Você é a prova viva de que não é preciso ter olhos puxados para ser bem-sucedido no tênis de mesa? Acho que poucos esperavam isso, principalmente por eu ser do Brasil, um lugar com pouca tradição no esporte. Mas hoje meus adversários me conhecem, até porque tenho jogado muitos campeonatos internacionais e obtido bons resultados. Agora estou em um novo patamar, e eles sabem que precisam estudar meu jogo para me vencer.
O que explica a dominância asiática? Os chineses têm o melhor ambiente para treinar do mundo, mas é impossível um estrangeiro treinar lá. Eles raramente perdem para um atleta ocidental, e alcancei essa façanha agora no Aberto do Catar (Hugo foi vice-campeão do torneio, perdendo apenas para o novo líder do ranking mundial — um chinês, aliás). Definitivamente não foi uma tarefa fácil.
O esporte brasileiro vive tempos de crise. Como você tem se mantido? Felizmente, não perdi patrocínio algum depois da Olimpíada. Pelo contrário, uma fabricante de carros japonesa passou a me apoiar após os Jogos do Rio, em 2016. Aqui na Alemanha, onde moro há quatro anos, o investimento no tênis de mesa é muito maior. Então, consigo viver tranquilamente do meu esporte. Tenho até o apoio de uma marca francesa de equipamentos para tênis de mesa, que fez para mim uma raquete personalizada. Isso é normal entre os melhores jogadores do mundo.
É mesmo? E como se chama a sua? Batizei-a de Foco. Afinal, queria ressaltar minha principal característica como mesa-tenista. Sempre tive uma força psicológica muito intensa.
Mas o que determina o sucesso de um jogador de tênis de mesa: a boa cabeça ou o braço afiado? A cabeça é o mais importante. É claro que só ela não garante um bom jogador, mas, se você tiver uma parte mental boa, ela vai ajudar na preparação do corpo e da técnica.
Nas redes sociais, você posta várias fotos jogando outros esportes. Isso não é tirar o foco? Pelo contrário. Se eu jogasse somente tênis de mesa, ia acabar ficando louco. Quando estou no Rio, a primeira coisa que costumo fazer é jogar basquete. Ter essa base ampla me ajuda até hoje. Meu pai é professor de educação física e, desde que eu era pequeno, me incentivou a praticar várias modalidades. Acho que não passo vergonha em nenhuma. Só não pratico esportes radicais.
Por que não? Não posso. O contrato com o time alemão me proíbe de esquiar, por exemplo.
Publicado em VEJA de 21 de março de 2018, edição nº 2574