As marcas do tempo estampadas na face humana já serviram de inspiração para muita poesia, mas nem sempre o portador delas enxerga beleza no fenômeno que se acentua com a idade e não raro se traduz em manchas. A visita ao dermatologista se torna, portanto, incontornável para uma ala crescente de pessoas, que ali podem descobrir estar diante de distúrbios de pigmentação provocados por questões genéticas ou desequilíbrios hormonais. Não apenas o componente etário pesa, mas também a exposição ao sol, fator sabidamente decisivo para imprimir tais sinais na tez. “Para se defender da agressão dos raios ultravioleta, o corpo produz mais melanina, a proteína que dá cor à pele”, explica a médica Karine Cade, da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD). Não é por acaso que o inverno, período de menor incidência desses raios, é o mais indicado para procedimentos capazes de eliminar ou atenuar as incômodas manchas.
A efervescência na procura revela o elevado interesse em dar uma mexida aqui, outra ali. Segundo um recente levantamento da SBD, 2022 registrou uma subida de 390% no rol das intervenções estéticas, boa parte delas no rosto. Após entrevistar 1 218 brasileiros de 25 a 48 anos, a associação constatou que 80% já haviam se submetido a algum tratamento. Além das marcas que se originam de anos de convívio com o sol, o que mais requer atendimento médico são os melasmas — manchas escuras causadas por hiperpigmentação, que acometem uma de cada três mulheres, sobretudo em momentos como a gestação e o pós-parto.
E aí entra em cena a boa ciência, para amenizar ou tratar o problema com um arsenal de recursos. O que os especialistas cada vez mais defendem é um combo personalizado de procedimentos e ativos. Tudo depende do tipo de pele e de mancha. Os protocolos associam protetores solares (inclusive em cápsulas), cremes, ácidos clareadores e aplicações de laser. “A vantagem do laser é que ele trata as manchas sem danificar o tecido cutâneo, removendo a camada superficial da pele e estimulando a fabricação de colágeno para regenerá-la”, diz Karine. Manchas atormentam não apenas brasileiros e brasileiras, mas a população mundial: de acordo com a consultoria global Statista, dos mais de 4 milhões de sessões registrados nos Estados Unidos, 21% têm justamente por objetivo apagar sinais da exposição solar.
Em direção diferente da de uma década atrás, quando se empregava uma única técnica por vez, a dermatologia moderna agrega tratamentos e reveza o uso das tecnologias. A prescrição de cremes com finalidades específicas segue em alta, com destaque para aqueles que trazem ingredientes como hidroquinona, retinol, ácidos glicólico e salicílico e vitamina C. “O que funciona melhor é aliar os recursos e trabalhar com um conjunto de ativos e métodos”, enfatiza a médica da SBD.
Uma alternativa mais invasiva é o peeling químico, que consiste na aplicação de substâncias para fazer descascar a última camada de pele e, assim, induzir o sumiço das manchas a partir da renovação das células. Quanto menos raios solares aí, melhor, já que podem desencadear lesões cutâneas. Uma técnica distinta, e cercada de polêmicas, é o peeling de fenol, que se popularizou nas redes — só no TikTok, foram quase 8 milhões de visualizações de conteúdo a respeito. Ao contrário da versão química, a de fenol é utilizada sobretudo para rejuvenescer a pele e deletar rugas e marcas de expressão, mas há quem invista nela para se livrar das manchas, buscando sessões sem recomendação médica em clínicas não qualificadas. “O procedimento requer monitoramento cardíaco e pode deixar a pele avermelhada ou com manchas brancas”, alerta a dermatologista Yana Almeidinha, da Sociedade Brasileira de Cirurgia Dermatológica (SBCD). Bons especialistas escolhem uma versão modificada, mais light, para aplicar em pequenas áreas, como na região acima dos lábios.
Uma orientação muito comum, mas que merece ser repisada, é manter a proteção disciplinada da pele à base de filtros solares, inclusive dentro de casa ou no escritório. Afinal, a luz azul emitida por celular, computador e certas lâmpadas também contribui para o surgimento de manchas na pele. Outra recomendação é realizar visitas periódicas ao dermatologista e dar cabo das queixas antes que ganhem maiores contornos. Vale olhar também para as pintas, às vezes confundidas com manchas, que, embora sejam inofensivas em sua maioria, podem ser o primeiro indício de um câncer de pele. Quanto antes diagnosticado, melhor. Não dá para esperar o verão chegar.
Publicado em VEJA de 19 de julho de 2023, edição nº 2850