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Traí, sim, e daí?

Deborah Secco, que levantou a bandeira do direito à infidelidade feminina, fala das relações abusivas que manteve e sai em defesa dos homossexuais

Por Luisa Bustamante Atualizado em 8 set 2017, 06h00 - Publicado em 8 set 2017, 06h00

Intérprete de mulheres sensuais e arrebatadoras em novelas e protagonista de amores incendiários na vida real, a atriz Deborah Secco, de 37 anos, passou boa parte da existência no olho do furacão. Aí, teve a filha Maria Flor, hoje com quase 2 anos, e engatou uma rotina mais pacata — até sacudir recentemente a internet com a informação de que traiu todos os homens com quem se relacionou (menos, é claro, o atual, Hugo Moura, aspirante a ator e pai de Maria Flor). Deborah ficou chocada com a fuzilaria de críticas, principalmente aquelas vindas de mulheres — a maioria, por sinal. Neste ano, em que completa três décadas de carreira e estreia no teatro o monólogo Uma Noite Dessas, no qual interpreta 34 personagens, Deborah falou a VEJA sobre o amadurecimento que a liberou para “falar de tudo”.

Confirmando: a senhora traiu mesmo todos os ex-namorados? Traí todos. E fui traída por quase todos.

Acha isso o.k.? Não me orgulho, mas não vou mentir. Não tenho necessidade de ser vista pelos homens como gostosinha, bonitinha e boazinha. Se algum quiser ficar com outra para não ser traído, que seja feliz. Comigo é vida real. É terrível ver mulheres que só são fiéis porque acham que é o certo. Isso é muito retrógrado. Quem quiser trair, que traia.

Como foi a reação à sua confissão? O que mais me chocou foi ver que as maiores críticas vieram de mulheres. É inadmissível que em 2017, com o enorme movimento pela liberação feminina, 90% das que comentaram o fizeram para se pronunciar contra mim. É muito triste que as mulheres não se defendam, não lutem pela liberdade mínima de aceitar que a gente pode, sim, trair o homem. Como os homens traem a gente.

Entre os ex, algum deles reclamou? Ninguém me procurou, não. Aliás, fiquei abismada com as listas de ex-­namorados traídos que saíram na imprensa. Tinha o nome de gente que eu nunca considerei meu namorado. E tudo isso porque sou mulher. A maioria dos homens que eu traí também me traiu publicamente e nunca vi meu nome em lista nenhuma.

Alguém não sabia da traição e pode ter se surpreendido com sua declaração? Não. Todas as pessoas que eu traí souberam logo, até porque eu terminei em seguida.

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E por que a senhora traiu? Foi vingança? Foi necessidade de liberdade. Muitos homens com quem eu me relacionei sentiam prazer com a minha submissão, tinham necessidade de mandar em mim. Eu me senti sufocada e precisei cometer um erro para olhar de fora e perceber que estava em uma relação doentia.

Qual a sensação depois? Para mim sempre foi ruim, porque eu estava infeliz. Mas, se uma mulher quiser trair porque acha bom, tudo bem.

Mas a senhora não acha que trair é errado tanto para o homem como para a mulher? É errado, sim, mas somos todos humanos, homens e mulheres, e estamos sujeitos a falhas.

Como se desenvolviam essas relações doentias de que a senhora fala? Eu tive homens muito controladores, que me oprimiam, de quem eu dependia emocionalmente. Vivi relações abusivas em grau muito forte. Convivi com um que me trancava no quarto para eu não comer. Dizia que eu estava gorda e que, se continuasse assim, ele não iria me querer mais.

Quem fez isso? Um dos meus primeiros namorados, ninguém famoso.

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Um de seus ex é o ator Dado Dolabella, condenado por bater em mulheres. Ele era agressivo? Não. Foi namoro normal, dentro dos padrões.

A senhora chegou a ser fisicamente agredida em algum namoro? Nunca, mas tive medo de apanhar. Sofri muitas agressões verbais. Um deles dizia que eu só era bem-vista e tinha amigos por ser namorada dele, o meu salvador. Eu era cega, viciada nesse tipo de relacionamento. Muitos eram bonzinhos no início, até começarem a impor seus limites. A pessoa abusiva pode ser muito cativante.

Por que insistiu em relacionamentos que lhe faziam mal? Eu achava a separação uma coisa feia, me preocupava com o que iriam pensar de mim. Também era carente. Meu pai se ausentou muito depois que se separou da minha mãe. Mas aprendi na terapia a lidar com a carência. Fiz por catorze anos.

Por falar no seu pai, ele chegou a ser preso por desvio de verba, em processo em que a senhora aparecia como laranja. Vocês superaram isso? Prefiro não falar desse assunto, porque ainda dói muito e o processo continua correndo. Eu e meu pai ficamos muitos anos afastados. Com o nascimento da Maria, ele se reaproximou. É um excelente avô. Acho que está tentando compensar o passado.

