Encerrada no domingo 29, a 16ª Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) foi mais, digamos, apertada do que as edições anteriores. O número de autores foi menor: 33, contra 46 no ano passado. O orçamento também diminuiu: 5,3 milhões de reais, meio milhão a menos que o de 2017. E até o espaço físico no centro da cidade histórica foi reduzido. O auditório no qual o público pagante (ingressos a 55 reais por mesa) assistia ao evento foi montado bem perto da tenda onde se podia acompanhar, gratuitamente, a conversa literária por telão. No entanto, os organizadores comemoraram o aumento de público. No ano passado, foram 25 000 pessoas; agora, 26 400. A Flip está mesmo consolidada no calendário cultural brasileiro.
A programação, que já contou com prêmios Nobel e escritores que frequentam listas de mais vendidos, não teve nomes estelares. Os mais esperados eram Colson Whitehead, ganhador do Pulitzer 2017 com The Underground Railroad — Os Caminhos para a Liberdade, André Aciman, conhecido pela adaptação cinematográfica de seu romance Me Chame pelo Seu Nome, e Leïla Slimani, vencedora do Prêmio Goncourt, que lançou no Brasil seu segundo romance, Canção de Ninar. Ao lado do evento de abertura — Fernanda Montenegro lendo textos da escritora homenageada, Hilda Hilst —, as mesas de que esses três autores participaram foram as únicas que lotaram o auditório. Já não é uma festa exclusiva de “ratos de biblioteca”: a Flip teve mais atrações musicais e diversificou-se em 22 “casas parceiras” que promoviam uma programação paralela, às vezes com nítido acento político em ano eleitoral. Uma delas nem casa era: o barco da Festa Literária Pirata das Editoras Independentes (Flipei) propôs-se a discutir os rumos do Brasil. O estêncil com o rosto de Lula e a presença de Guilherme Boulos deixavam claro para que lado estava virado o timão dessa nau.
A escritora que mais encantou os participantes da Flip ainda é relativamente desconhecida do leitor brasileiro. Com apenas um livro por aqui — a coletânea de contos de terror Era Uma Vez uma Mulher que Tentou Matar o Bebê da Vizinha —, a russa Liudmila Petruchévskaia, de 80 anos, era um problema para a organização: só fala sua língua nativa, e o filho fluente em inglês nem sempre estava por perto para servir de intérprete. Mas sua fala meio desencontrada, com anedotas da dura vida que levou na Rússia nos tempos soviéticos, conquistou a plateia. Que veio abaixo quando a escritora improvisou um show com cinco canções, incluindo uma versão russa de Besame Mucho.
Publicado em VEJA de 8 de agosto de 2018, edição nº 2594