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Pacientes com epilepsia vão à Justiça por terapia aprovada, mas indisponível no SUS

Incorporada há 5 anos, a terapia de estimulação do nervo vago (VNS) segue inacessível; ministério afirma enfrentar entraves financeiros para implementação

Por Ligia Moraes Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 3 dez 2024, 10h25 - Publicado em 3 dez 2024, 10h00

Em 2018, o Ministério da Saúde anunciou a incorporação da terapia de estimulação do nervo vago (VNS) ao Sistema Único de Saúde (SUS), um tratamento considerado eficaz e seguro para casos graves de epilepsia resistente a medicamentos que deveria estar disponível na rede pública em março de 2019. No entanto, passados mais de cinco anos, a terapia ainda não foi implementada.

Pacientes com epilepsia refratária — condição em que as crises não são controladas mesmo com o uso de dois ou mais medicamentos adequados — têm recorrido à Justiça para garantir o acesso ao tratamento ou à troca de baterias do dispositivo. Apenas entre janeiro e julho de 2024, mais de 30 ações judiciais foram movidas, segundo dados da Associação Brasileira de Epilepsia (ABE). Esse número, porém, não reflete a totalidade dos casos, já que muitos processos seguem enfrentando impasses burocráticos.

O que é a terapia VNS?

A terapia de estimulação do nervo vago (VNS) é uma tecnologia de neuromodulação reconhecida mundialmente. Desde 2000, é aprovada no Brasil para uso clínico, mas foi incorporada ao SUS apenas em 2018. A terapia funciona como um “marca-passo cerebral”, enviando impulsos elétricos ao nervo vago para ajudar a controlar crises epilépticas.

Além de reduzir a frequência e a intensidade das crises, a VNS traz benefícios amplos que vão além do controle imediato dos sintomas. Estudos mostram que o tratamento pode diminuir internações hospitalares em até 50% e reduzir visitas ao pronto-socorro em 75%. Segundo a ABE, a terapia também melhora a cognição, o comportamento e o desenvolvimento social, especialmente em crianças.

O impacto econômico também é relevante. Um estudo publicado no ano passado no periódico científico Journal of Neurology  destacou que a tecnologia reduz a necessidade de medicamentos anticonvulsivantes e os custos associados a eles, enquanto outra pesquisa, realizada na Polônia em 2019, apontou que o VNS é uma alternativa econômica com benefícios clínicos mensuráveis no longo prazo. Além disso, a terapia não apresenta interações com outros medicamentos, facilitando seu uso como complemento aos tratamentos existentes.

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Por que a terapia não está disponível?

Embora formalmente incorporada à Tabela do SUS, a terapia VNS enfrenta desafios administrativos e financeiros que atrasam sua implementação. Segundo a ABE, o processo de incorporação sofreu com mudanças de governo desde 2018, o que resultou na necessidade de reiniciar negociações a cada troca de gestão.

 “Pacientes estão sendo obrigados a lutar na Justiça por um tratamento que já deveria estar disponível. Isso não só desrespeita o direito à saúde, mas também todos os especialistas que participaram da avaliação da terapia para sua incorporação”, critica Maria Alice Mello Susemihl, presidente da ABE. 

Além do impacto emocional, a judicialização do tratamento tem consequências financeiras significativas para o SUS. De acordo com a ABE, o custo de judicializar o acesso ao VNS é maior do que o que seria necessário para implementar o tratamento de forma ampla, com negociação direta de valores com o fabricante. Enquanto isso, o SUS continua arcando com os custos indiretos das internações e dos atendimentos emergenciais que poderiam ser evitados com o controle adequado das crises.

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Impactos para pacientes e famílias

A ABE relata que muitas famílias enfrentam burocracias desgastantes que retardam o início do tratamento. “É uma corrida contra o tempo para muitas famílias. Cinco minutos de uma crise epiléptica podem parecer uma eternidade para um pai ou uma mãe”, enfatiza Maria Alice.

Pacientes com epilepsia refratária passam, em média, 39 dias por ano internados devido a complicações das crises, segundo estudos citados pela entidade. Além do risco aumentado de traumas e queimaduras, esses pacientes têm uma taxa de mortalidade três vezes superior à da população geral.

A falta de acesso à VNS também agrava o impacto econômico e social para as famílias, que muitas vezes precisam recorrer a campanhas de arrecadação para financiar o tratamento de forma particular. A judicialização, embora represente uma alternativa, não resolve o problema para todos, já que muitos casos enfrentam atrasos significativos.

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O que diz o Ministério da Saúde

A VEJA pediu um posicionamento ao Ministério da Saúde, que afirmou que a atual gestão tem realizado uma série de estudos para viabilizar a implementação da terapia VNS no SUS desde 2023. O órgão aponta que um dos principais desafios é o monopólio da produção do dispositivo, responsável por um aumento expressivo nos custos. Os valores para o implante do gerador e eletrodo, que eram de R$ 43.000 em 2018, saltaram para R$ 89.000 em 2023. Já a troca do gerador passou de R$ 34.000 para R$ 71.000.

O Ministério informou que, para a incorporação de novas metodologias, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) analisa evidências científicas, eficácia, custos e impacto orçamentário.

Quanto à judicialização, o órgão destacou que, por não se tratar de um medicamento, a decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema não se aplica à tecnologia em questão.

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