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Bom para mim ou para o mundo?

Aprendi que, num negócio, dá para juntar as duas coisas

Por Fernando Grostein Andrade
Atualizado em 18 out 2017, 13h37 - Publicado em 13 out 2017, 06h00
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  • Tenho um amigo querido, o Rodrigo Pipponzi, que é daqueles que a gente pode ficar um tempão sem ver e, quando encontra, parece que foi ontem. Estudamos no Santa Cruz e fizemos faculdade na FGV. Foi na casa de praia dele que vivi minha adolescência e, clandestinamente, dei meu primeiro beijo num garoto.

    Como eu, Rodrigo é um jovem privilegiado. Só que eu sou de classe média e Rodrigo é de classe alta. É um dos herdeiros de uma grande rede de farmácias. Quando realizo algo legal na vida, não é raro acontecer de um hater fazer um comentário assim: “Também, com tanta peixada, até eu”. Uma vez, um grande banqueiro que eu entrevistei me disse: “O que importa é exercer o privilégio com responsabilidade”. E foi isso que o Rodrigo fez.

    Depois de uns anos sem nos vermos, eu e ele nos reencontramos para um café. Eu contei dos meus projetos e ele contou dos dele. Criou uma revista chamada Sorria, do setor 2.5, um modelo novo, que funciona como uma intercessão do terceiro setor (o mundo das ONGs) com o mundo dos negócios. A revista, bimestral, é vendida a 3,95 reais em todas as lojas da rede de farmácias da família e sai com 220 000 exemplares a cada edição. Com o dinheiro que arrecada, o Rodrigo paga os custos de produção e os impostos. A diferença é doada — cada edição rende em média 350 000 reais para instituições como o Graacc (Grupo de Apoio ao Adolescente e à Criança com Câncer). Em dez anos, eles arrecadaram 21 milhões de reais líquidos para 36 ONGs.

    O Rodrigo não está sozinho. Nos Estados Unidos, o empreendedor Peter Thum partiu da premissa de que água mineral chique é praticamente igual a água normal e criou uma marca para vender água comum pelo preço de água chique. A diferença vai para projetos sociais de crianças que não têm acesso a água na África. A companhia foi vendida para a rede Starbucks. Depois dela, Thum já criou mais duas empresas — ambas do setor 2.5. Uma delas transforma armas apreendidas em zona de guerra em joias e bijuterias que trazem os números de série dos equipamentos originais. Parte dos lucros desses produtos é revertida para projetos sociais em países em conflito.

    Muitas vezes, quando a gente se pergunta “o que eu vou fazer da minha vida?”, vem a dúvida: “Vou pensar em mim ou nos outros?”. Falei aqui de um jovem privilegiado que conseguiu criar um modelo de negócio bem-sucedido, com lucro e propósito social, um caso que rompe a bidimensionalidade de certas narrativas.

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    Esse texto é para você, leitor, que, sendo jovem ou não, está inquieto com a sua vida e preso no dilema entre escolher algo que gire em torno de um benefício para si próprio ou que vise ao coletivo. Que fique registrado aqui que é, sim, possível construir alternativas que entrelaçam os dois caminhos. Em tempo de campanhas eleitorais em que candidatos querem tentar nos convencer a escolher entre “economia e direitos humanos (ou civis)”, é bom lembrar que certas escolhas nem sempre precisam ser excludentes.

    Publicado em VEJA de 18 de outubro de 2017, edição nº 2552

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