Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e publicado no BMC Health Services Research, revela que a Covid-19 impactou negativamente a atenção ao câncer de mama no Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo a pesquisa, cerca de um milhão de mamografias deixaram de ser realizadas em 2020 por causa da pandemia.
“A pesquisa é um alerta importante. O atraso no diagnóstico do câncer de mama tende a aumentar os casos de doença avançada, os custos do tratamento e da mortalidade”, afirma a oncologista Angélica Nogueira Rodrigues, diretora da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC).
Segundo a especialista, por conta dos avanços da medicina, o câncer de mama é uma doença com boas possibilidades de cura, mesmo aqueles mais agressivos, principalmente quando diagnosticado em estágio inicial, o que ocorre com a grande maioria das mulheres que fazem a mamografia anual de rastreamento. Mas a pandemia da Covid-19 sobrecarregou os sistemas de saúde de muitos países e reduziu o acesso da população ao tratamento e prevenção de outras doenças.
De acordo com o estudo, em 2020, houve redução de 41% na taxa de cobertura do rastreamento do câncer de mama em mulheres de 50 a 69 anos, ou seja, cerca de 1 milhão de mamografias perdidas. O custo direto total do rastreamento do câncer de mama reduziu proporcionalmente ao número de exames, R$ 67 milhões contra R$ 115 milhões no ano anterior. Em compensação, o custo do tratamento quimioterápico foi maior em 2020, tanto nas doenças avançadas, R$ 465 milhões contra quase R$ 438 milhões em 2019, quanto nas localizadas, R$ 113 milhões contra R$ 111 milhões.
Esses dados mostram que no primeiro ano da pandemia, a cada R$ 1,00 gasto com quimioterapia para câncer de mama localizado, foram gastos R$ 4,12 com o tratamento da doença em estádio avançados na rede pública de saúde. Cerca de 9,7% do Produto Interno Bruto (PIB) do país é gasto com o sistema público de saúde e 1,7% com o câncer.
O custo do tratamento do câncer de mama é um dos mais elevados, chegando a 15,8% do gasto total com o tratamento de todas as neoplasias no Brasil. As estimativas são de que o custo do tratamento do câncer de mama avançado (estágios III e IV) seja três vezes maior do que quando diagnosticado precocemente (estágios I e II). “Portanto, o diagnóstico precoce do câncer de mama é fundamental no controle da doença e na redução de seu impacto social e econômico nos sistemas de saúde do país”, alerta Angélica.
A saber, o câncer de mama é a neoplasia maligna mais comum no mundo, excluindo o câncer de pele não melanoma, com uma estimativa de 2,3 milhões de novos casos por ano, representando 11,7% de todos os casos de câncer. No Brasil, sem contar os tumores de pele não melanoma, o câncer de mama é o mais incidente em mulheres de todas as regiões, com taxas mais altas nas regiões Sul e Sudeste. É também, a primeira causa de morte por câncer em mulheres em todas as regiões do Brasil, exceto na região Norte, onde o câncer do colo do útero ocupa essa posição.
Metas até 2030
Por conta disso, o Ministério da Saúde elaborou um conjunto de medidas estratégicas chamado Plano de Ações Estratégicas de Enfrentamento das Doenças Crônicas e Doenças Não Transmissíveis no Brasil (2021–2030), que estabelece metas importantes para o câncer de mama: redução da mortalidade prematura em 35% até 2030, em relação ao ano de 2018; aumento da taxa de detecção precoce do câncer de mama em mulheres entre 50 e 69 anos para 70% até 2030; ampliação da oferta de serviços de rastreamento mamográfico de qualidade para as mulheres brasileiras, especialmente aquelas em situação de vulnerabilidade social; fortalecimento das ações de educação em saúde, informação e comunicação sobre prevenção e detecção precoce do câncer de mama para a população e os profissionais de saúde; aumento da cobertura vacinal contra o HPV em meninas de 9 a 14 anos.
“Os desafios para atingir esses objetivos são vários. Por exemplo, as dimensões continentais do Brasil, as desigualdades socioeconômicas regionais, a dificuldade de acesso da população aos serviços de saúde em regiões mais remotas, o desequilíbrio entre a baixa oferta do exame e a demanda ou necessidade da população, a falta de prestadores de serviço para cobrir todas as áreas e o baixo preço pago pelo exame”, explica a oncologista. “Pode parecer difícil, mas é uma batalha que precisa ser vencida para combater a doença”, finaliza.