A senhora sempre foi muito intensa nos seus relacionamentos, do tipo que fazia tatuagens e declarações de amor. A intensidade diminuiu? A imprensa é cruel comigo. Quando amei, levei porrada. Quando traí, levei porrada. Parem de me julgar, caramba! Só estou tentando ser feliz. Não me acho menos intensa, pelo contrário. Sou grudenta, quero estar perto, digo que amo abertamente. A diferença é que encontrei alguém que topa a minha intensidade, então não existe desequilíbrio.

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Dizem que Chico Buarque escreveu a música Ela Faz Cinema para a senhora. É verdade? Também já ouvi essa história. Adoraria que fosse verdade, mas ele nunca me disse isso. Aliás, nem tinha feito cinema quando a música foi lançada.

Neste ano a senhora completa trinta anos de uma carreira em que o sucesso surgiu cedo. O caminho foi fácil? Até que foi. Sempre quis ser atriz. Como comecei muito nova, as coisas foram acontecendo sem planejamento. De início na TV, e emendei trabalhos. Numa época em que eu vinha me sentindo menos artista, fui para o cinema e fiz dois longas que considero presentes, Bruna Surfistinha e Boa Sorte. Agora estou com esse monólogo no teatro.

Houve momentos em que se deslumbrou com a fama? Com a fama não. Mas no começo me deslumbrei com o acesso a coisas caras e a mordomias que não conhecia. Poxa, eu tenho origem humilde. Minha família inteira ia para a Ilha de Caras e guardava os brindes como se fossem presentes de Natal. Eu ia para lá não para aparecer na revista, mas para andar de helicóptero e de jet ski com meus irmãos. Lembro que me diziam para não frequentar tantos camarotes, mas eu era adolescente, queria aproveitar.

A senhora publica muitas fotos da sua filha nas redes sociais. Não é exposição demais? Sempre tive certeza de que não conseguiria evitar a exposição dela. Não tenho o dinheiro da Sandy, não ando cheia de seguranças e não moro em Campinas. Então quis evitar que, cada vez que ela aparecesse, isso causasse uma comoção. Acho que, ao divulgar a imagem da Maria, ela vai ficando mais comum e não desperta tanta curiosidade.

Depois de um tempo fora da TV, a senhora voltou no ano passado, em Malhação. Foi um retrocesso? Não considero essa uma volta de verdade, porque gravava só dois dias por semana. Artisticamente, não foi incrível, mas era perfeito para a minha situação: precisava ganhar dinheiro e queria ter tempo para a Maria.

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Em Malhação, conviveu com a novíssima geração de artistas. O que achou dela? Tem bastante gente boa, mas muitos só pensam em ser famosos. Antigamente, a gente queria ser ator. Agora, a ambição é mais financeira que artística, talvez porque a internet trouxe a possibilidade da fama para mais perto das pessoas. Ninguém enche os olhos com um bom livro, as pessoas só querem saber de likes. Querem mesmo é expor o corpinho no Instagram.

A senhora expõe bastante o corpinho no Instagram. É trabalho. Preciso me enquadrar nos padrões esperados, mas, ao mesmo tempo, procuro desempenhar meu papel social de problematizar. Eu falo de tudo. Só não falo da minha posição política, até porque ninguém perguntou.

Qual é sua posição política? Odeio me colocar politicamente. Me entristece ver as pessoas desistindo de lutar. Elas tinham de tirar a mãe do xingamento e passar a gritar “filho de deputado” ou “filho de presidente”.

A denúncia de que José Mayer assediou uma figurinista causou escândalo. A senhora já foi assediada? Não houve nada direto, mas muitos tentaram se aproximar. Tipo um abraço mais apertado, me chamar para jantar. Eu me fiz de burra e saí escorregando. Sempre precisei do meu emprego, tinha medo de me revoltar contra pessoas poderosas.

Interpretar tantas personagens sensuais criou um rótulo? Todo ator tem um rótulo. A TV tem uma fórmula: se você der certo num papel, eles vão colocá-la ali para sempre. A Globo me dá papéis sexy porque isso rende audiência. Não sei se um dia vou me livrar, e não me sinto prejudicada, pelo contrário. É um tipo de personagem fácil de fazer sucesso, apesar de eu não me achar nem um pouco sexy.

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Não? Não mesmo. Tiro 45 fotos antes de postar uma. Quero retocar tudo, acho que estou gorda, com a pele ruim, sobrancelha torta. Sou cheia de neuroses. Tenho uma preguiça surreal de me cuidar. Não malho mais e, desde que minha filha nasceu, sinto uma culpa enorme de sair de casa para ir ao salão de beleza. Só vou para apertar meu aplique.

Seu cabelo não é de verdade? Quase não tenho cabelo, e o que tenho é muito fino. Uso aplique há uns vinte anos.

E o peito? Coloquei silicone há muito tempo. Era magrinha e queria ser gostosona. Hoje não colocaria.

Recentemente a senhora postou uma foto de dois homens beijando-se. Foi para provocar? Só reproduzi uma capa de revista que achei linda. Mas fico preocupada com o ódio que os homossexuais despertam. Aceito que os evangélicos, por exemplo, achem errado. Mas não tolero quando agridem e insultam homossexuais.

Já namorou gays? Namorei um bissexual e um gay. Que eu saiba.

Publicado em VEJA de 13 de setembro de 2017, edição nº 2547

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