BARCELONA* — Com os desastres que atingem as mais diferentes regiões do mundo em função das mudanças climáticas, o tema da sustentabilidade e uso consciente dos recursos tem se fortalecido na área da saúde e foi debatido em um dos painéis do congresso Euretina, da Sociedade Europeia de Especialistas em Retina, realizado em Barcelona, na Espanha.
A discussão levou em consideração o fato de que os tratamentos mais avançados para doenças que afetam a retina, membrana que transmite as imagens para o cérebro, são feitos com injeções em embalagens de plástico e gases utilizados em procedimentos cirúrgicos. As enfermidades mais importantes são a Degeneração Macular Relacionada à Idade (DMRI) e o Edema Macular Diabético (EMD), causado pela retinopatia diabética, condições que podem levar à perda da visão.
Em um painel que teve início com imagens impactantes do derretimento de geleiras na Groenlândia, o oftalmologista Jens Kiilgaard, professor do Departamento de Doenças Oculares do Hospital da Universidade de Copenhague, na Dinamarca, fez um alerta de que mudanças para evitar consequências mais graves são urgentes. No campo da oftalmologia, ilustrou a situação de grande produção de resíduos mostrando que, apenas no ano passado, foram utilizadas 15 milhões de injeções intravítreas, as que são aplicadas dentro do olho, apenas nos Estados Unidos.
“Os resíduos são um problema pela quantidade de dispositivos plásticos que precisam ser usados assim como os gases utilizados em procedimentos nos olhos. Precisamos engajar políticas para que ocorra uma redução, porque somos uma parte do problema.”
A situação é desafiadora e coloca médicos e toda a cadeia relacionada à saúde diante de um dilema, segundo Kiilgaard. “Reduzir os resíduos é um grande problema para os hospitais, porque precisamos realizar cirurgias e tratamentos seguros para os pacientes. Mas, por outro lado, precisamos cuidar das futuras gerações”, disse a VEJA.
Necessidade de soluções sustentáveis
De acordo com o professor, ainda não há soluções disponíveis para equilibrar a necessidade de oferecer tratamentos eficazes e seguros para os pacientes, como os já consolidados, e alcançar padrões que impactem menos o ambiente. No entanto, opções mais sustentáveis devem ser estudadas.
“Precisamos de uma ação conjunta de governos, fabricantes e hospitais. Temos de trabalhar juntos e acredito que a área de retina vai ter um papel importante neste processo.”
Ele sugere diálogos que alinhem a produção com a necessidade dos oftalmologistas em seus procedimentos, por exemplo. “Talvez poderíamos reduzir ainda mais se pudéssemos fazer os fabricantes produzirem embalagens para que tivéssemos exatamente o que vamos usar. Nada mais.”
Durante sua apresentação, Kiilgaard abordou temas que até podem impressionar em um primeiro momento, como a discussão sobre as situações em que é o uso de luvas é dispensável. A proposta é analisar todas as etapas e processos com base em evidências científicas e sem descuidar da segurança do paciente.
“Precisamos usar luvas ou podemos usar antissépticos nas mãos para nos livrarmos de bactérias da superfície? Se precisarmos usar luvas, em quais situações devemos fazê-lo?”, questiona.
Sustentabilidade no congresso
Realizado no Centro de Convenções Internacional de Barcelona (CCIB), o congresso apresentou a proposta de levar a reflexão sobre práticas sustentáveis para o dia a dia dos oftalmologistas. Iniciativas neste sentido começaram em 2018 e, neste ano, a Sociedade Europeia de Especialistas em Retina estabeleceu um comitê de sustentabilidade com o objetivo de elaborar diretrizes para clínicas de retina e fazer parcerias com a indústria com foco em reduzir a pegada de carbono.
“Recentemente, nós nos juntamos à EyeSustain, uma coalizão global de sociedades oftalmológicas, organizações e oftalmologistas que colaboram para tornar os cuidados e cirurgias oftalmológicas mais sustentáveis”, relatou Dara Conlon, vice-presidente executiva da Euretina
O evento reduziu o uso de papel e materiais de plástico, principalmente copos descartáveis. Foi feita a distribuição gratuita de garrafas de alumínio para os participantes que podiam enchê-las nos bebedouros espalhados pelo local. Um detalhe que certamente fez diferença e plantou a reflexão sobre a importância de diminuir os resíduos sempre que for possível.
* A repórter viajou a convite da Bayer