Fim da aula de matemática, os vinte alunos do 6º ano do Colégio Oswald de Andrade, em São Paulo, se dispersam e conversam alto. Em meio à balbúrdia, a professora da disciplina seguinte entra na sala, posta-se em frente ao grupo e pergunta: “Vocês acham que a mente de vocês tem mais pensamentos positivos ou negativos?”. A maioria grita: “Negativos!”. Eles contam ter medo de ir mal numa prova, machucar-se no jogo de futebol e fazer algo que resulte em bronca dos pais. A professora, então, diz que eles podem treinar o corpo para melhorar isso. “Sentem-se com as costas eretas, mãos nos joelhos e pés no chão. Respirem fundo, fechem os olhos e prestem atenção nas palavras boas que vou dizer.” Ela pede que eles se imaginem no quarto de casa de manhã e que emitam um pensamento de felicidade. Após quatro minutos, findo o exercício, a classe está notoriamente mais tranquila. Os estudantes passam a falar mais baixo e aparentar calma. Perguntados, todos dizem se sentir mais relaxados. O que se viu foi uma aula de meditação para crianças, prática adotada em duas dezenas de escolas particulares de São Paulo e do Rio de Janeiro. Nos Estados Unidos, estima-se que 1 milhão de meninos e meninas sejam adeptos regulares da meditação, disciplina eletiva na maior parte dos estados.
Um levantamento publicado na revista científica americana Psychology Research and Behavior Management mostrou que os efeitos já comprovados da meditação são poderosos no organismo infantil. Das vinte crianças de 9 anos analisadas, todas com algum grau de ansiedade, apenas as que se exercitaram na prática (por 45 minutos diários em oito semanas) apresentaram melhoras em aspectos emocionais, como maior socialização e redução de sentimentos como tristeza, medo e raiva, além de aumento da concentração. A melhora geral foi da ordem de 35%, diz o levantamento. Uma das explicações para esse bom resultado reside no fato de que o cérebro da criança é mais receptivo a estímulos, por estar em formação. “Quanto antes ela passar a praticar, mais eficaz será a ação”, diz a pediatra Paula Pasqualucci, instrutora do Estúdio de Meditação Moved by Mindfulness, em São Paulo. Manuela Eizirik Polanczyk, de 9 anos, começou a meditar há dois meses, em casa, com a irmã Clara, de 6 anos. A mãe, Mariana, adepta da prática, contratou uma professora para iniciar as meninas nos exercícios. Manuela gostou: “Isso me acalma quando estou irritada ou triste”.
Para aumentar a capacidade de concentração e relaxamento, o praticante da meditação é ensinado a ter “consciência plena” do momento presente — algo que os adultos conseguem mais facilmente: quase sempre, basta que prestem atenção na própria respiração. Com as crianças, é diferente. “Elas precisam de situações mais figurativas, como imaginar-se em algum lugar descrito em detalhes”, diz Daniela Degani, professora de meditação do Oswald de Andrade e de outras escolas. Os efeitos na saúde começaram a ser estudados nos anos 70. Comprovou-se, então, que o hábito de esvaziar a mente ajuda a controlar as taxas de hormônios ligados ao stress. Na década de 90, as pesquisas avançaram com o aperfeiçoamento dos exames de imagem cerebral. Entre as crianças, elas tiveram início há uma década apenas — mas os ânimos dos pequenos já parecem mais serenos.
Publicado em VEJA de 11 de julho de 2018, edição nº 2590