É HOJE! Assine a partir de 1,49/semana
Continua após publicidade

Carta ao Leitor: Inveja da minha cor

Aos poucos, a fumaça criada em torno do mito da democracia racial brasileira começa a se dissipar para que o país finalmente encare essa dura realidade

Por Da Redação Atualizado em 4 jun 2024, 15h43 - Publicado em 14 ago 2020, 06h00

“Se você é negro, melhor nem aparecer na rua”, canta Bob Dylan em Hurricane, de 1975, canção inspirada no boxeador Rubin Carter, preso em 1966 sob a acusação de ter participado de um triplo homicídio ocorrido em Nova Jersey, nos Estados Unidos. O pugilista, um dos mais talentosos de sua geração, só seria libertado em 1985, quando a Corte Federal julgou que o racismo havia sido determinante para a sua injusta condenação. Por isso, o caso virou um dos marcos na luta americana contra essa vergonhosa chaga, ainda longe de ser extirpada, como demonstrou a tragédia de George Floyd, o americano negro asfixiado pelo joelho de um policial branco no fim de maio.

O triste e chocante episódio fez a hashtag #BlackLivesMatter materializar-se na forma de protestos nas ruas do país e em outras partes do mundo. O movimento ganhou apoio de celebridades das mais diferentes áreas, a questão continua inspirando obras de arte (exemplo recente é Lovecraft Country, nova série da HBO, tema da resenha da pág. 88) e o debate terá um impacto enorme nas próximas eleições americanas. Prova disso é a escolha da senadora negra Kamala Harris como candidata a vice na chapa do democrata Joe Biden (leia reportagem na pág. 54).

No Brasil, o volume da reação nas ruas a atos de preconceito cresceu, mas não se aproxima das manifestações ocorridas no exterior. Em meio a essa inaceitável tolerância, continuam a acontecer casos como o do homem branco em São Paulo que vira para o motoboy negro e diz: “Você tem inveja (da minha cor)”. O sinal positivo é que o debate em torno do problema passa a ganhar um corpo inédito por aqui. Aos poucos, a fumaça de décadas criada em torno do mito da democracia racial brasileira começa a se dissipar para que o país finalmente encare essa dura realidade. Segundo um levantamento exclusivo de VEJA, realizado pelo Instituto Paraná Pesquisas, 61% dos brasileiros consideram que somos, sim, um país racista. Trata-se de um avanço e tanto para uma sociedade acostumada a minimizar e rejeitar tal comportamento. A reportagem que se inicia na página 34 desta edição esclarece os motivos que provocaram o despertar salutar da consciência coletiva para um problema histórico.

Evidentemente, o resultado da pesquisa é apenas um começo promissor (afinal, não se elimina uma doença sem o diagnóstico). Em paralelo, será necessário também aprofundar essa discussão para cortarmos de vez um mal que está diretamente ligado ao surgimento e à perpetuação de várias de nossas desigualdades. Aliás, os exemplos da relação direta entre as duas realidades — o preconceito e a falta de oportunidades — são inegáveis. Menos de 5% dos cargos executivos das 500 maiores empresas do Brasil são preenchidos por negros, enquanto eles representam 75% dos mortos pela polícia e 62% da população carcerária. Como se vê, infelizmente, o verso da velha canção de Dylan sobre Rubin Carter permanece atual e não se aplica somente aos Estados Unidos.

Publicado em VEJA de 19 de agosto de 2020, edição nº 2700

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Semana Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

Apenas 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (a partir de R$ 8,90 por revista)

a partir de 35,60/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.