Formado em medicina e psicoterapia pela Universidade de São Paulo (USP), Erlei Sassi Junior estuda pacientes com transtorno borderline há 15 anos. Atualmente, coordena o Ambulatório dos Transtornos de Personalidade e do Impulso do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, também na capital paulista, e ensina médicos recém-formados a lidar com os pacientes.
Como identificar uma pessoa que sofre de transtorno borderline? O DSM qualifica os borderliners com nove sintomas. Eles têm uma alteração marcante de humor, muito relacionada a questões externas, relações intensas e instáveis, dificuldade em conviver com outras pessoas, sentem uma sensação crônica de vazio, protagonizam tentativas recorrentes de suicídio e automutilação e às vezes são paranoicos. Um comportamento anormal se torna patológico na medida em que traz sofrimento para o indivíduo e para outros. Uma palavra mal colocada, uma situação inesperada ou uma frustração podem levar o borderliner a um acesso de raiva. Na maioria das vezes, a crise dura poucas horas. É uma explosão. Outra característica importante é que o borderliner não sabe lidar com o êxito.
Quando a medicina começou a estudar os transtornos de personalidade? Os transtornos de personalidade tiveram uma ênfase especial entre 1987 e 1990, quando vigorava a terceira versão do Manual de Diagnóstico e Estatística de Distúrbios Mentais (DSM-III). Nessa época, a equipe do psicanalista Otto Kernberg aprofundou os estudos sobre o tema.
A nova versão do Manual de Diagnóstico e Estatística de Distúrbios Mentais, o DSM-V, deve ser publicado em maio de 2013. Quais serão as principais mudanças no diagnóstico do transtorno borderline? No DSM-V, a principal evolução no diagnóstico do transtorno será a aplicação de questionários destinados a medir duas características. Primeira: em que medida o paciente se vê como um indivíduo autônomo, ou seja, que não depende dos outros. Quanto mais considerar-se independente, menos graves são os sintomas. Segunda: a capacidade do paciente de colocar-se no lugar do outro. Quanto mais entender as aflições de outra pessoa, menos graves são os sintomas. Desta maneira, será possível medir o nível de intensidade do transtorno. Dependendo do grau da doença, o tratamento muda.
Como costumam reagir as famílias de um paciente com transtorno borderline? A família costuma assumir duas posturas: ou gruda no paciente ou o abandona. É oito ou oitenta. Às vezes, o médico também age dessa maneira. É frequente tratar o borderliner como uma pessoa ruim. Por isso, às vezes a família se afasta. Mas na verdade, a pessoa é doente.
A doença se manifesta da mesma maneira em homens e mulheres? Em homens as tentativas de suicídio são mais graves. Eles morrem mais. Em mulheres, são mais brandas. Às vezes, o homem tem o comportamento tão agressivo que, em vez de ir para um consultório médico, vai parar numa delegacia.
É possível curar um paciente com transtorno borderline? Os borderliners melhoram com o passar do tempo. Por volta dos 30, 35 anos, os pacientes apresentam uma melhora grande. Os sintomas tendem a sumir depois dos 40 anos. O problema é que, se não forem tratados, o emprego bacana que a pessoa poderia ter tido, não teve. Aquele namoro que poderia ter virado casamento, não deu certo. Será uma vida realmente vazia. Mas se for tratado, o paciente pode se organizar e melhorar as relações. O tratamento se resume a medicação, psicoterapia e psicoterapia de família. Mas é preciso fazer uma terapia específica. O terapeuta deve ser mais ativo, mais próximo, mais participante. O borderliner é uma pessoa que sofre muito. Ele tem a possiblidade de oscilar o humor e romper com relações que poderiam dar certo. A impulsividade acaba estragando muito a vida profissional e social. Com tratamento, é possível evitar esse sofrimento.
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