Se a Copa do Mundo fosse apenas futebol, certamente não teria a dimensão e a graça que tem — mas, sem os gols e os lances inesquecíveis que constroem as lendas, cairia no esquecimento rapidamente. Toda Copa é um espetáculo, e já se foram vinte, mas uma Copa na Rússia tem algo a mais. Vista do Brasil, e de todos os outros países, há o charme da história de uma nação continental que desde os primórdios, passando pelo tempo dos czares, pelo período soviético e mesmo pelos dias de hoje, com a mão dura de Vladimir Putin, sempre despertou interesse. Haverá Messi, haverá Cristiano Ronaldo e Neymar. Haverá a polêmica da estreia do VAR, o árbitro assistente de vídeo. O Brasil buscará o hexa e a Alemanha, o penta. Muito se falará das denúncias de sobrepreço nos estádios (nenhuma novidade nesse ponto). Teremos, enfim, diversão à beça a partir de 14 de junho, com o jogo inaugural entre os donos da casa e a Arábia Saudita, até a final, em 15 de julho, no Estádio Lujniki, em Moscou. Mas, por trás dessa camada mais evidente, há um estrato fascinante, porque, insista-se, não se trata só de bola.
Para o britânico Orlando Figes, autor do extraordinário Uma História Cultural da Rússia, o país “convida o historiador (…) a sondar debaixo da superfície de aparência artística. Nos últimos duzentos anos, as artes na Rússia serviram de arena para o debate político, filosófico e religioso, na ausência de parlamento e de imprensa livre”. O esporte, quando chega à Rússia, também não pode ficar apenas na superfície. Por isso VEJA decidiu colar esta reportagem especial ao ambiente artístico do país, aos grandes nomes da literatura russa, relacionando os perfis de Tite, Neymar e Gabriel Jesus a personagens das páginas de escritores do século XIX, como Gógol, Dostoiévski e Tolstói. A associação parece improvável, mas funciona, ajuda a mostrar como a seleção chega à Copa — e que Copa do Mundo veremos. Boa leitura.
Publicado em VEJA de 13 de junho de 2018, edição nº 2586