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O sucesso dos aplicativos para meditação no isolamento

A quarentena aumentou os níveis de stress e levou os ansiosos a buscar equilíbrio nos programas. Muitos brasileiros aderiram à tendência

Por Sabrina Brito Atualizado em 4 jun 2024, 15h33 - Publicado em 28 ago 2020, 06h00

A crise do novo coronavírus provocou uma pandemia de stress. Milhões de pessoas confinadas em casa, empregos perdidos, incertezas sobre o futuro, medo de adoecer — tudo isso elevou os níveis de ansiedade da população mundial a patamares inéditos. Segundo um estudo conduzido pela Fiocruz, a Covid-19 fez com que 54% dos brasileiros se sentissem mais ansiosos. Pesquisas realizadas em outros países chegaram a conclusões parecidas, sempre identificando o aumento da inquietação de seus moradores. Na mesma medida em que a tensão subiu, a busca por formas de combatê-la também cresceu. Um dos instrumentos mais procurados por pessoas que precisam de um pouco de serenidade na vida são os aplicativos de meditação, que prometem incentivar o autoconhecimento e ajudar os adeptos a alcançar o sonhado equilíbrio. É a era do zen digital.

Atualmente, há cerca de 2 000 apps especializados em relaxamento. Juntos, eles somam 100 milhões de downloads, mas o número é crescente. Segundo relatório da consultoria Sensor Tower, apps ligados a saúde e bem-estar tiveram 2 milhões de downloads a mais em abril, já sob os efeitos da pandemia, do que em janeiro de 2020. No Brasil, o crescimento também foi notável: de acordo com os mais recentes dados disponíveis do portal RankMyAPP, as instalações desses apps dispararam 55% em março ante o mês anterior, o que representa um recorde.

Uma legião de brasileiros aderiu à tendência. A estudante carioca Julia Andrade, de 22 anos, conheceu os aplicativos de meditação em 2019, mas nunca levou a prática muito a sério. Quando veio a pandemia, notou que estava mais aflita, e decidiu recorrer aos apps. “Eles me ajudaram muito”, diz. “Agora, uso pelo menos três vezes por semana.” Um dos favoritos dos praticantes do zen digital é o aplicativo Headspace, que desde março registrou o aumento impressionante de 500% no número de downloads. O negócio faz tanto sucesso que acabou por atrair novos investimentos. Apenas no primeiro semestre, o Headspace captou 140 milhões de dólares no mercado.

Afinal, o que proporcionam esses aplicativos? De forma geral, eles oferecem cursos e exercícios de relaxamento, músicas que, dizem os praticantes, acalmam e sons (canto de pássaros, cachoeiras) que ajudam o usuário a desestressar, eliminar pensamentos negativos e concentrar-se em si próprio. Entre os mais baixados no Brasil estão os apps Calm, Meditopia e Zen. Em média, eles custam de 60 a 140 reais por ano para garantir ao adepto o direito de usufruir de todos os programas oferecidos digitalmente.

Uma das técnicas de meditação mais comuns presentes nesses aplicativos é o mindfulness, estado mental em que o indivíduo trabalha o foco e aprende a privilegiar o aqui e agora. O mindfulness começou a ser estudado na década de 70 nos Estados Unidos, chegando ao Brasil apenas em 2006, para se popularizar nos anos seguintes. “A atenção plena exercitada nessas sessões permite cultivar uma característica essencial do ser humano, que nos diferencia das máquinas e da inteligência artificial: a consciência”, diz Marcelo Demarzo, coordenador do Centro Brasileiro de Mindfulness e Promoção da Saúde. “Essa capacidade se relaciona com a habilidade de direcionar os pensamentos e impulsos, proporcionando uma vida com menos ansiedade e stress.”

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Nos últimos anos, a ciência tem se dedicado a mensurar os efeitos da meditação na melhoria da qualidade de vida dos praticantes. Um dos estudos mais completos foi feito em 2017 pela Universidade Harvard. Segundo a pesquisa, 32% das pessoas que passaram a meditar regularmente interromperam o uso de medicamentos para hipertensão. Outro levantamento, dessa vez realizado em 2018 pela Michigan Technological University, concluiu que apenas uma sessão de mindfulness foi suficiente para diminuir em 26% os níveis de ansiedade dos participantes. “A maioria dos estudos aponta para os benefícios dessas práticas, sobretudo em casos de pessoas já diagnosticadas com transtornos de ansiedade e depressão”, diz o neurocirurgião Julio Pereira, da Beneficência Portuguesa de São Paulo.

A eficácia dos aplicativos de meditação ainda não foi comprovada pela ciência. Afinal, trata-se de uma tendência relativamente nova e é preciso ter cuidado para não cair em falsas promessas. De todo modo, a maior parte dos profissionais de saúde parece concordar que o efeito de atividades como a meditação e o mindfulness existe, embora em muitos casos as mudanças sejam modestas. “A meditação baseada em mind­fulness pode devolver o presente”, diz Isabel Weiss, psicóloga da Universidade da Califórnia, em Los Angeles. “Nos últimos meses, tivemos de nos reinventar sem saber o que pode acontecer amanhã. A busca da mente sã é essencial em um contexto enervante.” Ou seja: se você está estressado, desconecte-se do mundo por breves mas valiosos períodos, feche os olhos e aproveite para meditar. Sua saúde agradece.

Publicado em VEJA de 2 de setembro de 2020, edição nº 2702

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