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Luz na depressão

Estudo mostra ótimos resultados com o uso da cetamina em idosos afundados no sofrimento mental. A boa-nova: o composto está prestes a chegar às farmácias

Por Natalia Cuminale Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 18h10 - Publicado em 29 jul 2017, 06h00
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  • “Se você conhece alguém que esteja deprimido, por favor, nunca lhe pergunte o porquê. A depressão não é uma resposta simples para uma situação ruim. A depressão é apenas como o clima.” A bela definição é do ator e cineasta britânico Stephen Fry, que conhece muito bem o terreno no qual pisa, de sol e chuva, imensa claridade e devastadora escuridão. A depressão atinge 4,4% da população mundial, ou 330 milhões de pessoas. No Brasil, a incidência da doença chega a 6%, o equivalente a 12 milhões de mulheres e homens — elas em número superior. Na semana passada, um estudo publicado na revista científica American Journal of Geriatric Psychiatry trouxe otimismo para o tratamento da depressão em idosos, um público vulnerável ao transtorno. A pesquisa mostra que o uso da cetamina — desenvolvida a partir de uma substância anestésica adotada na década de 60 para atender os soldados americanos feridos no Vietnã — é eficaz para os doentes com mais de 60 anos que não melhoram com nenhum outro tipo de tratamento. Dos dezesseis participantes, onze relataram melhora.

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    (VEJA/VEJA)

    Embora o levantamento tenha contado com um pequeno grupo, os resultados revelam um enorme potencial. Já haviam sido testados todos os outros medicamentos disponíveis no mercado, mas nenhum se mostrou capaz de resgatar os pacientes do afogamento psicológico. A depressão é uma doença complexa, e suas origens biológicas ainda não foram totalmente desvendadas. Fatores genéticos, ambientais e psicológicos a tornam ainda mais obscura. Nas últimas três décadas, não houve grandes avanços na busca de medicamentos. Agora que os cientistas têm uma imagem mais matizada do que é a doença — não algo monolítico, mas provavelmente a soma de dezenas de distúrbios —, começa-se a entender o que funciona para cada caso específico. E, talvez esse seja o grande passo, despontam remédios que agem com mais presteza para tirar o depressivo da letargia — testes com a cetamina comprovaram que o medicamento produz efeito rápido. Os atuais antidepressivos exigem até quatro semanas para promover algum conforto.

    A versão para aplicação nasal da cetamina ainda não foi aprovada pela FDA, mas a agência americana que regula os medicamentos classificou o produto como “terapia inovadora”, um atalho para o sim definitivo. É possível que chegue ao mercado já no ano que vem. Atualmente, há três formulações: líquida (injetável), sublingual e de spray nasal, esta que caminha para chegar às prateleiras. Os efeitos colaterais são poucos. Cerca de 15% dos pacientes apresentaram efeitos dissociativos, leve distorção de tempo e espaço, que para depois de quinze minutos.

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    (VEJA/VEJA)
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    A cetamina regula as taxas cerebrais de glutamato, neurotransmissor com ação excitatória sobre o cérebro. Nos depressivos, o glutamato dificulta as conexões entre um neurônio e outro, as chamadas sinapses — essenciais para o bom funcionamento cerebral. Diz o psiquiatra Rodrigo Machado Vieira, professor titular de psiquiatria da Universidade do Texas, nos Estados Unidos: “Era uma grande aposta que já está se tornando realidade para a depressão”.

    Por enquanto, o uso da cetamina deverá ser indicado para pacientes com depressão severa, que não respondem aos tratamentos que existem atualmente, ou para aqueles com risco iminente de suicídio. Um estudo divulgado no ano passado mostrou que 36% dos pacientes frearam a perspectiva de se matar quatro horas depois de inalar a substância, e 49% experimentaram o mesmo efeito 24 horas depois de receber a mesma dose. São resultados excepcionais, nunca alcançados em outros tratamentos.

    A chegada da cetamina ao mercado para oferecer alívio às vítimas de depressão aguda será a volta triunfal de uma substância que, nos anos 1990, era usada, numa versão em pó, como um alucinógeno em baladas noturnas de gente que virava a noite dançando de um lado para o outro.

    Publicado em VEJA de 2 de agosto de 2017, edição nº 2541

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