizar as áreas com maiores índices de infestação do vetor e maior número de casos notificados da doença, assim como manter as visitas domiciliares para busca de focos do mosquito nos municípios como um todo”, afirma Melissa Falcão, médica e membro da Sociedade Brasileira de Infectologia.

Para a especialista, a campanha precisa ser mais enfática, com a exposição dos números alarmantes para conscientizar a população do aumento de casos de dengue e do risco de morte pela doença. Outro ponto importante é a capacitação dos profissionais de saúde para diagnóstico e manejo dos casos de dengue. “As mortes por dengue são evitáveis em sua grande maioria, se houver o reconhecimento precoce dos sinais que evidenciam agravamento da doença e manejo clínico adequado”, diz Melissa.

Testes

Felizmente, o Brasil é munido de uma série de testes capazes de identificar qual vírus está infectando a pessoa e de forma mais rápida. São dois principais exames para confirmação do diagnostico da dengue: o antígeno, indicado para quem está entre o primeiro e quinto dia de sintomas e o sorológico IGG e IGM, feitos em quem está entre o sexto e décimo quarto dia de sintomas.

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“Sintomaticamente, as infecções agudas por zika, dengue e chikungunya são muito semelhantes e não é confiável o diagnóstico destas doenças apenas pelo quadro clínico”, pontua João Renato Rebello Pinho, coordenador médico do Laboratório Clínico do Hospital Israelita Albert Einstein e membro da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica / Medicina Laboratorial (SBPC/ML).

Segundo a Abramed, foram realizados, na primeira semana do ano, 4.564 exames. Desses, a doença foi confirmada em 1210, o que significa uma positividade de 26%. Quase três meses depois, foram feitos 11.514 exames, sendo 3.885 positivos, o que aumenta o índice para 34%.

Técnicas Alternativas

Também existem outras técnicas suplementares ao padrão, que podem ser uma luz no fim do túnel. Uma das mais promissoras no Brasil é o método Wolbachia, promovido pela Fiocruz no país. Funciona da seguinte forma: A Wolbachia é uma bactéria presente na maioria dos insetos (cerca de 60%), como abelhas e borboletas, mas não é naturalmente encontrada no Aedes Aegypti. Ou seja, quando implantada no mosquito, ela tem a capacidade de fazer com que o inseto não transmita dengue, Zika e chikungunya, mesmo que o vírus esteja em seu organismo. Mais recentemente, pesquisadores mostraram que ela também inibe a transmissão da febre amarela, feita pelo mesmo vetor.

Desde 2012, o programa alcançou as cidades fluminenses do Rio de Janeiro e de Niterói, além de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul; Belo Horizonte, em Minas Gerais, e Petrolina, em Pernambuco, levando à redução da incidência das três doenças nas localidades. A tecnologia também já foi introduzida em outros 11 países, na Ásia, Oceania e Américas, alcançando quase 11 milhões de pessoas até o momento – 3 milhões delas brasileiras.

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Recentemente, a Fiocruz anunciou um acordo com o World Mosquito Program para expandir a técnica com a construção de uma biofábrica capaz de produzir até 100 milhões de mosquitos por semana, 5 bilhões ao ano.

Outra estratégia similar é a criação dos “Aedes do Bem”, desenvolvidos pela empresa de biotecnologia britânica Oxitec. São mosquitos criados em laboratório que carregam um gene autolimitante que faz com que as fêmeas da espécie não sobrevivam até a idade adulta. O alvo é específico porque apenas as fêmeas picam os humanos e transmitem doenças, já que a picada faz parte de um processo para amadurecer seus ovos. Um projeto experimental na cidade de Indaiatuba, em São Paulo, demonstrou a eficácia da técnica em suprimir populações do mosquito e da disseminação da dengue.

Nesta semana, a Oxitec e a empresa de aluguel imobiliário QuintoAndar lançaram a iniciativa “Casas contra Aedes“, que propõe espalhar caixas com ovos do “Aedes do Bem” em dezenas de casas da capital paulista para avaliar o impacto na população de mosquitos do município. A ideia é que a parceria leve ainda o projeto para outras regiões do país, com o médico Drauzio Varella como embaixador da ação.

Vacinas

Outra profilaxia que pode, em breve, ser incorporada no combate à dengue é a vacina. A Anvisa liberou neste ano a Qdenga para prevenir a doença, desenvolvida pela farmacêutica japonesa Takeda. Trata-se do primeiro imunizante liberado no Brasil, tanto para as pessoas que já tiveram a doença como para aquelas que nunca apresentaral o diagnóstico.

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Nos ensaios clínicos, o imunizante mostrou uma eficácia geral de 80,2% contra a dengue causada por qualquer sorotipo após 12 meses da segunda dose. A vacina também reduziu as hospitalizações em 90%.

A Qdenga é indicada para a faixa etária de 4 a 60 anos e aplicada em um esquema de duas doses, com intervalo de três meses entre as aplicações. O imunizante é composto por quatro sorotipos diferentes do vírus causador da doença. Porém, ela depende da incorporação pelo Ministério da Saúde ao Programa Nacional de Imunizações (PNI) para chegar ao Sistema Único de Saúde (SUS).

Essa é a segunda vacina a receber um aval no Brasil. A outra, chamada Dengvaxia, fabricada pelo laboratório francês Sanofi Pasteur, é recomendada apenas para quem já foi infectado com o vírus da dengue. Além disso, é indicada somente para evitar reinfecções, que costumam ser mais graves, e para um público-alvo restrito — pessoas de 9 a 45 anos que já foram contaminadas anteriormente.

“As vacinas da dengue serão mais uma ferramenta para controle. As que temos disponíveis até o momento não serão suficientes para erradicar a doença. A única maneira efetiva para erradicação no país seria a eliminação dos vetores da doença (o mosquito Aedes), tarefa complexa e que não tem alcançando êxito com as estratégias utilizadas até agora”, conclui Melissa Galvão.

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